segunda-feira, 1 de junho de 2020

Pará é o segundo estado do Brasil em mortes por 100 mil habitantes pela Covid-19, mas governador libera reabertura de shoppings, igrejas, salões de beleza e comércio varejista, na Região Metropolitana. Só Belém concentra 45% das mortes do estado, por essa doença.




Segundo o Ministério da Saúde (https://covid.saude.gov.br/), o Pará era, na noite de ontem, o segundo estado do Brasil com maior número de mortes por Covid-19, por 100 mil habitantes.

No Pará, eram 34,0 mortes por 100 mil, marca só superada pelo Amazonas, com 49,5.

Ambos estavam, aliás, acima das médias do Brasil e da Região Norte (13,9 e 30,9 por 100 mil, respectivamente).

No entanto, o Pará estava em sétimo lugar em casos confirmados dessa doença, com 441,3 infectados por 100 mil habitantes, atrás do Amapá, Amazonas, Acre, Roraima, Ceará e Maranhão.

Isso pode significar que o coronavírus se tornou “mais eficiente”, no Pará, já que mata bem mais, apesar de contaminar menos gente.

Bem mais provável, porém, é que essa disparidade entre a quantidade de diagnosticados e de mortos oculte uma impressionante subnotificação, maior do que na maioria desses estados.

A menor estimativa é que para cada caso confirmado, no Pará, haja outros 6 não detectados.

E como fechou o dia de ontem com 38.046 casos confirmados, o número real seria superior a 228 mil pessoas infectadas, em todo o estado.

No entanto, um estudo recente, da Universidade de Pelotas, estima que já existam, só em Belém, 225 mil pessoas com anticorpos para esse vírus. Ou seja, foram infectadas:

Mesmo assim, na última sexta-feira (29), o governador Helder Barbalho liberou a reabertura de shoppings centers, barbearias, salões de beleza, igrejas e comércio varejista em duas regiões paraenses, incluindo a Metropolitana

(Veja o decreto do governador, publicado no Diário Oficial deste domingo:

A capital concentra mais de 30% dos casos diagnosticados de Covid-19 e 45% das mortes do estado.  

Mesmo assim, o prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, até reclamou, porque, ao que parece, queria ainda maior liberalidade do que a prevista no decreto governamental.

Certamente, porque está muito preocupado com o desemprego dos munícipes e as dificuldades financeiras da Prefeitura.

E não porque a família dele inclui donos de imobiliárias e de lojas de calçados, e até mesmo o presidente do sindicato dos lojistas de Belém, Joy Colares, que é primo de Zenaldo.

No entanto, é provável que o governador e o prefeito tenham dificuldade para convencer parcela expressiva da classe média de que já é “seguro” frequentar shoppings, barbearias e salões de beleza, onde o vírus, a bem dizer, “esfrega as mãozinhas” de tanta satisfação...

Na noite de sexta-feira, horas depois do anúncio do governador, a Secretaria Estadual de Saúde (Sespa) divulgou 14 novas mortes e 21 novas confirmações de Covid-19, ocorridas nas últimas horas.

É verdade que são números bastante reduzidos, quando comparados às mais de 100 mortes e 1.500 confirmações que chegaram a ser registradas, em um único dia, no pico da doença, entre o final de abril e o começo de maio.

Em um gráfico da Sespa, aliás, é possível ver, claramente, a grande redução, e tendência de redução, das mortes e confirmações, já que os casos foram colocados em uma linha temporal diária, de março para cá.

Veja abaixo:



Mesmo assim, há problemas.

E o principal é a subnotificação, que, como já visto, deve ser imensa.

Além disso, há o fato de que boa parte dos contaminados não apresenta sintomas.

E a probabilidade de que muitos desses assintomáticos esteja naquela fatia da população que descumpre o distanciamento social e, também, o isolamento, sempre que tem oportunidade.

E, ainda, a velocidade com que esse vírus se espalha.

O resultado é uma bomba relógio que poderá explodir pouco depois da reabertura desses estabelecimentos.

Até porque não há testes suficientes para a testagem em massa da população, e nem a possibilidade de rastrear os contatos de cada um dos infectados.

O próprio mapa exibido pelo governo à imprensa, na sexta-feira (e que abre esta postagem), é muito preocupante.

Nele, o estado foi divido em 8 grandes regiões.

Delas, 6 estão em vermelho, porque são de “alerta máximo”, já que abrigam municípios com alta taxa de transmissão dessa doença e baixa capacidade de resposta do sistema de saúde.

As outras duas regiões são aquelas em que ocorrerá a reabertura dessas atividades.

As duas, Araguaia e Metropolitana/Marajó Oriental/Baixo Tocantins, são de risco “médio”: a taxa de transmissão e a capacidade de resposta do sistema de saúde são “médias”.

