Norte Energia nega irregularidades em Belo Monte e diz que a paralisação das obras trará “consequências imprevisíveis” à matriz energética brasileira, além de desemprego para 20 mil trabalhadores.
A
Perereca recebeu nota à imprensa
da Assessoria de Comunicação da Norte Energia, empresa responsável pela
construção da hidrelétrica de Belo Monte.
Na
nota, a empresa nega as irregularidades no projeto, apontadas pelo Ministério
Público Federal e que culminaram na ordem judicial de paralisação das obras.
Apesar
de ter posição fechada sobre esse assunto, a Perereca garante, democraticamente, o necessário espaço para que a
Norte Energia “venda o seu peixe”, publicando, na íntegra, a referida nota.
O
blog recomenda aos leitores, no entanto, que leiam as últimas postagens sobre
Belo Monte.
E
que leiam, ao final, artigo publicado por este blog em 27 de janeiro de 2010,
que a blogueira faz questão de republicar.
Eis o “peixe” da Norte Energia:
“Nota para a Imprensa
A
Norte Energia, empresa responsável pela construção e operação da Usina
Hidrelétrica Belo Monte, localizada no Estado do Pará, é um projeto estudado
por mais de 35 anos, que conta até agora
com investimentos de R$ 5 bilhões de um total de cerca de R$ 26 bilhões
previstos.
A
empresa tem como princípio norteador das suas ações o respeito à Constituição e
à legislação ambiental, especialmente na defesa aos direitos dos povos
indígenas da região do Xingu. As obras só tiveram início em junho de 2011,
depois de rigorosamente cumpridas todas as exigências legais.
Nenhuma
terra indígena será diretamente afetada por Belo Monte. As comunidades indígenas da região sempre
foram consultadas e suas opiniões respeitadas na elaboração do projeto. Em sintonia com a Funai, realizaram-se entre
dezembro de 2007 e outubro de 2009, 38 reuniões
em 24 aldeias que fazem parte do processo de consulta,
além de quatro audiências públicas nas cidades paraenses de Brasil Novo,
Vitória do Xingu, Altamira e Belém.
O
procedimento da consulta nas aldeias respeitou os costumes e tradições das
comunidades. Para os que não entendem a língua portuguesa – os povos indígenas
Xikrin do Bacajá, Parakanã, Araweté, Arara e Assurini – foram utilizados
intérpretes, escolhidos por eles, que se encarregaram da tradução do Português
para as respectivas línguas maternas.
Durante
as reuniões nas aldeias, foram prestadas todas as informações sobre o projeto,
o que incluiu seus impactos, mitigações e compensações estabelecidas no
componente indígena, aprovado pela Funai. A esse respeito, vale mencionar que,
nas reuniões ocorridas a partir de maio de 2009, no total de 20, o Relatório de
Impacto Ambiental (RIMA) foi apresentado e distribuído aos indígenas em formato
e linguagem acessível.
O
IBAMA coordenou as quatro audiências públicas mencionadas realizadas em Brasil
Novo, Vitória do Xingu, Altamira e Belém, em setembro de 2009, foram abertas à
população em geral e atraíram cerca de 8.000 participantes, dos quais mais de
5.000 em Altamira, dentre eles, aproximadamente 200 eram lideranças indígenas.
Esse
processo foi determinante para que os povos indígenas, por livre arbítrio,
apoiassem Belo Monte, preservando seus direitos, sua cultura, suas terras, rios
e qualidade de vida. Belo Monte é o
primeiro empreendimento a ter um Projeto Básico Ambiental específico para as
comunidades indígenas.
A
Norte Energia manifesta sua preocupação com as consequências de uma possível
paralisação, decorrente da decisão judicial da 5ª Turma do TRF-1 que, de
imediato, vai implicar em graves problemas sociais, trabalhistas e econômicos
para a população dos onze municípios direta e indiretamente envolvidos no
empreendimento.
O
primeiro prejudicado com a eventual desativação dos canteiros de obra será o Brasil.
A
inadmissível paralisação da geração de energia de Belo Monte trará
consequências negativas e imprevisíveis
para a matriz energética brasileira, com a necessidade de acionamento de
termoelétricas a óleo, bem mais poluidoras e com custos muitas vezes mais caros
do que a energia de Belo Monte.
