segunda-feira, 23 de abril de 2007

A Fênix


A Fênix



Que incrível poder, esse, de renascer!... De ver além da pedrinha, da mão ruim do baralho. O poder de Estar, apesar da corrente. O poder de Ser aquilo que se quer!
Que venham as cinzas, a sombra! Que venha o inverno, o sol escaldante. O sol!
Para além do deserto, muito além do deserto, a música me levará!
A música, que é o meu amor!
Sem ela, simplesmente, não vivo. Porque não há por que viver!
E eu meu deixo levar nas suas asas breves. Como sempre me deixei, afinal.
E o mundo será, sempre, a eterna aprendizagem! De música!

O mundo é feito de música!...


Let's start at the very beginning
A very good place to start
When you read you begin with A-B-C
When you sing you begin with do-re-mi

Do-re-mi, do-re-mi
The first three notes just happen to be
Do-re-mi, do-re-mi

[Maria:]
Do-re-mi-fa-so-la-ti
[spoken]
Let's see if I can make it easy

Doe, a deer, a female deer
Ray, a drop of golden sun
Me, a name I call myself
Far, a long, long way to run
Sew, a needle pulling thread
La, a note to follow Sew
Tea, a drink with jam and bread
That will bring us back to Do (oh-oh-oh)

[Maria and Children:]
[Repeat above verse twice]

[Maria:]
Do-re-mi-fa-so-la-ti-do
So-do!

[Maria: (spoken)]
Now children, do-re-mi-fa-so and so on
are only the tools we use to build a song.
Once you have these notes in your heads,
you can sing a million different tunes by mixing them
up.
Like this.

So Do La Fa Mi Do Re
[spoken]
Can you do that?
[Children:]
So Do La Fa Mi Do Re
[Maria:]
So Do La Ti Do Re Do
[Children:]
So Do La Ti Do Re Do
[Maria:]
[spoken]
Now, put it all together.

[Maria and Children:]
So Do La Fa Mi Do Re, So Do La Ti Do Re Do
[Maria:]
[spoken]
Good!
[Brigitta:]
[spoken]
But it doesn't mean anything.
[Maria:]
[spoken]
So we put in words. One word for every note. Like
this.

When you know the notes to sing
You can sing most anything
[spoken]
Together!

[Maria and Children:]
When you know the notes to sing
You can sing most anything

Doe, a deer, a female deer
Ray, a drop of golden sun
Me, a name I call myself
Far, a long, long way to run
Sew, a needle pulling thread
La, a note to follow Sew
Tea, a drink with jam and bread
That will bring us back to Do

Do Re Mi Fa So La Ti Do
Do Ti La So Fa Mi Re

[Children:]
Do Mi Mi
Mi So So
Re Fa Fa
La Ti Ti
[Repeat above verse 4x as Maria sings]

[Maria:]
When you know the notes to sing
You can sing most anything

[Maria and Children:]
Doe, a deer, a female deer
Ray, a drop of golden sun
Me, a name I call myself
Far, a long, long way to run
Sew, a needle pulling thread
La, a note to follow Sew
Tea, a drink with jam and bread
That will bring us back to

[Maria:]
[Children:]

Do . . . So Do
Re . . . La Fa
Mi . . . Mi Do
Fa . . . Re
So . . . So Do
La . . . La Fa
Ti . . . La So Fa Mi Re
Ti Do - oh - oh Ti Do -- So Do


(A Noviça Rebelde (trilha Sonora) - Do-Re-Mi
Richard Rodgers & Oscar Hammerstein II)

divagando, divagando...

A fluir

Já não há mistérios no mundo, minha filha!...
Nem na ciência, nem na filosofia.
Nem nos chocolates que eu te punha a devorar...
Os deuses se foram!...
E nos deixaram a imensidão
(sempre além, sempre além...).
E o vazio da alma, que se concebe única.
Todos os dias meus olhos vasculham o horizonte, em busca de Deus.

Todos os dias a pele de meu corpo como que desaparece.
E os sentidos, em carne viva,
Procuram, em cada canto, o próprio significado...
Todos os dias, tudo se repete, como extensão de mim.

