A renúncia de Jader Barbalho não altera em nada o quadro político paraense.
Também é absolutamente inócua do ponto de vista da condição política dele, já que o seu mandato de deputado federal se encerra daqui a 31 dias.
Do ponto de vista da tramitação dos processos judiciais que correm contra ele, a decisão também nada significa – afinal, trata-se de apenas 31 dias, como já se disse.
Mas a renúncia cria um fato político extraordinário, com ampla repercussão na imprensa nacional.
E talvez o mais interessante para Jader, neste momento, seja isto mesmo: criar fatos.
Para, ao menos, fazer pensar, equilibrar o jogo na chamada “opinião pública”.
Sem isso, dificilmente conseguirá fazer frente ao “clamor popular” midiático, que manterá emparedado qualquer ministro ou tribunal que, ao menos, pense em reverter a cassação branca de seu mandato de senador.
No que a criação desse fato realmente altera o jogo, só o tempo poderá dizer.
Afinal, se mexe com os formadores de opinião e leva a refletir sobre os absurdos criados pela aplicação da Lei da Ficha Limpa nas eleições deste ano, talvez não seja suficiente para ensejar uma vigorosa defesa de Jader, tendo em vista os muitos rolos em que se envolveu.
Mas é possível que o deputado aposte, ao menos, no silêncio ou na redução das vozes que se opõem ao seu retorno ao Congresso.
O que, na atual conjuntura, já seria um enorme ganho.
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Tenho de sair, para uma entrevista. Só à noite poderei, talvez, retornar a esse assunto. FUUUUUIIIIIIIII!!!!!!!!!
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Em tempo: a carta-renúncia de Jader está aqui: http://www.jaderbarbalho.com/site/media/renuncia_jader.pdf
terça-feira, 30 de novembro de 2010
sábado, 27 de novembro de 2010
PMDB vai participar do governo Jatene. E negocia Presidência da AL
Aos 66 anos de idade, o deputado federal Jader Barbalho está tinindo...
Otimista, bem humorado, não parece arrependido da opção que fez, há 44 anos, pela carreira política, apesar de todos os problemas que já enfrentou: acusações de corrupção, ações judiciais, processo de satanização, prisão e, mais recentemente, a cassação branca do mandato de senador conquistado no último pleito.
“Confesso que vivi”, diz ele, rindo, ao plagiar o poeta chileno Pablo Neruda.
Quer se goste ou não dele, o fato é que Jader é dono da mais duradoura carreira política do Pará.
Vereador, deputado estadual, deputado federal, senador, duas vezes governador do Pará, foi, também, ministro da Previdência e do Desenvolvimento Agrário, presidente nacional do maior partido brasileiro, o PMDB, e presidente do Senado Federal.
E, como acontece há 28 anos, Jader e o seu PMDB exercerão um papel fundamental na estabilidade administrativa do próximo governador paraense – o tucano Simão Jatene, que assume o cargo em primeiro de janeiro e foi eleito com o apoio de algumas das principais lideranças peemedebistas.
Na tarde da última sexta-feira, Jader recebeu a Perereca da Vizinha para uma longa e saborosa entrevista, no apart hotel onde reside, no centro de Belém.
Falou sobre tudo: a prisão, em 2002 – segundo ele, um “seqüestro” ordenado por um “bandido travestido de juiz” -; o empate de cinco a cinco no Supremo Tribunal Federal (STF), que invalidou o seu mandato de senador; as acusações de corrupção pelo extraordinário enriquecimento; o “desconforto” em relação ao governo de Ana Júlia Carepa; a expectativa de que o governo de Jatene seja muito melhor.
Revelou que o PMDB vai, sim, participar do governo de Jatene, com quem já teve uma longa conversa e deve voltar a conversar nos próximos dias. E que no balaio das negociações está, além de uma fatia no Executivo, a manutenção da Presidência da Assembléia Legislativa.
Disse que, até em respeito ao seu 1,8 milhão de eleitores, continuará a lutar para reverter a decisão do STF – um ganho que dá como certo, aliás, quer através de uma revisão decisória pelo próprio tribunal, quer através de novas eleições para o Senado, no estado do Pará.
