quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

A fina flor da lama



Por todo o Brasil, milhares de seres humanos agonizam em UTIs superlotadas. Isso quando conseguem vaga em UTI. Isso quando não morrem em casa, ou até pelas ruas.

Já são mais de mil mortos por dia. Idosos, jovens e até crianças.

Das pequenas às grandes cidades, multiplicam-se as covas geradas pelo vírus traiçoeiro: até ontem, já eram mais de 227 mil.

Trezentas e noventa vezes os 583 mortos do maior desastre da história da aviação.

Mais de 4 vezes os 50 mil soldados brasileiros que morreram na Guerra do Paraguai, que durou cerca de 6 anos e foi a maior da América do Sul.

Aliás: mais que os 221 mil paraguaios, brasileiros, uruguaios e argentinos que morreram naquela guerra.

Parentes e amigos choram as 227 mil vidas de repente extintas.

Sufocadas. Implorando por ar, oxigênio, como se afogassem no seco.

Sozinhas. Sem um adeus, um abraço ou um enterro digno.

Enquanto isso, em Brasília, há gargalhadas, show e dancinhas.

Tudo regado à champagne e whisky, entre finíssimos salgadinhos.

Coisa chique. Très chic.

Só para os privilegiados que sempre estão por cima, sempre se dão bem.

Só para aqueles que não precisam cavar o próprio sustento e de suas famílias com o suor do rosto.

A festança vara a madrugada.

Os 300 convidados comemoram a eleição de Arthur Lira à Presidência da Câmara dos Deputados, com o apoio de Bolsonaro.

“Representantes do povo”, dançam e riem, como se pisoteassem a dor, as lágrimas e os cadáveres de milhares de cidadãos.

Como se tamanho sofrimento não lhes dissesse respeito.

Como se integrassem uma confraria de vampiros ou de psicopatas, que se alimentam justamente da dor alheia.

Como se homenageassem um igual: o vírus, também ele um parasita.

No vídeo que viralizou na internet, eles se divertem. Ah, como se divertem!

Como também devem ter se divertido os participantes do Baile da Ilha Fiscal.

Enchem a pança e se embriagam, de álcool e de poder.

É imenso o horizonte de negociatas que se abre à frente deles, com o Centrão acima de tudo.

Os milhões em chicletes e leite condensado parecerão brincadeira de criança, frente aos bilhões e bilhões que jorrarão, em troca do apoio a um presidente pútrido.

Um genocida. Um assassino frio, cujo sonho é uma guerra civil. Um banho de sangue, com irmãos a assassinar pelas ruas os próprios irmãos.

E enquanto eles dançam, gargalham, bebem e se empanturram madrugada adentro, nas casas do povo já não há nem mesmo um pedaço de pão.

Crianças choram de fome, dormem com fome, morrem de fome.

Milhares de cidadãos moram nas ruas porque nem mesmo um teto possuem.

Os pés descalços, as roupas esfarrapadas, os corpos esquálidos, a contrastar com os finos tecidos das roupas dos convidados do rega-bofe.

Muitos deles brancos, a pele bem tratada, os cabelos brilhantes, os dentes perfeitos.

E, novamente, vem-me a imagem do parasita cevado, enquanto agoniza o hospedeiro...

Diz-se que a festança foi paga por um empresário, réu em um processo de fraude tributária de R$ 3,8 milhões.

O próprio Arthur Lira é acusado de corrupção e até de espancar a ex-mulher.

Entre os apoiadores de Lira e Bolsonaro (cujos filhos são acusados de rachadinhas e envolvimento com as milícias) está, por exemplo, a famosíssima pastora Flordelis, indiciada por mandar matar o “ex-filho”, “ex-genro” e, finalmente, marido.

Tudo “cidadãos de bem”, tudo a fina flor da lama.

Com razão já bem dizia o “grande filósofo” general Augusto Heleno, do gentilíssimo Gabinete do Ódio: se gritar pega ladrão, não fica um.

FUUIIIIII!!!!!!

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