Todos os dias, o todo sou eu.
Mas o mundo é!...Muito além de mim!...
E eu me pergunto se não serei, apenas,
A impressão de um dia que não viveu.
A imagem de luz a vagar entre as estrelas,
A refletir-se nas folhas, na areia, no mar...
Mas imagem, tão somente, imagem...
Como coisa que se agarra à vida:
O sonho, o desejo, a potência...
E mesmo a dor se esconde de mim,
Como coisa que se oculta nas profundezas,
A suspirar...
E eu me descubro um mistério, em busca de mistérios que já não existem!...
Meu coração reduzido a uma fórmula, para que o mundo se torne exato!...
Descobri que a vida que explodia em meus olhos
Não passava de física, química, biologia...
E mesmo o Verbo, que tanto significava,
Tornou-se a caixa, o papel...
Não, não me restou nem a essência, nem a existência do inconcebível!...

Tudo é rio.
A fluir, a fluir, a fluir...

Belém, 23 de abril de 2007.

domingo, 22 de abril de 2007


Mulheres



Capítulo I


Levanta, mija, bebe água. Conta carneirinhos; 1, 2, 3, 4, 5 ...Olha o relógio - 6 da manhã. Mais um dia, mais cansaço (de quê?...).
Abre uma carteira de cigarros – a terceira da noite. Levanta, espia à janela. Silêncio... Uma sombra caminha pelas ruas... cheiro de café... (será que o boteco já abriu?...). Desce a escada.
O boteco está cheio. Senta ao balcão, pede uma cerveja, duas, três. Um homem engole um café. Não sente o cheiro, nem o gosto. Apenas o engole (por vezes, esqueço de ter-me olhado ao espelho e acredito na própria inexistência. Mas inexistir já é condição. Assim como o nada...).
Ganha a rua em passos trôpegos (qual a sensação do não ser?...). Uma mulher esquiva-se dos carros, um filho agarrado aos braços. Um homem arruma, na calçada, pinturas de santos. Um menino sujo e faminto morde um pedaço de pão.
No monumento da praça, o beato nu grita e gargalha:
_Multiplicai-vos, multiplicai-vos, porque é só o que vos resta. Vossos filhos herdarão a terra, a esterilidade da terra, até que se apague o último cigarro!...
Dez horas. O sol expulsa a neblina. Cai na sarjeta (me sucedo a cada dia, no rearranjo de minhas células. Por que tenho a sensação de que não passo de um feto morto?...)
Levanta, retorna ao quarto. Deita novamente. Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (os dias não serão meras palavras...) Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (foi só ontem que percebi essas sombras em teu rosto. Ontem, quando tuas mãos passeavam em minhas coxas e o teu hálito era mais quente que de costume...) Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (matei-te a golpes de canivete, cortei-te a língua e fiquei a mastigá-la lentamente. E o teu sabor é de bicho no cio...) Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (vi uma barata num canto, quieta, parada, fugindo da morte. Se tivesse deuses, teria rezado...) Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (a vida não é começo, nem fim. A vida é um beco...) Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (o fim é um estalar de dedos...) Tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac (uma navalha que rebrilha na noite...) Tac.
_Mariana...Mariana!
_O quê?
_Tá cheirando a queimado!
_O feijão!!!...
Tira a tampa, mete a colher, troca de panela, coloca mais água.
_Parece que se puser uma cebola com casca tira o cheiro... sei lá!...
_Que diabo ta acontecendo contigo? Em que estavas pensando?
_Em nada, Fernando...Só me distraí...É que não dormi direito...
_De novo?!!! Por que não procuras um médico? Eu já te disse que isso não é normal!...Ninguém pode passar noites e noites sem dormir, Mariana!...O que é que ta havendo contigo?
_Não é nada, eu já não disse? Eu só ando meio preocupada com as meninas. A Lucinha e essa adolescência horrível, que nunca mais que acaba...A Luísa, que não estuda...E tem, também, o trabalho, que anda pesado...Tô cansada, estressada, é só!...
_É...Se te fechas em copas, o que é que eu posso fazer?...
_Eu não to me fechando em copas, porra nenhuma! Tu é que tens essa mania irritante de ficar fazendo tempestade em copo d’agua! Se não durmo, é porque to doente...Se sonho, é porque tô ficando doida...De vez em quando, Fernando, só de vez em quando, será que não podias viver tua própria vida e deixar a minha vida em paz?
_É engraçado!...Às vezes, eu tenho a sensação de que pensas que eu sou burro!...Não existe a tua vida ou a minha vida, nem três, nem quatro!... O que existe, Mariana, é a nossa vida, a nossa!... Que tu estás fazendo o favor de jogar fora, com essa tua mania de te fechares em ti mesma!...Por que não te abres comigo? Por que não me dizes o que estavas pensando? Como é que eu posso te entender, se não falas comigo?
_(Até parece que ele entenderia! Ou que, ao menos, faria o mínimo esforço para entender!...)
_Eu preciso ir embora...Já tô atrasado...Quando eu voltar, à noite, a gente conversa...
_Se voltares, não é? Se não arranjares outra lambaia pra dormir!...
_Eu nunca mais fiz isso, Mariana!...
_Nunca mais!...Que grande consolo, não é mesmo? Como se pudesses ter feito!...
_Eu já te disse uma vez: a tua agressividade, não me atinge mais! Doía no começo, há muitos anos, te lembras? Agora, já não faz a mínima diferença!...Simplesmente, não me atinge!...
_Ok, Batfino: as tuas balas não me atingem, porque as minhas asas são duas couraças de aço!...ah, ah, ah!...
_Definitivamente, eu não tenho tempo pra isso!...Fica aí com o teu ódio e a tua frustração!...Ah, e não precisas botar nenhuma cebola nessa porcaria!...Tô sem tempo, meu amor! Não venho almoçar!... Fui!