E considerou que a derrota de Ana Júlia era previsível – e que a governadora, na verdade, perdeu a eleição para ela mesma.
A Perereca pede perdão aos leitores por antecipar a postagem da entrevista, que, na verdade, só deveria ser colocada no blog na noite de segunda-feira, junto com outras matérias que comporiam uma alentada edição. Mas a possibilidade de vazamento obriga essa antecipação. A seguir, a entrevista, que, por longa, vai dividida em XII postagens.
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Correção: a entrevista com Jader foi realizada na tarde de quinta-feira, 25, e duas notas no Diário do Pará, da sexta, com informações sobre a reunião entre Jader e Jatene, forçaram a antecipação desta postagem
Ping-pong Jader I: fatia do bolo ainda não foi definida
Perereca: Como é que está a relação do PMDB com o PSDB? Vocês já conversaram, já há alguma coisa em vista; o PMDB vai compor ou não o novo governo?
Jader: Eu tive uma conversa com o Jatene, às vésperas dessa viagem que ele fez recentemente. Estivemos conversando longamente, onde ficou acertada a participação do PMDB no Governo. Agora, não ficou acertado aonde, que cargos, nomes, e nem fixamos percentuais. Ficamos de, no retorno dele, discutir, de forma objetiva, qual seria a participação do PMDB no governo. Quer dizer, os espaços, os nomes, nós ficamos de discutir exatamente nesse retorno.
Perereca: Não é meio estranho, depois de toda a oposição que o PMDB fez há quatro anos, agora integrar o novo governo do Jatene? Ou isso é uma coisa até natural, já que o PMDB, ao que parece, nunca teve problemas com o Jatene, mas, com algumas alas do PSDB?
Jader: Olhe, eu considero natural, já que a grande maioria do partido, quase a unanimidade, apoiou a candidatura do Jatene no segundo turno das eleições. Tivemos um candidato próprio, o deputado Domingos Juvenil...
Perereca: Que era um laranja...
Jader: Não, não era um laranja. Quando fizemos a opção pela candidatura dele, acreditávamos que fosse possível fazer essa candidatura crescer e efetivamente se transformar numa alternativa eleitoral e ter sucesso. A história de candidaturas, não só no Pará, mas em diversos pontos do Brasil, demonstra candidaturas que começam com um percentual pequeno, mas ganham densidade durante o processo eleitoral e acabam por se tornar viáveis.
Perereca: Mas se o senhor queria uma candidatura forte, por que o candidato não foi o senhor mesmo ou o Priante, em vez de um desconhecido como o Juvenil?
Jader: Em primeiro lugar, cheguei à conclusão que não deveria me candidatar ao Governo do Estado. Já exerci o Governo duas vezes e achei que o adequado seria me candidatar ao Senado; ficaria numa posição inclusive mais confortável, para articular politicamente. Achei que com o meu retorno ao Senado teria maior possibilidade de coordenação, não só na campanha eleitoral. Também poderia, no Senado, com a experiência acumulada, com o trânsito em Brasília, ter um desempenho em favor do estado.
Perereca: O que houve, na verdade, não foi o medo de que os seus inimigos e as acusações que pesam contra o senhor levassem a uma derrota na disputa pelo Governo?
Jader: Não, até porque depois de tantas guerras que já enfrentei – e vou aí plagiar, de forma pretensiosa, uma frase usada pelo ex-presidente Juscelino Kubitschek – Deus poupou-me o sentimento do medo. Quem enfrentou a campanha de 1990 neste estado; quem se recorda em que circunstâncias aquela campanha decorreu; quem se recorda do enfrentamento que tive com o senador Antonio Carlos Magalhães, na disputa pela Presidência do Senado, não deve contabilizar nas minhas atitudes essa questão de medo. Isso não existe.
Perereca: O senhor queria encerrar a sua carreira política no Senado?
