A fluir
Já não há mistérios no mundo, minha filha!...
Nem na ciência, nem na filosofia.
Nem nos chocolates que eu te punha a devorar...
Os deuses se foram!...
E nos deixaram a imensidão
(sempre além, sempre além...).
E o vazio da alma, que se concebe única.
Todos os dias meus olhos vasculham o horizonte, em busca de Deus.
Todos os dias a pele de meu corpo como que desaparece.
E os sentidos, em carne viva,
Procuram, em cada canto, o próprio significado...
Todos os dias, tudo se repete, como extensão de mim.
Todos os dias, o todo sou eu.
Mas o mundo é!...Muito além de mim!...
E eu me pergunto se não serei, apenas,
A impressão de um dia que não viveu.
A imagem de luz a vagar entre as estrelas,
A refletir-se nas folhas, na areia, no mar...
Mas imagem, tão somente, imagem...
Como coisa que se agarra à vida:
O sonho, o desejo, a potência...
E mesmo a dor se esconde de mim,
Como coisa que se oculta nas profundezas,
A suspirar...
E eu me descubro um mistério, em busca de mistérios que já não existem!...
Meu coração reduzido a uma fórmula, para que o mundo se torne exato!...
Descobri que a vida que explodia em meus olhos
Não passava de física, química, biologia...
E mesmo o Verbo, que tanto significava,
Tornou-se a caixa, o papel...
Não, não me restou nem a essência, nem a existência do inconcebível!...
Tudo é rio.
A fluir, a fluir, a fluir...
Belém, 23 de abril de 2007.
Um comentário:
Oh, perereca, como vc é louca... adorei este texto. parabéns e obrigado por tudo.
bjs
foca
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