Capítulo II




Em 1.920, Anajás era um vilarejo perdido na imensidão do Marajó. Possuía menos de mil habitantes e uma rua principal, que começava e acabava no rio. Em uma das margens era, também, o rio. Na outra, um amontoado de cabanas de barro socado, cobertas de palha.
O clima, quente e úmido, favorecia a proliferação de insetos, que disputavam, com esquálidos seres humanos, cada palmo de território.
Mês a mês, aportava o regatão, cheio de quinquilharias: tecidos e perfumes baratos, carne salgada, pão bolorento. O pagamento era em mercadorias – bolotas de seringa, madeira, peles de animais silvestres - revendidas pelos olhos da cara, em Manaus e Belém.
À época, era preciso uma boa dose de coragem para vencer a incerteza daqueles rios, que mais pareciam mar; os milhares de sons da floresta, dominada por anhangás; as estranhas febres que surgiam de repente e que matavam mais depressa ainda.
E foi por tanta desolação que causou espanto, quando, em 03 de fevereiro daquele ano de Nosso Senhor, os anajaenses viram desembarcar aquele homem alto, louro, de claríssimos olhos azuis. As malas e a sacaria anunciavam que viera para ficar. Os modos educados e o português repleto de palavras incompreensíveis lhe valeram o apelido de “dotô”.
Waldomiro Brunswick tinha, então, 27 anos a esquecer. O pai, um ex-padre holandês migrado para o Maranhão, morrera, meses antes, à mesa de um boteco de São Luís, após consumir litro e meio de cachaça. Em 35 anos de exílio forçado, casara com uma maranhense, fizera seis filhos, comprara milhares de hectares, dezena de armarinhos, mas nunca conseguira habituar-se àquela terra selvagem, tão distante da sua Amsterdã.
Dia após dia, legara aos filhos, além de polpuda herança, uma história de dor: socos, tapas, surras de cinto, de corda, de cipó; a lembrança dos gritos desesperados da mãe, que vinham do quarto ao lado.
Com o corpo moído pelas constantes sovas, as noites mal dormidas e o trabalho de sol a sol no roçado, só a muito custo Waldomiro concluíra o Colegial. Ficou-lhe a frustração de não fazer faculdade; de não conseguir tornar-se, de fato, um doutor. Lia tudo o que lhe caía nas mãos – jornais, revistas, romances, História, Filosofia. Amava, sobretudo, Platão. E acreditava, piamente, que o conhecimento conduz ao caminho do bem...