Jader: Não é encerrar, porque é a tal história: político é como um cavalo de corrida – a gente morre na pista, correndo. Evidentemente, um político por vocação, como é o meu caso. Esse negócio de encerrar... Você não é dono do seu destino; são as circunstâncias que comandam o seu destino. Achei apenas que voltar para o Senado seria o gesto politicamente mais adequado. Até porque, pelas circunstâncias da luta com o senador Antonio Carlos Magalhães, tive até de renunciar ao Senado, em 2001. Então, achei que era a oportunidade de retornar ao Senado, colaborar com o estado; com o trânsito e com a experiência acumulada em Brasília, ajudar o estado e ter um desempenho político conveniente aos interesses do Pará, além de participação, com contribuição efetiva, na política brasileira. É a tal história: se eu fosse um político iniciante, se nunca tivesse ocupado o Governo do Estado, talvez casar pela terceira vez com o Governo me desse uma motivação maior.
Ping-pong Jader II: o que fica do poder é o que se conseguiu realizar
Perereca: No Governo, você tem mais poder, tem a caneta na mão. No Senado, você está mais livre para articular. Qual a diferença, em termos pessoais, entre o Senado e o Governo?
Jader: Em termos pessoais, sou um político que no exercício tanto do Executivo quanto do Legislativo sempre me senti muito confortável. Não sou daqueles que precisa ter caneta na mão para se sentir confortavelmente no exercício da atividade política. Não me sinto deslocado no Parlamento: gosto do debate e da articulação política. Considero que a elaboração legislativa é fantástica, porque algumas pessoas ficam imaginando que o parlamentar constrói ou altera uma lei da cabeça dele - e não é assim. Quer dizer: você tem um universo imenso de contribuição, seja através da imprensa, seja através dos grupos organizados, que pressionam. Então, a vida parlamentar é profundamente dinâmica, rica. A construção legislativa não é uma construção isolada, do parlamentar. Então, a atividade parlamentar tem todo um apelo, principalmente para quem abomina a rotina.
Perereca: Mas não é melhor ter o poder do Executivo? O poder de nomear e exonerar; de colocar aqui uma pessoa ou mandar para acolá?
Jader: Se algum dia tive isso na cabeça, superei. Até porque fui duas vezes governador. Não é o confeito do poder, esse exercício menor do poder, que me empolga. E principalmente hoje.
Perereca: O que é que lhe empolga, então?
Jader: É efetivamente contribuir. Quer dizer: tive participação em determinados projetos, valeu a pena participar, porque consegui contribuir e, com a minha contribuição, alterar. Mas esse confeito do poder, pelo contrário: para um homem como eu, com 44 anos de vida pública, ele chega, às vezes, até a ser incômodo.
Perereca: Por quê?
Jader: Quando você se refere a ter que nomear fulano, ter que aceitar determinadas pressões, ter de administrá-las, isso eu vejo sob um ângulo, hoje... Não diria que estou farto de poder, mas, não é isso, hoje, que motiva a minha cabeça, as minhas aspirações; não é esse tipo de exercício do poder que me empolga. Talvez pelo fato de ter exercido duas vezes o governo, ministérios da República; ter passado pela Presidência do Congresso, de ter tido a influência política que você tem... Porque você não consegue nomear, exercer o poder apenas sendo o chefe do Executivo: você consegue exercer o poder tendo influência política, trânsito, respeito, acatamento; sendo levado em consideração por uma série de condições, circunstâncias, atributos. Não é isso, absolutamente... Não voltaria ao Governo para colocar como primordial o privilégio - se é que isso pode ser considerado privilégio – de nomear pessoas. Quando relembro a minha passagem pelo Governo, não relembro essa questão do exercício fisiológico do poder. O que me recordo, com grata satisfação, é de obras como a PA-150. Me sinto realizado por ter construído uma rodovia de 1.140 quilômetros, que não tinha só o sentido do transporte, mas até de integração do estado. Para