A
suspensão das obras de engenharia já iniciadas, como a ensecadeira, se perderem
a oportunidade do período de estiagem, correm o risco de não serem concluídas e
causarem sérios prejuízos econômicos e ambientais. Tal paralisação implicará em
prejuízos imediatos para Belo Monte e o país.
Mais
de 20.000 trabalhadores ficarão imediatamente desempregados incluindo aí
aqueles terceirizados, os lotados nas obras do entorno, na construção de
escolas, postos de saúde, estradas, além daqueles que atuam nos programas
socioambientais.
Outro
efeito negativo da suspensão das obras é a interrupção dos investimentos de R$3
bilhões previstos em 117 programas do
Projeto Básico Ambiental (PBA) que terão que ser cancelados. Obras importantes
serão canceladas, como o saneamento básico da área urbana de Altamira e de
Vitória do Xingu e a reassentamento de mais de 5.000 famílias que vivem em
palafitas às margens do rio Xingu.
O
financiamento do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu
(PDRSX), que visa ao atendimento das populações dos 11 municípios com recursos
da Norte Energia de R$ 500 milhões -e outros R$2,5 bilhões do governo federal-
também serão suspensos, incluindo as iniciativas para as comunidades indígenas
e ribeirinhos.
As
administrações municipais, estaduais e federais poderão sentir as consequências
em suas arrecadações, uma vez que o repasse aproximado de R$ 45 milhões/mês,
relacionados à obra de Belo Monte terão de ser paralisados.
A
Norte Energia preocupa-se ainda com a economia local que será severamente
impactada, acarretando perdas de investimentos em áreas como imobiliárias,
hotelaria, materiais de construção, empresas de ônibus e navegação fluvial,
dentre outras”.
“Belo Monte para quem?
Até
onde podemos ir na busca pelo “desenvolvimento” econômico, sem inviabilizarmos
a sobrevivência da nossa própria espécie e deste planeta?
Até
que ponto a qualidade da água que bebemos, do ar que respiramos e o verde que
nos alimenta e sombreia não são direitos tão fundamentais quanto a saúde, a
educação, o trabalho, a moradia, a liberdade de expressão?
Neste
século em que, como nunca na História, tomamos consciência de que somos,
visceralmente, parte de um meio; em que tomamos consciência da importância de
tudo o que vive e respira, até quando insistiremos em projetos como Belo Monte,
especialmente, numa região como a Amazônia, tão exuberante e, ao mesmo tempo,
tão delicada?
Qual,
afinal, o retorno que têm trazido, para nós e nossos filhos, em termos de
qualidade de vida, todos esses “grandes projetos”?
Numa
análise fria, levando em conta apenas a relação custo/benefício, qual a
vantagem tão extraordinária que esses projetos trouxeram à totalidade da nossa
população, para justificar a magnitude das agressões por eles causadas à
Amazônia e ao mundo em que vivemos?
Ao
tempo da ditadura militar, a Amazônia e particularmente o estado do Pará foram
invadidos por projetos “desenvolvimentistas” de toda ordem: rasgaram-se
estradas, construíram-se fabricões, implantaram-se projetos agrícolas.
Atraiu-se
para cá levas e levas de migrantes, que aqui diz-que encontrariam uma espécie
de “paraíso perdido”, povoado por índios, pretos e caboclos, todos sem alma.
Ou, no máximo, com uma alma “diferente”, como se dizia na Idade Média.
E
o fato é que todos esses megaprojetos e essa visão “desenvolvimentista” - que
se baseia apenas no lucro, na propriedade de bens e na acumulação de capital –
acabaram cravando em nosso rosto uma face absolutamente repugnante.
Por
um lado, nos trouxeram ruas asfaltadas, telefones, computadores, internet,
shoppings centers, grandes redes de supermercados, escolas, hospitais, cinemas,
museus.
Tudo,
enfim, que a gente convencionou chamar de “progresso”, quando se entende
progresso, basicamente, pela simples possibilidade de pendurar uma TV de LCD na
parede da sala.
No
entanto, esses grandes projetos também nos trouxeram o horror – e o horror aqui
não é feito simplesmente da falta de coisas, de bens, ou do sinal ruim de um
telefone celular.
Mas,
um horror que é feito de pessoas; da forma subumana como vivem milhões de
pessoas em nosso estado; milhões de paraenses e milhões de amazônidas.
Todos
esses grandes projetos, toda essa visão “desenvolvimentista” nos trouxeram a
fome, em níveis nem sequer imaginados pelos nossos pais e avós.