Capítulo III


_ Bastiana, ô Bastiana! (Ô minina danada, meu Deus! Pareci inté que tem u bichu nu côrpu!). Bastianaaaa!
A mãe olha ao redor e nada da garota. O rosto vermelho de raiva, enche os pulmões:
_ Diabu! Cão do infernu! Ti apegu pêlus cabelus i ti deixu ruxinha, ruxinha...
A menina sai da mata em disparada. O rosto moreno coberto de suor.
_ A sinhora chamô?
_ Ondi é qui ti ametesti, praga du infernu?
_Tava fazendu necessidadi...
_ Tu tá pensandu qui su truxa? Tu ti assumisti desdi u aumuçu. Tu tava era ti arrebulandu com aquelis mulequis du sir Zé. Uuulha qui si ti apegu prênha...
A menina ergueu o queixo.
_ Si a sinhôra quizé, lhi alevu inté lá, pra modu di vê u cocô..
O tapa zuniu. Sebastiana balançou a cabeça meio zonza.
_ Ti alevanta mais é e vai inté a mêrciaria du sir Zé e mi traiz uma saca di feijãu.
Sebastiana pôs-se a andar por uma picada, sem olhar para a mãe. Não queria que lhe visse as lágrimas, nem a revolta estampada nos olhos. (Pur tudu i pur nada mi assenta a mão na cara. Mi bati qui nem cachôrru!...).
Havia vezes que sentia pela mãe um ódio crescente, semelhante às pancadas que levava, dia após dia, semana após semana. Queria partir daquela mãe (rúim quinem bichu!...) e daquele fim de mundo. Queria conhecer a Belém de que tanto ouvira falar, pelos filhos de seu Zé e os donos dos regatões.
Sebastiana, morena forte e bela, os homens enchiam de presentes. Os donos dos regatões davam-lhe tecidos, perfumes; os filhos de seu Zé roubavam carne seca, para agradá-la.
Por mais simples e soltos que fossem os vestidos, não conseguiam esconder o fulgor daqueles 15 anos; aquele corpo carnudo, em cujas proporções a natureza se pusera a cismar...
Indiazinha braba! Brigava com os moleques de igual para igual, chamando-lhes toda a sorte de nomes e assentando-lhes pontapés. A força parecia fluir do fundo da alma. Também atirava melhor que a maioria dos homens, que, por isso, lhe guardavam respeito.
Respeito, também, lhe guardava o pai que, havia dois anos, tentara estuprá-la. Sebastiana acordou com o peso daquele homem enorme, com cheiro forte a cachaça. Assentou-lhe uma joelhada entre as pernas, correu para a cozinha, pegou num facão e disse, a voz pausada:
_ Si u sinhô dé mais um passu lhi arrancu as tripa di fora. Lhi arretalhu tudinhu, tudinhu feitu um pôrcu.


Capítulo IV


_ Sir Zé!
_ O que queres, ó miúda?
_ A mãi mandô pidi uma saca di feijãu.
_ Ô raios! Mas isto assim não pode ser! Pois, já lá vão dois meses que a senhora sua mãe prometeu pagar-me e ainda não lhe vi um tostão! Isto assim está muito mal, muito mal! Pois diga a senhora dona Benigna que ou paga-me o que deve ou daqui não verá nem mais dedal de mel coado.
_ U senhô divia era dizê mas issu pra ela, purque eu num tenhu nada qui vê cum isso. Mas pareci inté qui u sinhô tem medu dela...
_ Ô miúda, bem se vê que és mesmo muito atrevida! Pois, onde é que já se viu falar-me desse jeito? Pois, só estou a dizer que isto cá anda muito mal! Tenho pela senhora sua mãe a maior das considerações, mas isso assim não pode ser! Pois, a mim, quem é que me fia? Quem é que há de dar-me um bocado de pão? Não estou cá para arreliar-me desse jeito! Qualquer dia, vou-me mais é para Lisboa.... Mas onde é que já se viu? Por acaso fiz algum mal a Deus?
_ Ulha, sir Zé, si u sinhô num quisé fiá, tudu bem. Mas dispuis quem vai vim aqui é a mãi, qui anda reivosa, reivosa puru sinhô andá fiandu cachaça pru papai. Aí ela vai lhi dizê tuda sorti di disaforu, qui nem da última veiz....
_ Pois estás é muito enganada, ó rapariga, se pensas que tenho medo a senhora dona Benigna. Só não lhe dei uns tapas bem assentes, naquele dia, porque lá não sou homem de bater em mulher! Anda! Vê se te avias, mais é! Tens ali atrás o feijão! Leva o que quiseres! Tanto se me dá, pois isto cá anda muito mal, muito mal!
Sebastiana correu até os fundos da casa e estava quase acabando de encher um saco grande de sarrapilheira, quando, ao olhar através da porta, deu com aquele homem em frente ao balcão (diabu! Qui pareci inté Jesus Cristu!).
Um turbilhão de sensações esquisitas tomou-lhe o peito: medo, angústia, desassossego, uma espécie de torpor. Imaginou-se a remar no meio de um grande rio, o azul do céu faiscando nos olhos de Waldomiro, que, agora, também olhava para ela e, lentamente, ia se aproximando.
_ A senhorita precisa de ajuda?
_Num careci não...
_Mas a saca é muito pesada! Se quiser, ajudo a levar.
_Já dissi qui num careci! Possu inté parecê piquena, mais si duvidá, moçu, aguento inté mas pesu qui u sinhô...
Apanhou a saca, que devia ter uns 20 quilos, e colocou-a nas costas. Waldomiro ficou a olhar aquele corpo miúdo, vergado pela saca imensa, a sumir no horizonte. E a deixar para trás um cheiro forte a patchouli...

sábado, 14 de abril de 2007

Leiam até o fim!