quem tem noção exata da utilização do poder... Quer dizer: eu fiz, eu deixei e isso foi importante para o conjunto da comunidade - e ninguém pode retirar esse dado. Quando me recordo do serviço de abastecimento de água de Belém, o projeto Belém 2000, que agora no governo da Ana Júlia foi duplicada a estação de tratamento. Imagine se eu não tivesse tido condições de fazer aquilo; aquilo levaria Belém a um colapso no abastecimento de água. Quando me recordo que, quando assumi pela primeira vez o governo, a energia de Tucuruí era só em Belém e Barcarena, por causa do projeto da Albras; nem os municípios do entorno de Tucuruí recebiam a energia da hidrelétrica. Quando me recordo que promovi o maior projeto de expansão de energia elétrica no estado, levando até Conceição do Araguaia, espalhando por todo o Nordeste, substituindo todo o sistema a diesel e sabendo que aquilo representava não só bem estar para a população, energia domiciliar, mas a perspectiva da industrialização e da eletrificação rural. Quer dizer, são essas coisas que contam como fundamentais. Não vou ficar me lembrando do delegado de polícia que nomeei a pedido do deputado fulano de tal para um determinado município. O que conta é o que você conseguiu fazer. Quando me recordo do meu segundo governo, que foi muito difícil (porque o Pará padece de muita dificuldade; é muito vinculado ao Governo Federal; é muito dependente). Era o período Collor, e depois Itamar, com todas as dificuldades de negociação. E eu tinha uma idéia fixa, que era viabilizar o programa de macrodrenagem de Belém. E apostei tudo nisso. Inclusive, no sentido de pagar todas as dívidas do Estado, porque a União não daria o seu aval ao Estado, se ele não estivesse com as contas regularizadas. E me recordo da felicidade quando fui a Washington, para assinar o contrato com o BID. E me recordo, sentado no batente da casa da Elcione, na Cidade Velha; namorando com ela, no batente lá da Joaquim Távora...; me recordo do discurso do Stélio Maroja, eleito prefeito de Belém, falando das baixadas de Belém...
Ping-pong Jader III: uma extraordinária satanização.
Perereca: Pois é, o senhor tem até um livro em que resgata boa parte dessas realizações. Mas depois que deixou o governo, o senhor passou a ser visto como um “satanás” da política paraense. Muito desse processo de satanização veio dos tucanos. Quer dizer: não é estranho, depois de tudo isso, o senhor voltar a se aliar com quem lhe satanizou?
Jader: Em primeiro lugar, o processo de satanização ao qual você se refere, não só ao longo da história da humanidade, mas, do Brasil, só se faz com o líder. Não se faz processo de satanização com lideranças que eu chamo de “chá de erva-cidreira”. Havia todo um processo de tentar destruir a minha imagem, no sentido de tentar evitar um possível retorno meu ao Governo do Estado, ou de tentar abalar a minha liderança. Então, eu compreendo isso, porque sou um contumaz leitor de tantas histórias, aqui e alhures. Há pouco, estava me lembrando, principalmente nesse episódio dos “fichas limpas, fichas sujas”... O maior e melhor administrador que Belém já teve foi Antonio Lemos. E ele, apesar de já ter deixado a Intendência, como era chamada a Prefeitura, foi satanizado. Ele não queria nem voltar ao poder, estava com idade avançada (o que não é meu caso, que estou apenas com 36 anos...). Ele não tinha nenhum interesse e mesmo assim se montou a fraude de um atentado contra o Lauro Sodré e se queimou a Província do Pará, que era o jornal dele. Depois, a turba destruiu a casa dele e ele foi arrastado de pijama pelas ruas de Belém, sendo chamado de “velho ladrão”, “safado”. Depois, foi expulso, colocado num navio e seus restos mortais só voltaram para cá 60 anos depois. E não tem na história desta cidade, passado todo esse tempo, nenhum administrador público que possa ao menos, não é nem ombrear, mas se aproximar dos joelhos de Antonio Lemos.
Perereca: Mas o senhor não sente nem mesmo mágoa em relação a esse processo de satanização?