Problema número 1: Pelo mapa, essas duas regiões estão ilhadas, no meio de um mar de alto risco.

Problema número 2: É para a Região Metropolitana, principalmente Belém, que desde sempre se deslocam os pacientes mais graves de todo o estado, de qualquer enfermidade.

E não apenas eles: também pessoas que trabalham aqui, ou que precisam resolver problemas que não conseguem resolver no interior, onde os sinais dos celulares são uma calamidade, a internet, quando existe, chega a doer de tão ruim, e onde não há determinados bancos e órgãos públicos.

É verdade que Helder manteve a suspensão do transporte intermunicipal de passageiros, exceto entre os municípios da Região Metropolitana.

Mesmo assim, pergunta-se: quanto tempo levará para que essas “ilhas médias” sejam invadidas por esse mar de alto risco?

Não seria mais prudente aguardar a melhoria de outras regiões do estado, antes de reabrir esses serviços?

Na Região Metropolitana, mais de 60% da população vive em favelas, aglomerada em cubículos, sem saneamento e, às vezes, até sem água.

Isso pode gerar uma tragédia inimaginável, diante de um vírus com essa velocidade de propagação.

Há notícias recentes sobre o potencial de disseminação dessa doença, nesses locais que serão reabertos.

Nos Estados Unidos, 2 cabeleireiros expuseram a esse vírus 140 pessoas, em um salão de beleza:

Em Santa Catarina, os casos de Covid-19 aumentaram sensivelmente depois que shoppings, igrejas e até restaurantes foram reabertos.

Dos 5.499 casos daquele estado, até o último 20 de maio, mais de 58% foram registrados após a reabertura desses estabelecimentos, diz a reportagem de um jornal local:

Em Blumenau, onde um shopping reabriu até com música, a doença também cresceu:


A reabertura desses locais, neste momento, é questionável até do ponto de vista econômico.

Porque as pessoas estão com medo.

E não vão ficar flanando em shopping center, para escolher o vestidinho da hora que não conseguirão usar nem no caixão. É simples assim.

Há reportagens, aliás, sobre esse baixo retorno financeiro, principalmente para os lojistas dos shoppings.

Além do medo, há o desestímulo causado pelas regras que têm de ser adotadas, para tornar esses ambientes menos inseguros.

A principal é o uso de máscara, que reduz em muito o risco de contágio, desde que observado um distanciamento mínimo de 1,5 metro das demais pessoas.

No entanto, a máscara não permite tomar nem sequer um copo d’água.

Ou fazer a barba. Ou pintar e cortar o cabelo direito, o que torna a reabertura de alguns desses locais até um “convite à transgressão”.

No caso do centro comercial de Belém, essa reabertura é ainda mais aflitiva, porque é lá que trabalham e fazem compras as pessoas mais pobres, justamente aquelas que essa doença mata mais.

E como se tudo isso não bastasse, não há fiscalização suficiente para todos esses locais, como admitiu, aliás, o prefeito de Belém, em uma entrevista à TV Liberal.

Então, que o Helder me perdoe, mas creio que ele e outros governadores só estão reabrindo esses serviços devido às violentas pressões do presidente da República, que não sossegará enquanto não massacrar milhares e milhares de brasileiros pobres, idosos e doentes.

Não quero ser injusta com o governador.

Reconheço, sim, todo o esforço que ele tem feito para proteger o nosso povo.

No Abelardo Santos, que ele transformou em pronto socorro, foram quase 29 mil atendimentos, até 28 de maio.

Na Policlínica, já são mais de 45 mil atendimentos, na capital e no interior.

Há, também, os hospitais de campanha, os mais de 1.800 leitos exclusivos para doentes da Covid-19, a contratação de médicos cubanos, entre muitas outras providências.

E há, principalmente, a resistência dele e de outros governadores, que se uniram contra o massacre da nossa população.

Quem conhece um pouco de contas públicas sabe o quanto tudo isso foi arriscado, já que o Governo Federal concentra, salvo engano, mais de 60% de todos os impostos arrecadados no Brasil.

Por isso, qualquer governador que brigue com o presidente da República, principalmente em se tratando de um sujeito como o Bolsonaro, acabará à míngua, sem dinheiro para investimentos em áreas essenciais, como Saúde e Segurança.

Penso, porém, que não há como concordar com a reabertura de serviços não-essenciais, enquanto não conseguirmos controlar a propagação desse vírus, que já contaminou mais de meio milhão de brasileiros, matando quase 30 mil.

E o que eu espero é que a sociedade se mobilize, e que o nosso Ministério Público cumpra com o seu dever, ajuizando todas as ações possíveis para manter fechados, pelo tempo que for preciso, todos os serviços não-essenciais no estado do Pará.

FUUUIIII!!!!

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