A Lógica do PT




I

A disputa interna do PT faz parte do mais genuíno jogo democrático. E só causa tanto alvoroço porque, no Brasil – e especialmente no Norte e Nordeste – os partidos políticos, em geral, se assemelham mais a “currais” do que, propriamente, a partidos políticos.


De um modo geral, as nossas agremiações partidárias são meras extensões do quintal de um “coronel”. O “iluminado” quer, pode e manda. E os demais, prontamente, obedecem.

Quem, no meio político, já não ouviu aquela frase odiosa: “manda quem pode, obedece quem tem juízo”? Dita como se fosse espécie de oráculo, mas, que é, na verdade, pieguice autoritária, que já não encontra guarida nem na esfera privada.

Mas, nas nossas estruturas partidárias, altamente hierarquizadas, uns são mais cidadãos que outros. O que significa dizer que não são democráticas, mas, sim, oligárquicas.

Essa lógica, porém, não cabe na cabeça de um petista – e nem poderia, até pela própria história partidária.

O PT nasceu dos movimentos sociais. Foi “construído” – para usar um jargão muito apreciado pelos “companheiros” – a partir de um punhado de lideranças. E para tais lideranças, bem como para seus liderados - igualmente politizados, diga-se de passagem - não apenas as lutas são coletivas. Mas, principalmente, as decisões.

Por isso, para que um petista se comprometa, de fato, com uma batalha, é preciso que se compreenda partícipe dela. E isso significa manifestar, livremente, no âmbito interno, aquilo que pensa. E lutar por aquilo que considera justo, com todas as armas que o jogo democrático disponibiliza aos cidadãos – aí incluído o rabo de arraia e o aliciamento de quem vive doido para ser aliciado...

O PT não é um ajuntamento de santos – nenhum partido é. E, à semelhança de todas as agremiações, quer, sim, o poder. Até porque, se não quisesse, nem partido seria, uma vez que a disputa pelo poder faz parte da essência dessas agremiações.

É, como já se disse tantas vezes, o que mais se aproxima, de fato, de um partido político, no Brasil. É tão partido, que consegue permanecer impermeável ao domínio de um coronel, mesmo nas regiões mais pobres e menos politizadas do País.

E isso, diga-se de passagem, é o oposto do que acontece no partido-irmão, o PSDB, que, apesar de construir vários pólos de poder, internamente, no resto do país, parece haver se rendido, nas regiões mais atrasadas, ao coronelismo que deveria combater.


II


E aqui gostaria de deixar bem claro uma coisa, que já repisei em vários posts: não sou petista e nem cultivo pelo PT grandes simpatias. Em bom tucanês, considero até, como direi, “pitorescas”, algumas de suas práticas.

Não estou, portanto, a elogiar os petistas. Mas a constatar a forma como se organizam.


Convivo muito bem com os petistas, porque compreendo - e respeito - a forma como pensam. Mas já critiquei – até impiedosamente, diga-se de passagem – a mundivisão estreita que cultivam e as práticas decorrentes.

Não concordo, por exemplo, com o messianismo petista, essa mania de dividir o mundo em claro e escuro – e eles, é claro, como espécie de latifundiários da claridade do universo - sem que consigam enxergar o cinza imenso por trás dessas duas grandes regiões.

De há muito superei esse tatibitati que separa seres humanos em anjos e demônios: para mim são, simplesmente, pessoas, gente de carne e osso, com as suas circunstâncias e motivações.

Partido não é religião. Quem procura isso, em política, deveria é fundar uma igreja neopentecostal.

Também divirjo do PT na utilização de práticas arcaicas da política e no que isso significa, em termos de contradição, com a democracia interna que cultivam e que dizem querer massificar. Querem esgotar o debate, a partir da livre manifestação de todas as correntes e politizar as massas, para que sejam, de fato, senhoras do próprio destino.

Mas não têm qualquer pudor em estimular, externamente, o culto à personalidade, ao “paizinho dos pobres”, por exemplo, ou em utilizar estratégias de propaganda que nada mais são do que pura e simples manipulação mental. Ou seja, o oposto da pedagogia dos oprimidos.

O problema é que os petistas se imaginam detentores de uma “sabedoria”, uma compreensão da realidade que o público externo não é capaz de alcançar. E têm, também, profunda incapacidade de estabelecer, claramente, até onde se pode ir pela conquista e manutenção do poder. Dessas duas nuances, advêm duas crises existenciais recorrentes do petismo.

