quinta-feira, 11 de julho de 2019

Opinião: Longe de “dignificar”, trabalho infantil expõe crianças indefesas a todo tipo de violência









Há vezes em que é até difícil classificar Jair Bolsonaro e alguns de seus apoiadores. 

A perversidade é tamanha que chega a dar a impressão de que essas criaturas disputam algum tipo de campeonato pra ver quem mais expressa, ou até concretiza, aquilo que de pior é capaz um ser humano. 

Uma das mais recentes indignidades dessa turba é elogiar o trabalho infantil. 

Como se não soubessem que o trabalho infantil expõe meninas e meninos à violência de brutamontes, que consideram “natural” escravizar outros seres humanos. 

Sim, porque é de escravidão de criancinhas que estamos a falar. 

Recentemente, a Justiça brasileira condenou uma família a indenizar uma mulher que foi mantida durante 30 anos em situação análoga à escravidão. 

Foi levada para trabalhar na casa daquela família quando tinha apenas 7 anos. 

Era Solange, mas foi “rebatizada” como “Karina”, porque era o nome da marca de laquê que a patroa usava. 

No início, até dormia no chão do banheiro. Mas como adoeceu, acabou transferida para o chão de um quarto. 

Ao longo de 30 anos, varreu, lavou, passou, cozinhou, mas nunca recebeu remuneração.  

Nunca estudou: até hoje é analfabeta.

Nunca nem mesmo namorou. 

Aliás, não tinha nem mesmo absorventes higiênicos, quando menstruava. 

Uma história de arrepiar... 

O pior, porém, é que tal situação nunca foi raridade entre os meninos e meninas forçados ao trabalho infantil. 

Aliás, o drama de Solange, que teve sequestrados os 30 melhores anos de sua vida, é até “menos pior”, digamos assim, do que o de muitas garotas iguais a ela, que são vítimas, ainda hoje, até de porradas, torturas e abusos sexuais. 

Na minha infância, há 50 anos, lembro que era ainda mais comum pegar garotas como a Solange, “para criar”. 

O silêncio da sociedade ajudava a encobrir as histórias de horror dessas crianças. Várias até morreram, devido às violências que sofriam. Em 2005, a tortura e assassinato de Marielma chocou o Brasil. 

Mas não é “apenas” nas casas de “boas famílias” que as condições desses meninos e meninas são atrozes. 

As humilhações, os maus tratos, o trabalho extenuante, a falta de acesso à escola, tudo isso se repete em praticamente todas as atividades para as quais são empurrados. 

Em geral, essas crianças realizam trabalhos que muitos de nós consideram cruéis até para animais de carga. 

Mas que os “cidadãos de bem” destes tempos tão sombrios parecem considerar “normais” e até “dignificantes” para os filhotes do animal humano. 

São meninos e meninas catando toda sorte de imundície em lixões. Ou lavrando a terra, de sol a sol. Ou enegrecidos de tanta fuligem em carvoarias. Ou vendendo comida e quinquilharias pelas ruas. 

São criancinhas indefesas, privadas de um direito essencial: o direito de ser criança.  

O direito de brincar, sonhar, estudar. 

O direito de se preparar para um futuro que não seja o de escravidão. 

O direito de se construir em um adulto capaz de sorrir, amar e confiar. 

É esta a realidade do trabalho infantil, no Brasil e no mundo. 

Não, não nada há de “dignificante” nisso. 

Para a maioria esmagadora desses meninos e meninas, o que existe é uma brutalidade inimaginável até em nossos piores pesadelos. 

Não há nada de “glamoroso” em meninas e meninos violentados e arrastados para as drogas, a prostituição e a criminalidade, devido ao trabalho nas ruas. 

Não, não há nada de “edificante” em um garotinho franzino, de 12 anos, e já recolhido a uma instituição sócio-educativa, e que vive a repetir que “enche de porrada” a outros meninos, porque foi isso que teve de aprender para sobreviver nas ruas, como vi muitos anos atrás (e que nunca mais me esqueci...). 

Não, não há nada de “inspirador” em ver garotinhas e garotinhos passando fome, doentes, exaustos, adormecendo em meio a trabalhos que são física e mentalmente incapazes de suportar. 

Crianças entregues a patrões que as veem como subumanas. E como um “livramento” da obrigação de pagar salários e direitos a empregados adultos. 

E se existe, de fato, um sinal dos tempos é este: o coração duro que nem pedra, de tantos que vivem por aí a se orgulhar de suas rezas, preces, orações; a se orgulhar das hóstias que devoram e das aleluias que gritam, mas que não conseguem sentir misericórdia nem mesmo por criancinhas. 

No entanto, nada assim tão espantoso, vindo de quem até defende psicopatas que davam choques elétricos em grávidas, torturavam crianças e mandavam enfiar ratos e baratas na vagina de mulheres, durante a ditadura militar. 

E creio que Jesus, ao contemplar tudo isso, deve até ficar a pensar: definitivamente, quem tem seguidores como esses, não precisa de um inimigo com Satanás. 


FUUUIIIIII!!!!!


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Aqui, matéria da Exame sobre o crescimento do trabalho infantil no Brasil: https://exame.abril.com.br/brasil/trabalho-infantil-cresce-entre-criancas-de-5-a-9-anos-no-brasil/ 

Aqui, uma reportagem antiga, mas imperdível sobre o trabalho de crianças em carvoarias: http://fundacaotelefonica.org.br/promenino/trabalho-infantil-em-carvoarias-as-invisiveis-criancas-feitas-de-fuligem/ 

E relembre a trágica história de Marielma.


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