O Ministério Público Federal (MPF) denunciou à Justiça Federal o castanheiro Manoel Ferreira de Oliveira e o missionário Luiz Carlos Ferreira por reduzirem à condição análoga a de escravos um total de 96 índios da etnia Zo'é, no oeste do Pará.
Os índios eram levados pelo missionário para a
região dos Campos Gerais de Óbidos, próximo de Santarém, onde eram convencidos
a coletar castanha em troca de panelas, roupas velhas, redes e outras
mercadorias industrializadas.
Em três ocasiões, servidores da Fundação Nacional do
Índio (Funai) e da Secretaria Especial de Saúde Indígena constataram o emprego
dos indígenas como coletores, em péssimas condições de trabalho.
“Os indígenas permaneciam acampados em meio ao mato,
em barracas de lona e de palha, havendo dentre eles alguns doentes”, relata a
denúncia do MPF. “Segundo relatos, no local faltava comida e os índios estavam
visivelmente magros, alguns deles doentes. Em fevereiro de 2012, um indígena
que lá estava foi deslocado às pressas para atendimento médico apresentando
quadro de pneumonia grave”, prossegue a peça, assinada pelo procurador da
República Camões Boaventura.
Luiz Carlos Ferreira é hoje ligado à Igreja Batista
de Santarém e tem uma “base missionária” dentro das terras de Manoel Ferreira
de Oliveira de onde faz as incursões no território indígena, para convencer os
índios a irem trabalhar no castanhal.
Os dois já são conhecidos da justiça brasileira.
Ambos fizeram parte, na década de 1980, da Missão Novas Tribos do Brasil, uma
agência missionária que tem como objetivo declarado evangelizar os povos
indígenas e que foi expulsa da região pela Funai em 1988.
A Missão está proibida de voltar por decisão do
Supremo Tribunal Federal, que concordou com um pedido feito pelo MPF.
A prática da Missão Novas Tribos foi considerada
proselitismo religioso, “expediente de todo condenável, uma vez que viola
frontalmente o princípio da autodeterminação dos povos indígenas e o direito à
manutenção de suas culturas próprias, que, por sua vez, encontram inequívoco
abrigo normativo na Constituição Federal de 1988, na Declaração das Nações
Unidas sobre o Direito dos Povos Indígenas e na Convenção nº 169 da Organização
Internacional do Trabalho”, afirma o MPF.
Com a retirada da Missão da área, a partir da década
de 1990 Manoel e Luiz Carlos passaram a atuar em associação para recrutar os
indígenas para o trabalho de extração das castanhas. Só em outubro de 2010 a
Funai conseguiu flagrar o crime. Nessa ocasião, 96 índios Zo'é foram
encontrados trabalhando nos castanhais.
“Cumpre destacar que a etnia Zo´é é considerada um
povo de recente contato e possui significativas dificuldades de comunicação com
a sociedade envolvente. Dinheiro para os índios Zo´é não passa de indubitável
abstração, sendo, portanto, algo totalmente alheio à sua cultura peculiar. A
vulnerabilidade dessa etnia é fato inafastável”.
Os dois acusados podem ser condenados nas penas
previstas pelo artigo 149 do Código Penal (redução à condição análoga à de
escravo) com o agravante previsto no artigo 59 do Estatuto do Índio (crime
contra a pessoa, o patrimônio ou os costumes de comunidade indígena). A
denúncia será apreciada pela Justiça Federal de Santarém.
Processo
nº 0001407-82.2015.4.01.3902 - Justiça Federal em Santarém
Íntegra
da ação:
Acompanhamento
processual:
(Fonte:
Ascom/MPF)
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