sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Corrupção turbina financiamento de campanha



No Terra Magazine:



"Não é à toa que praticamente todos os grandes partidos tenham sido pilhados em flagrante, nos últimos anos, negociando apoios políticos em troca de verbas e cargos públicos. É uma prática generalizada", lamenta o presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe) e membro do comitê nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), o juiz Márlon Jacinto Reis, do Maranhão.


Entrevistado por Terra Magazine, ele critica o sistema eleitoral brasileiro e propõe mudanças drásticas para banir a "mercantilização" e o "personalismo" que, acredita, degradam a política brasileira, de Norte a Sul. Resumindo, "interesses particulares sobre os interesses públicos".


Aos 40 anos, Reis não foge de análises diretas e pesadas. "Quem faz doações vultosas realmente o faz com o único propósito de influenciar as decisões futuras do governo", torna mais do que claro.


Ele maldiz principalmente o suporte a candidaturas: "As campanhas são financiadas com verbas públicas desviadas pra este fim eleitoral, de manter no poder quem está lá. O restante vem de grandes grupos interessados em contratar com o governo". E conclui: "O Estado deixa de ser Estado, é capturado por fontes ilícitas e deixa de servir ao coletivo".


Explica-se a vantagem do jogo de bancar campanhas de parlamentares: "Sai barato gastar alguns milhões na eleição de alguém que pode ter uma influência imensa na definição do orçamento, principalmente quando isso acontece em grupo".


O magistrado acredita que a dependência excessiva da economia nacional em prestar serviço ao Estado impede o desenvolvimento efetivo do País. E atribui ao Poder Judiciário uma grande parcela de responsabilidade dos problemas brasileiros. Por isso, apoia "uma reforma judiciária baseada não exclusivamente em aspectos técnicos, mas também em aspectos valorativos, de tal maneira que possa colaborar, de maneira mais eficiente, para o aprimoramento da sociedade".



Leia a entrevista.



Terra Magazine - Como o senhor avalia o sistema eleitoral brasileiro?
Márlon Reis -
O sistema eleitoral brasileiro é fruto de uma tradição de concepção privatista do Estado. A figura do indivíduo prevalece sobre a coletividade, e os interesses particulares sobre os interesses públicos. Isso é demonstrado em vários aspectos da legislação. As pessoas têm a falsa impressão de que estão votando em indivíduos. Na verdade, uma série de cálculos, que formam o que se chama de quociente partidário, altera o resultado, faz com que não seja o simples somatório de votos que o faça ser eleito. A impressão dos eleitores de votar em indivíduos alimenta as relações clintelistas locais, fazendo chefes regionais terem a preponderância nos processos eleitorais. Ao invés de ideologias e bandeiras, prevalece a tensionalidade de caciques políticos locais.
O partido sabe que, por causa do quociente, é preciso fazer alianças com outros partidos pra ter o volume de votos necessários. Nessas alianças, os partidos se preocupam com a viabilidade eleitoral, e não com o conteúdo da eleição. O eleitor também não se preocupa com o conteúdo da candidatura, e sim com a personalidade do candidato. Quando bem intencionado, o eleitor procura um líder transformador. O mau intencionado negocia com o candidato, vendendo seu voto... Então, as relações são individualizadas e mercantilizadas. Os partidos negociam em termos financeiros a adesão de aliados partidários. E os candidatos também negociam com o eleitorado em troca de favores a concessão de votos. O sistema eleitoral favorece isso, ao vender a ilusão do voto no indivíduo e forçar coligações de partidos, independenemente de sua ideologia, sem critétrio, apenas por pragmatismo.



Terra Magazine: Como se deve combater a impunidade?
Márion Reis:
Quando se institui uma política baseada nisso, em personalismo e mercantilização, estamos falando da forma de acesso das pessoas ao poder. E são justamente estas pessoas que estão encarregadas de criar as normas para barrar processos de corrupção. O Brasil é carente de normas, de uma institucionalidade que, de fato, enfrente a corrupção. É razoável que seja assim, pois o próprio sistema eleitoral já favorece a eleição de pessoas que precisarão ter, inclusive durante o processo eleitoral, manejado recursos de forma ilícita. Não é à toa que praticamente todos os grandes partidos tenham sido pilhados em flagrante, nos últimos anos, negociando apoios políticos em troca de verbas e cargos públicos. Este episódio também acontece em quase todos os demais partidos. É uma prática generalizada. Durante o processo eleitoral, as alianças são negociadas com base em trocas, que são sempre financeiras, que se baseiam na concessão de oportunidades de recursos - muitas vezes públicos -, e cargos, que também têm a finalidade de movimentar recursos públicos para fins políticos. Ao partilhar cargos entre aliados, os governantes distribuem, na sua base, as portas de acesso a altos volumes de dinheiro público que vão nutrir aquela aliança, que é o que justifica a permanência nos governos. Isso acontece em todos os âmbitos da vida pública. Com uma política baseada nestas regras, fica difícil imaginar que estas mesmas pessoas, exercendo o poder, vão gerar a institucionalidade necessária para combater aquilo de que eles próprios vão precisar para garantir sua permanente eleição.


A íntegra está aqui:

http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI4190267-EI6578,00-Nas+eleicoes+fontes+ilicitas+capturam+o+Estado+opina+juiz.html


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