Jader: Em primeiro lugar, nunca trabalhei com ódio: sempre trabalhei com muito entusiasmo, empenho, paixão, o que é uma diferença muito grande. E depois, acho que não tenho do que me queixar, porque o julgamento que sempre me preocupou não é o julgamento dos meus inimigos e adversários. Os meus inimigos e adversários simplesmente, em determinados momentos da política do Pará, me elegeram como alvo, como obstáculo a ser removido. O que sempre me preocupou é o julgamento da opinião pública, da maioria. E isso eu não posso me queixar. Recordo a referência de uma das maiores autoridades em pesquisa qualitativa do País, que é a professora Fátima Jordão, professora aposentada da USP. Sou capítulo, um “caso”, de um livro dela. E ela diz não imaginar que outras lideranças do Brasil sobrevivessem a um processo de destruição de imagem como o que ela havia constatado em relação a mim, aqui no Pará. Então, eu só me sinto reconfortado. Porque se fui atacado, e continuo sendo atacado, é sinal de que não me transformei num irrelevante. Porque uma das coisas que sempre me preocupou foi não me transformar num irrelevante. Como não sou um irrelevante, sou uma pessoa que incomoda. E se incomodo, é sinal que sou levado em conta. Ficaria muito preocupado é se tivesse um julgamento, após todos esses anos de vida pública, desfavorável do povo do Pará. Aí, se eu tivesse sido abandonado pelo povo do Pará, aí, confesso, estaria num processo de profunda frustração política e pessoal. Mas eu não fui; não posso me queixar do povo do Pará. Pelo contrário: em que pese toda essa campanha de destruição de imagem, o povo do Pará sempre foi solidário comigo. Nessa última eleição, por exemplo: houve toda uma campanha dizendo que votar em mim seria nulo. E o povo do Pará sai de casa, cerca de 1,8 milhão de pessoas, e me elege senador da República. Então, do que é que eu posso me queixar?
Ping-pong Jader IV: A decisão do STF, o juiz de “Xixiriteua” e a Justiça como espetáculo
Perereca: Como é que o senhor viu essa decisão do Supremo Tribunal Federal? O senhor alguma vez imaginou que o STF, a mais alta Corte de Justiça do País, pudesse empatar, não decidir, um caso tão importante como a aplicabilidade da Ficha Limpa nas eleições deste ano?
Jader: Confesso que a decisão do Supremo me surpreendeu. Eu imaginava até que pudesse ocorrer um empate, já que na decisão - quem assistiu pôde verificar - além da interpretação técnica de dispositivos e preceitos constitucionais e de princípios de Direito, o que houve foi uma discussão apaixonada, o que, evidentemente, é um grande risco para os tribunais, e de modo especial para um tribunal que tem a responsabilidade, como tem o STF, de estabelecer jurisprudência para todo o País. O que assistimos foi uma discussão em que os princípios do Direito foram abandonados, para que outras preocupações, que não as do Direito, prevalecessem. Confesso que isso me surpreendeu. Como foi uma surpresa para mim que num empate - e nos tribunais, ao longo do tempo, o princípio, que é herdado do Direito Romano, que é toda a base do Direito Ocidental, é que, num empate, em favor do requerente, em favor do cidadão, em relação ao Estado. E a minha maior surpresa, em todo o debate no STF, foi que num empate eu perdi a questão: fui cassado no meu direito de eleito por 1,8 milhão de brasileiros residentes no Pará por um empate, quando o princípio, a regra, em qualquer tribunal, é que, empatando, o presidente tem o voto de qualidade - e o voto dele havia sido a meu favor; e ele havia declarado que a decisão que se buscava era inócua e contrária, inclusive, aos princípios dele e aos interesses da sociedade. E eu jamais imaginava que se fosse abolir um princípio universal do Direito que, em dúbio, pró-requerente.
Perereca: E por que o senhor acha que o STF agiu dessa maneira?