A primeira é a dificuldade em estabelecer alianças e, em as estabelecendo, dividir o bolo com as demais agremiações, após a conquista do poder. É bem verdade que o poder tem ensinado muito ao PT, nestes dez anos. Muitos petistas já compreendem a importância do respeito ao outro e do cumprimento dos acordos partidários, para a convivência democrática. Mas a maioria continua sem conseguir demonstrar, ao menos, um mínimo de pragmatismo. E segue enclausurada no “Santo dos Santos” que insiste em cultivar.

A segunda é a hipocrisia diante das práticas necessárias à acumulação de recursos, para a conquista e manutenção do poder. É claro que há limites. Mas nem o PT, nem o PSDB, os gêmeos de esquerda que conseguiram chegar ao poder, fizeram a lição de casa como deveriam. Aliás, já escrevi anteriormente sobre isso: o PSDB, pelo menos no Pará, foi vergonhosamente reprovado. E ao PT, infelizmente, parece faltar coragem para encarar uma questão ética tão importante para o conjunto da esquerda.

E no entanto, o oposto disso, a simples recusa diante de qualquer prática menos mal cheirosa, digamos assim, no sentido dessa acumulação de recursos, é não apenas ingenuidade, mas condenação antecipada à derrota – e não apenas desses partidos e das esquerdas, mas de todo o projeto de sociedade que defendemos.

Destino de santo é martírio. E se é assim em qualquer lugar do mundo, mais ainda, num país historicamente escravista como o Brasil. Daí que não dá para encarnar tamanha “pureza”. Nem para atirar simplesmente às feras quem se dispôs a fazer o que era necessário...

O território da política é o profano. Apesar das semelhanças com a religião, a política é atividade laica. O PSDB conseguiu compreender isso. Mas a maioria do PT, infelizmente, ainda permanece, em termos dessa compreensão, na anterioridade das revoluções burguesas.


III

Para a compreensão da lógica do PT é preciso não perder de vista dois outros dados importantíssimos. O partido teve origem não apenas nos movimentos sociais. Sua outra raiz importante é a intelectualidade. E esses quadros, postos a serviço das massas, ajudaram na multiplicação do conhecimento, na politização das bases.

O outro fator é que, nesses movimentos sociais da base do petismo, os que assumiram maior preponderância foram o sindicalismo urbano e o campesinato. E, só posteriormente, o sindicalismo burocrático. Esse último, teve imensa importância na conquista do poder.

Mas os dois primeiros é que foram determinantes, de fato, juntamente com a intelectualidade, para moldar o encanto radical da democracia interna petista.

Dessa junção entre quem possuía o conhecimento teórico necessário à compreensão da realidade, com aqueles que possuíam a vivência cotidiana da opressão, nasceu a pulverização do poder no âmago do partido.

O respeito e a admiração recíproca de quem descobre no outro a parte que lhe faz falta. A compreensão de que é possível e preciso transformar a realidade. A certeza, por vezes dogmática, de que o caminho que se imagina é o melhor a seguir. A compreensão de que Cidadania ou é por inteiro ou não é Cidadania. O amor, por vezes até ingênuo, à democracia proletária, como espécie de paraíso terrestre.


Com tal história, portanto, não deveria espantar que as correntes petistas vivam entre tapas e beijos: o PT, em verdade, é movido à paixão. Paixão pelo outro, que se sabe indispensável à completude. Paixão por um ideal societário, que, infelizmente, será apenas e tão somente, sempre, um ideal... Paixão pelo que se acredita poder significar, individualmente, na “construção” desse “alvorecer” coletivo.

Nada assim tão diferente do que vemos nas religiões: a relação entre a criatura e o criador; entre o devoto e o redentor; entre o “salvador” e a missão para a qual imagina ter nascido. Interessante, por permitir, ao contrário da religião, que as divergências possam fruir. Complexo, em termos da práxis política.


Queridinhos: de novo, vou tomar uma. “Adepois” retorno. Bjs.

PS. Há uma coisa importante que pensei e que não pode ficar para depois. Cês sabem como é que se resolve a gestão das verbas de publicidade? É assim: a tentação – e aí se inclui da porrada ao aliciamento – se resolve com a despersonalização. Tem que acabar com esse negócio de um único gestor das contas de publicidade. Os valores e objetivos envolvidos não admitem isso.

As verbas de publicidade e de propaganda do Governo do Estado têm de ser geridas por um conselho.