Trouxeram
a morte de milhares de criancinhas, por subnutrição, por doenças medievais.
Trouxeram
a prostituição e a exploração sexual até de meninos e meninas.
Agudizaram
o trabalho escravo e geraram a tortura e a morte de milhares de pequenos
agricultores e trabalhadores rurais.
Nosso
IDH melhorou? É verdade. Nós, classe média, temos até boas escolas e
universidades para os nossos filhos.
Temos,
é verdade, computadores da hora, geladeiras que só faltam falar, celulares
bacanas que fazem de tudo - até telefonar, por incrível que pareça...
Mas
temos, também, mais de 70% dos nossos eleitores que mal sabem ler e escrever;
70% dos nossos eleitores possuem, quando muito, o primeiro grau completo.
Temos
milhões de paraenses e de amazônidas que vivem em casebres deteriorados e
imundos, sem água potável, sem luz, sem saneamento básico. Gente que morre nas
filas dos hospitais – quando há hospitais para se morrer à porta!...
Gente
que carrega espécie de maldição, espécie de “marca da miséria”, para transmitir
às futuras gerações, pela falta de educação e de direitos elementares de
Cidadania.
Famílias
inteiras – cerca de 40% da nossa população – em que cada integrante tem apenas
a metade de um salário mínimo, no máximo, para sobreviver. Quer dizer: pra comer,
pra morar, pra comprar remédio, pra pagar passagem de ônibus.
É
o caso de se perguntar: qual, afinal, a “grande revolução” que esses “grandes
projetos” trouxeram à vida do nosso povo?
Qual
a “extraordinária” mudança, na qualidade de vida da nossa gente, que Belo Monte
irá trazer?
Vejam
bem: não estou a falar do benefício que a usina de Belo Monte trará para as
grandes empresas, especialmente as grandes empresas mineradoras, que há anos
arrancam daqui as nossas riquezas, sem nos deixar nada em troca.
Também
não estou a falar das empresas de outros estados que vão bamburrar com a nossa
energia.
Estou
a falar de pessoas, do nosso povo. De nós, os paraenses!
Durante
anos e anos populações inteiras da região da Transamazônica viveram sem energia
elétrica.
O
linhão da hidrelétrica de Tucuruí passava praticamente por cima das casas
delas.
Mas
esses paraenses – de nascimento ou por adoção – viviam à luz de velas.
E
os donos de estabelecimentos comerciais – gente pobre que, sabe-se lá como,
conseguiu montar um comércio – tinham de viajar a cidades próximas, para
comprar gelo que eles estocavam sob serragem, dentro de isopores, de modo a ter
uma bebida gelada para oferecer ao freguês.
Durante
anos essas pessoas viveram literalmente no meio da mata escura - apesar da
hidrelétrica de Tucuruí.
Naquela
época, como agora, o Governo Federal estava se lixando para os paraenses.
O
que se pretendia, exatamente como se pretende agora, era simplesmente garantir
energia barata às empresas que exploram os nossos minérios.
E
essa é, certamente, uma das partes mais dolorosas de toda essa história: qual o
retorno que nos dão tais empresas, ao menos em termos de impostos? – impostos
que são para construir escolas, estradas, hospitais!...
O
que é que fica pra nós, e para os nossos filhos, netos e tataranetos, de toda a
riqueza que essas empresas retiram daqui?
Belo
Monte vai mexer com uma extensa área intocada, numa das poucas regiões
intocadas deste Pará e desta Amazônia tão maltratada!...
Essa
usina – uma Usina da Morte! – destruirá grandes extensões de floresta e
dizimará milhares de animais.
Destruirá
patrimônios biológicos e arqueológicos que nem sequer conhecemos.
Levará
a fome às populações indígenas e ribeirinhas – a fome que aqueles índios e
aqueles ribeirinhos nunca conheceram!
Tudo
em nome de um “progresso” que nunca chegará de verdade para o nosso povo,
enquanto formos, apenas, este grande armazém de recursos naturais.
Passadas
décadas – quarenta anos! – dos primeiros “grandes projetos”, ainda continuamos
meros exportadores de matérias-primas.
Tudo
o que recebemos foi mais e mais miséria.
E
uma floresta tão devastada, que, sabe Deus!, se os nossos bisnetos e
tataranetos, um dia, conhecerão”.
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