Jader: Em primeiro lugar, abstraída a figura do Jader Barbalho, confesso que, para mim, que tenho formação Jurídica (sou bacharel eu Direito), e como cidadão, tudo foi uma surpresa. Porque você imaginar, como disse o ministro Celso de Melo, que a questão da irretroatividade da lei estava estabelecida no Direito Romano no século II da Era Cristã; portanto, há 19 séculos, que uma lei entra em vigor e que os seus efeitos são a partir da sua edição. Quer dizer: ver o Supremo Tribunal Federal do meu país revogar um princípio jurídico universal dos povos civilizados, o mínimo que, por cortesia, tenho de dizer em relação ao Supremo é que me causou grande espanto. Porque se fosse um juiz de roça - um juiz, como certa vez escreveu o Hélio Gueiros, de forma irreverente, em relação a uma sentença de um juiz de Xixiriteua (risos) – se fosse um juiz de Xixiriteua, eu poderia imaginar que um juiz de Xixiriteua não levasse em conta um princípio jurídico, o que é um precedente gravíssimo. Porque não é só no campo eleitoral: ele abre um precedente para outros campos do Direito, de amanhã não se respeitar a irretroatividade das leis.
Perereca: O senhor não acha que isso aconteceu também porque a Justiça está virando um espetáculo; os juízes estão hoje mais preocupados, o próprio Supremo, com a imagem de cada qual, em vez de se preocuparem muito mais com o Direito, com as leis?
Jader: Eu não tenho a menor dúvida disso. As câmeras de televisão são um instrumento afrodisíaco (risos); o noticiário da imprensa é afrodisíaco, principalmente para alguns iniciados nisso. Alguns que, até pouco tempo atrás, eram figuras anônimas. E isso deve ter uma repercussão psicológica imensa na cabeça dessas pessoas. E essa questão da opinião pública... E aí se verificar, quando se fala em opinião pública - e há uma diferença entre opinião pública e opinião publicada... Porque, se for por opinião pública, esse projeto do tal Ficha Limpa teria sido assinado por 1,3 milhão de pessoas. Eu não vou chegar, como disse o ministro Marco Aurélio, que afirmou que sabe, às vezes, como são coletadas essas assinaturas... Mas se foi 1,3 milhão de assinaturas, se fosse opinião pública, eu tive 1,8 milhão de votos, de pessoas que saíram de casa, levaram seu documento de identidade, assinaram folha de votação e votaram secretamente. Se fosse por opinião pública - com todo o respeito, sem duvidar de como ocorreu a coleta dessas assinaturas - se desrespeitou a opinião pública do Pará. Foram 500 mil votos a mais da assinatura do projeto. E pelo que sei, no projeto original que chegou ao Congresso não estava abrigada essa questão de renúncia: ela foi colocada dentro do Congresso, para inviabilizar a candidatura do governador Roriz, no Distrito Federal. Depois, se falar em opinião pública... Eu acho que o STF, eles chegam lá sem voto... Eu, para chegar ao Senado, tenho de ter votos; e qualquer um, para chegar a cargos públicos, precisa ter votos. Já ministro do Supremo precisa é ter currículo e bons padrinhos. Então, eu acho que quando se chega ao STF, se alcançou o cargo vitalício que é o ápice da administração pública brasileira. Desconheço qualquer cargo mais importante, hierarquicamente, do que ministro do STF. Então, eu acho que essa obrigatoriedade de levar em conta a responsabilidade de interpretar a Constituição, e não estar preocupado em fazer charminho para a opinião pública... Porque se dissesse: não, ministro do STF vai fazer charminho para a opinião pública; ele vai se abstrair de princípios milenares do Direito, porque ele precisa de voto e ele precisa fazer charme, para ter votos, para renovar o seu mandato... Não, eles não precisam. Aliás, nos Estados Unidos, no Poder Judiciário, à exceção, creio, da Suprema Corte, eles precisam ter votos periodicamente, para ocuparem cargos tanto no Ministério Público, quanto para ocuparem cargo de juiz. No Brasil, não. Essas pessoas são inamovíveis, irremovíveis, cargo vitalício... E o Supremo, então, acho que o único compromisso é com a Constituição, com as leis, com a estabilidade do regime democrático. Quer dizer, imaginar – e essa é coisa profundamente dolorosa para mim e para qualquer cidadão – imaginar que juízes do STF estejam interessados em fazer charme para a opinião pública... Até porque, como já foi dito, foi a opinião pública que levou o Hitler a implantar o regime nazista; foi a opinião pública que permitiu a Mussolini implantar o fascismo, na Itália.