Então, teremos, um representante do Governo ( ou representantes), mas, também, representantes da sociedade (SPDDH, CPT, Cimi, sei lá) e do Ministério Público, o xerife, o delegado.

E vai funcionar assim: O Governo publica os objetivos da comunicação: campanhas da Sespa, para a prevenção de doenças; campanhas de sei lá quem, para isso e para aquilo. E – e isso é muito importante – campanhas educativas de massa, não previstas nos objetos específicos dessas instituições.

Como, por exemplo, campanhas educativas do ponto de vista político – por que não? O MPE tem uma cartilha belíssima sobre o que é e que como funciona – e isso é Cidadania, é política. Mas que deveria chegar – e não chega, por falta de recursos - a cada residência dos milhões de paraenses.

Então, que as empresas e instituições trabalhem projetos de comunicação importantes, de fato, do ponto de vista da sociedade.

E como dividir o bolo? Rigorosa aplicação da mídia técnica. O jornal que circula mais, recebe mais; assim como a TV, a rádio, o site, o blog. São empresas ou empreendimentos privados. Que se lancem ao mar, portanto. Mas, o Estado-Cidadão não tem por que custear isso. Tem é que se aproveitar disso. Em benefício da coletividade.

Esse tipo de tratamento das verbas de publicidade e propaganda – que têm de ser perfeitamente definidas e divididas; ou seja, que é publicidade? Que é propaganda? – acabaria com a obrigatoriedade política dos governos, incentivaria a independência dos veículos de comunicação, geraria a produção pedagógica em favor das massas, permitiria aos cidadãos um poder de interferência extraordinário sobre um dinheiro que é de todos, afinal.

Façamos com que essa dinheirama não sirva, apenas, a uma proposta política; que seja de todos. Mas, “companheiros”, não esqueçam, é preciso amarrar isso em Lei, no imutável.

E, agora, definitivamente, vou ouvir o Skank, meu mais recente encantamento...

quarta-feira, 4 de abril de 2007

Mexendo em vespeiro

Sobre a greve dos controladores


Essa questão dos controladores de vôo é extremamente complexa. Por maior que seja a tentação de apoiarmos os brothers, uma coisa é certa: eles têm armas nas mãos. Tão destruidoras como uma bomba, diga-se de passagem.


E é isso o que o PT precisa aprender: há categorias e categorias. Em algumas, é preciso, mesmo, o zelo militar. Aquela coisa de que eu posso estar com gripe, febre, diarréia, mas tenho um dever a cumprir. Que é matar ou permitir que as gentes vivam.


Se há deficiências, que se corrijam. Mas as pessoas que lidam com isso, têm, sim, de ter uma disciplina a toda prova.


Se eu, jornalista, faltar, amanhã, ao trabalho, ninguém morre por isso. No máximo, levaremos um furo. O que quer dizer, em outras palavras, que alguém (um outro jornal) falou sobre o que o jornal em que trabalho deveria ter falado.


Se sou engenheira e faltei à apresentação de um projeto, ao me debruçar sobre ele, terei a chance de corrigir isso.


Se sou advogada, mesmo que perdendo um prazo, imaginarei mil maneiras de corrigir isso – e em qualquer caso isso não significará, quase certamente, a vida, concretamente, de um único cidadão.


Mas os controladores de vôo, se quiserem, provocarão, amanhã, não meros atrasos nos aeroportos, mas um desastre de grandes proporções.


Temos de parar de encarar os militares como inimigos potenciais. Tivemos vinte anos de ditadura. Mas, acabou, passou. E essa geração de militares que está aí é tão ou mais esclarecida que qualquer de nós.


Viram, como nós, civis, os estragos provocados pelo autoritarismo. E, graças a Deus, têm bem menos a chorar que o Chile ou a Argentina.


Mas, até pela ideologia, pela formação da caserna, têm uma disciplina de que nós, civis, ficamos aquém. E que é, sim, necessária em situações de crise, ou, que Deus nos livre, de uma guerra.


Porque numa guerra – e os militares sabem disso – só sobrevive quem consegue habituar o estômago ao capim. Se não há um único inseto – altamente protéico, por sinal – para abastecer o corpo, que o mato faça as vezes, afinal...


Quem tem armas nas mãos, não pode ser deixado à solta. Isso é um perigo demasiado grande para os cidadãos desarmados.


Sujeito desses tem, sim, de aprender a bater continência.


E se não aprendeu, me desculpem brothers, ou que vá embora ou que a prisão administrativa lhe sirva de lição, afinal.


