segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Aumento leva salário dos desembargadores paraenses para mais de R$ 30 mil. É 15 vezes o que ganha um professor do fundamental e quase o dobro do que recebem cientistas das universidades federais no topo da carreira. Afinal, o que ganham os nossos meritíssimos é muito ou pouco? Até quando vamos empurrar com a barriga a reforma do Judiciário brasileiro?





No blog do Manuel Dutra, de Santarém:

“O Pará é um Estado rico. Vê-se pelo salário dos seus juízes 

Um trabalhador no rés do chão ganha hoje um mínimo de R$ 788,00. Um professor de escola fundamental tem um piso (muitos municípios nem isso pagam) de R$ 1.917,78. Nas universidades federais, um cientista, titular (professor, pesquisador) com cerca de 20 anos de atividade e já no topo da carreira, percebe R$ 17.057,74. Já o professor-doutor iniciante recebe R$ 10.007,24. Na magistratura paraense os juízes do Estado entraram o ano de 2015 com um novo salário que vai de R$ 30.471,11 (desembargador) até R$ 21.198,40 (pretor do interior). Nada mal que um juiz seja bem remunerado, dadas as suas grandes responsabilidades. O que intriga é a diferença, a desigualdade que não é privilégio do Pará, é uma realidade nacional, que estarrece observadores de países ditos desenvolvidos”. 

No blog do Manuel Dutra você encontra a tabela com os novos salários no TJE e, também, o quadro com os salários dos cientistas e docentes das universidades federais. No topo da carreira, um doutor recebe, agora em 2015, pouco mais de R$ 17 mil.

Ainda naquele blog, há a cópia (na íntegra) da Resolução que reajustou os ganhos dos nossos Meritíssimos. Aqui:  http://blogmanueldutra.blogspot.com.br/2015/02/o-para-e-um-estado-rico-ve-se-pelo.html 

A opinião da blogueira: 

O professor e jornalista Manuel Dutra nos convida a uma interessante reflexão acerca desse abismo entre os ganhos dos nossos meritíssimos e os ganhos de um trabalhador comum.

Particularmente, não creio que os nossos magistrados ganhem muito.

Apesar dos embates que já tive (e que certamente ainda terei) com muitos deles, penso que um magistrado honesto e de fato comprometido com o seu trabalho leva uma vida de cão.

Não é “apenas” o peso da responsabilidade de julgar (e o erro de um magistrado pode arrasar a vida de um indivíduo e até a sociedade inteira).

É, também, a carga desumana de trabalho, tendo em vista a reduzida quantidade de juízes e a montanha de processos judiciais.

São pilhas e mais pilhas de papéis, elementos materiais, testemunhos, citações, argumentos jurídicos que têm de ser examinados em cada um desses processos, por um sujeito que é apenas e tão somente humano. E que tem família – casa, mulher, marido, filhos.

Quer dizer: a nossa revolta, frustração, indignação com a Justiça brasileira por vezes nos leva a esquecer que estamos a falar de seres humanos, submetidos a um esforço cotidiano extremamente desgastante, física e mentalmente.

Pela minha própria experiência em lidar com pilhas de papéis, imagino que um sujeito desses, muitas vezes, não tem tempo nem pra comer, dormir, tomar banho.

Deve levar trabalho pra casa e passar noites e noites em claro.

Até porque a responsabilidade de um magistrado é infinitamente superior à minha.

Eu, em minhas reportagens investigativas, apenas levanto a bola, aponto indícios. Mas quem vai julgar é aquele fumado, que vai ter de se virar nos trinta, em meio a uma tonelada de processos.

Eu, se errar, posso corrigir, quase que imediatamente em meu blog. Mas quem é que “corrige” os danos causados a um inocente, condenado erroneamente? 

Creio, também, que a influência político-partidária no Judiciário deve provocar enorme frustração nos bons juízes, já que muitas vezes não é a técnica, a competência, o mérito, que determina a ascensão funcional – e sim, o apadrinhamento, o compadrio. Um tipo de interferência, aliás, referido até pela ex-corregedora do CNJ, Eliana Calmon (aqui: http://pererecadavizinha.blogspot.com.br/2011/04/sensacional-corte-dos-padrinhos-sera.html).

Todas essas são questões que a sociedade brasileira precisa discutir urgentemente, e de forma desapaixonada.

Temos, sim, de apertar o controle social sobre a Magistratura, até acabando com essa pouca vergonha que é a aposentadoria compulsória, já que o sujeito que pisou feio na bola vai pra casa com uma baba de dinheiro.

Os magistrados precisam se compreender como cidadãos. Em uma função extraordinária, é verdade, mas apenas e tão somente cidadãos. E não mais como “togas esvoaçantes”, coisas etéreas,  que pairam acima do Bem e do Mal.

No entanto, ao mesmo tempo em que apertamos o controle sobre a Magistratura, também temos de lhe garantir condições de trabalho – o que passa, sim, por bons salários, aumento do  quantitativo de juízes, reciclagem constante, informatização do Judiciário, etc.

E, é claro, ampla reforma da Legislação, para acabar com essa história de  levar até unha encravada aos tribunais; e, principalmente, ampla reforma estrutural, para que prevaleça, de fato, o mérito - e não a futrica e o compadrio – na ascensão funcional.


Sem mexer no Judiciário, a gente não vai conseguir avançar. O ranço que ainda permeia a estrutura desse Poder pode acabar é se transformando em um câncer na Democracia brasileira.

Mas não podemos abordar uma questão tão importante com maniqueísmos, até porque maniqueísmo emburrece. E esse negócio de nutrir ódio por quem pensa diferente faz mal pro fígado e atrasa a alma.

Por mais revoltantes que nos pareçam determinadas sentenças, às vezes a culpa nem é do magistrado – e sim, da precariedade do trabalho investigativo, na base processual.

E isso nos leva à necessidade de investir, também poderosamente, na Polícia e no Ministério Público, outras duas instituições cujos integrantes estão expostos a uma carga desumana de trabalho.

Não seria o caso de afrouxar a Lei de Responsabilidade Fiscal nessas instituições que demandam enorme quantidade de recursos humanos, para um trabalho lá na ponta e que é fundamental para a garantia de direitos da Cidadania? Não seria esse o caso, também, da Saúde e da Educação?

Penso, ainda, que precisamos acabar com esse branqueamento secular  do Judiciário brasileiro, que leva, por vezes, ao conservadorismo atroz de vários de seus integrantes.

Precisamos chamar esses cidadãos para um amplo debate com a sociedade. Mas, também, temos de encontrar mecanismos para garantir maior acesso de pobres e de não-brancos a todo o corpo desse Poder.

Na minha opinião,  a melhor ferramenta para isso é uma Constituinte exclusiva.

Mas enquanto ela não vem, a gente pode ao menos gastar cuspe,  né não?

E já temos, aqui mesmo no Pará, dois excelentes pontos de partida.

Um é a discussão acerca dos ganhos dos nossos meritíssimos. Outro, a judicialização da censura.

Quem se habilita?

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