(continua)
Ping-pong Jader V: “Sempre trabalhei”, diz, sobre o seu enriquecimento.
Perereca: O PMDB tem uma história de luta pela Democracia. Mas pena que nem sovaco de aleijado nas mãos do PT e do PSBD, porque, quando está com um deles, é acusado pelo outro de servir apenas a essa questão fisiológica, de preencher cargos, e também de possuir os políticos mais corruptos do Brasil. O senhor não acha que os tucanos e os petistas têm muita dificuldade de conviver com a Democracia?
Jader: Em primeiro lugar, essa questão da disputa de poder, dos espaços de poder, não ocorre só aqui: ocorre em todos os regimes e nos governos pluripartidários. É natural. A ministra Dilma está começando a formar o seu governo. Verifique se ela já não colocou, escolheu – todos os que são escolhidos, talvez à exceção, não sei, não conheço a ficha de filiação partidária do futuro presidente do Banco Central – todos são petistas de carteirinha. Então, isso aí é uma bobagem, ficar acusando, essa coisa toda e tal. Considero natural a luta dos partidos por ocupação dos espaços, até porque você exerce o poder exercendo o poder. Nem no Vaticano você exerce o poder de forma abstrata. Até no Vaticano a gente sabe como são divididos os cargos, tudo isso, e lá tem uma inspiração divina muito grande e ainda devem prevalecer as palavras de Jesus, “meu Reino não é deste mundo” (risos). Mas mesmo sendo assim, lá no Vaticano se disputa o poder – imagina no Brasil. E essa coisa de corrupção, não tem absolutamente nenhum governo que não seja acusado de corrupção. No Governo Fernando Henrique, quantas pessoas foram acusadas de corrupção? No Governo petista, quantos não foram acusados? Então, eu acho que essa questão conceitual de corrupção, não há autoridade a nenhum partido político de se considerar um amontoado de anjos.
Perereca: Mas o PMDB não tem, realmente, uma quantidade enorme de políticos envolvidos em rolos complicadíssimos? O senhor, o Orestes Quércia...
Jader: O meu pai dizia uma coisa para mim de forma simples, que sempre levei em conta: que você desafia alguém de ser honesto, perguntando a ele se já teve oportunidade de ser desonesto. Porque eu conheço muito Ficha Limpa, e alguns que se apresentam como candidato Ficha Limpa, que nunca administraram um centavo público; nunca tiveram a oportunidade nem de ser acusados. Mas eu gostaria de esperar pelo exercício do poder... Quem tem longo exercício de poder, quem passou por tantos cargos, evidentemente que é objeto, por parte dos adversários, de acusações. Mas quem nunca exerceu nenhuma função pública; quem nunca bebeu vinho resolver assumir uma postura de enólogo... O PT vivia acusando, quando era oposição, os outros todos de serem corruptos, de cometerem irregularidades. Oito anos do governo do Lula, quantos episódios de acusações, fundadas, infundadas, em apuração, não apareceram? Falei, há pouco, do Antonio Lemos. Mas também o Getúlio Vargas foi acusado de ser gerente geral da corrupção no Brasil – e depois a História veio para repor que isso não tinha fundamento. Juscelino foi acusado de ser a sétima fortuna do mundo; fizeram tudo para denegrir a figura do Juscelino. A história registra que não escapou nem o Duque de Caxias, acusado, após a Guerra do Paraguai, de ter cometido atos de desonestidade.
Perereca: Mas como é que o senhor explica: o senhor, quando começou a sua carreira política, morava em uma vila bastante humilde. O senhor nunca fez mais nada além de carreira política. O senhor, pelo que se diz, nunca exerceu a Advocacia. Mas hoje o senhor é dono de uma fortuna considerável: fazendas, grupos de comunicação. Então, como é que o senhor explica essa fortuna?
Jader: Em primeiro lugar, há um profundo equívoco: eu me dedico à atividade agropecuária desde 1974. Quem pegar as minhas declarações do Imposto de Renda vai verificar... Aliás, uma vez fui à televisão para mostrar que todas as minhas propriedades rurais tinham sido adquiridas antes de eu chegar ao Governo, em 1983. Fui à televisão, me lembro bem, no dia 20 de abril de 1990. Sempre cuidei de, ao lado da atividade política, até para não ficar vulnerável, não me transformar num político profissional dependendo exclusivamente disso; eu sempre cuidei, como cidadão, dos meus interesses. Acho que era uma questão até de responsabilidade, de autonomia, de independência. Quem quiser pegar as minhas declarações do Imposto de Renda até 1982, vai verificar o número de propriedades rurais e de cabeças de gado que eu possuía. Você fala que comecei numa casa de vila – sem problema. Eu quando saí para governador do estado, morava numa casa confortabilíssima – que, aliás, me arrependo até hoje de tê-la trocado, porque me recordo dela com muita saudade, na passagem Eliezer Levy. Então, eu sempre trabalhei. Agora, você impor a um cidadão que ele deva ter como profissão obter mandatos... Mandatos são coisas eventuais. E eu sempre me preocupei em trabalhar. Aliás, trabalho até hoje. Agora, você achar que deve condenar um homem público a não ter patrimônio, a não cuidar do seu patrimônio, é você condená-lo a ser um político eminentemente profissional.
Perereca: Mas como é que o senhor explica as acusações de que a sua fortuna teria se multiplicado por conta de corrupção; corrupção na Sudam, no Governo, como no caso do Banpará? Isso são acusações infundadas? No que resultou tudo isso?
Jader: Eu pergunto o seguinte: qual dessas acusações até hoje foi comprovada? Nenhuma.
Perereca: O senhor não tem nenhuma condenação?
Jader: Não tenho absolutamente nenhuma condenação. Pelo contrário: muitas dessas acusações foram arquivadas, por serem consideradas improcedentes, sem nenhum fundamento. É o que eu estava falando há pouco: Juscelino foi acusado de ser a sétima fortuna do mundo. Quando ele morreu, foi se verificar que não tinha coisíssima nenhuma de sétima fortuna do mundo. Agora, achar que o Juscelino, uma pessoa com todo o talento dele, não deveria ter patrimônio... Agora, em relação às acusações, quais delas foram consideradas procedentes? Eu desafio: quais? Aonde há uma acusação considerada procedente, passados todos esses anos? Tiveram todo esse tempo...
Perereca: Mas não são os seus advogados que estão obstando a Justiça, impedindo que os processos andem?
Jader: Em absoluto. Tenho direito à defesa, como tem qualquer cidadão neste País. Mas essas acusações, qual a consistência delas? Veja esse episódio da Sudam, qual a consistência disso? Recordo de gravações que foram feitas, 150 horas de gravações - e a única referência nelas era a de duas pessoas conversando, dizendo assim: “ah, vai ser muito bom se o Jader se eleger presidente do Congresso”. A única! Não existe absolutamente uma acusação, um envolvimento, nada! Chegaram ao ponto de cometer o absurdo de dizer que a minha mulher havia desviado para um projeto de ranário R$ 10 milhões da Sudam – minha mulher recebeu R$ 400 mil! Fez perícia judicial e ganhou, na perícia convocada, todos os órgãos envolvidos em acusação, em todos os tribunais, até o Superior Tribunal de Justiça. Recebeu R$ 400 mil – e isso apurado em perícia judicial. Agora, papel aceita tudo – e a língua dos adversários, muito mais. E principalmente eu, que tive um grupo de comunicação, que se dedicou, ao longo de 28 anos, a tentar destruir a minha imagem. Qual o político, na história deste estado, que tenha tido... Acho que nem o Barata, com a Folha do Norte, na época do velho Paulo Maranhão, teve um período tão longo... E também desafio quem tenha tido adversários tão poderosos como eu tive. Eu não só enfrentei os poderosos do Pará: enfrentei o homem mais poderoso do Brasil, e que não era brinquedo brigar com ele – que o digam os seus conterrâneos, e outros da vida pública brasileira.
(continua)
(continua)