Aqui, o que existe não é a chibata nas costas de um marinheiro. É um sujeito que, com um único botão, pode determinar a segurança – ou não – de centenas de cidadãos.

Pé ante pé

Voltando, devagarinho...




A Perereca, esfuziante de serotonina (meu antidepressivo é bacana, viu AF?), está ouvindo um CD maravilhoso: “Skank, MTV ao vivo”, em Ouro Preto. E pensa, como animal político que é: que coisa linda é... uma partida política!...



É Uma Partida De Futebol

Bola na trave não altera o placar
Bola na área sem ninguém pra cabecear
Bola na rede pra fazer o gol
Quem não sonhou em ser um jogador de futebol?

A bandeira no estádio é um estandarte
A flâmula pendurada na parede do quarto
O distintivo na camisa do uniforme
Que coisa linda é uma partida de futebol

Posso morrer pelo meu time
Se ele perder, que dor, imenso crime
Posso chorar, se ele não ganhar
Mas se ele ganha, não adianta
Não há garganta que não pare de berrar

A chuteira veste o pé descalço
O tapete da realeza é verde
Olhando para bola eu vejo o sol
Está rolando agora, é uma partida de futebol

O meio-campo é lugar dos craques
Que vão levando o time todo pro ataque
O centroavante, o mais importante
Que emocionante, é uma partida de futebol

O meu goleiro é um homem de elástico
Os dois zagueiros tem a chave do cadeado
Os laterais fecham a defesa
Mas que beleza é uma partida de futebol

Bola na trave não altera o placar
Bola na área sem ninguém pra cabecear
Bola na rede pra fazer o gol
Quem não sonhou em ser um jogador de futebol?

O meio-campo é lugar dos craques
Que vão levando o time todo pro ataque
O centroavante, o mais importante,
Que emocionante uma partida de futebol !
(Subiu rapaziada)

Utêrêrêrê, utêrêrêrê, utêrêrêrê, utêrêrêrê


(Samuel Rosa e Nando Reis)



Esmola


Uma esmola pelo amor de Deus
Uma esmola, meu, por caridade
Uma esmola pro ceguinho, pro menino
Em toda esquina, tem gente só pedindo

Uma esmola pro desempregado
Uma esmolinha pro preto pobre doente
Uma esmola pro que resta do Brasil
Pro mendigo, pro indigente

Ele que pede, eu que dou, ele só pede
O ano é mil, novecentos e noventa e tal
Eu tô cansado de dar esmola
Qualquer lugar que eu passe é isso agora

Uma esmola pelo amor de Deus
Uma esmola, meu, por caridade
Uma esmola pro ceguinho, pro menino
Em toda esquina, tem gente só pedindo

Uma esmola pro desempregado
Uma esmolinha pro preto pobre doente
Uma esmola pro que resta do Brasil
Pro mendigo, pro indigente

Eu tô cansado, meu bom, de dar esmola
Essa quota miserável da avareza
Se o país não for pra cada um
Pode estar certo
Não vai ser pra nenhum

Não vai não, não vai não, não vai não, não vai não
Não vai não, não vai não, não vai não
No hospital, no restaurante,
No sinal, no Morumbi
No Mário Filho, no Mineirão

Menino me vê, ja começa a pedir
Me dá, me dá, me dá um dinheiro aí
Mas menino me vê, ja começa a pedir
Me dá, me dá, me dá um dinheiro aí

Uma esmola pelo amor de Deus
Uma esmola, meu, por caridade
Uma esmola pro ceguinho, pro menino
Em toda esquina, tem gente só pedindo.


(Samuel Rosa E Chico Amaral)



Pacato Cidadão


Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol

Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização

Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol

Pra que tanta TV, tanto tempo pra perder
Qualquer coisa que se queira saber querer
Tudo bem, dissipação de vez em quando é bão
Misturar o brasileiro com alemão

Pacato cidadão
Ô pacato da civilização

Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol

Pra que tanta sujeira nas ruas e nos rios
Qualquer coisa que se suje tem que limpar
Se você não gosta dele, diga logo a verdade
Sem perder a cabeça, perder a amizade

Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização

Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol

Consertar o rádio e o casamento é
Corre a felicidade no asfalto cinzento
Se abolir a escravidão do caboclo brasileiro
Numa mão educação, na outra dinheiro

Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização.


(Samuel Rosa e Chico Amaral)



Saideira

Tem um lugar diferente
Lá depois da saideira
Quem é de beijo, beija
Quem é de luta, capoeira
Tem um lugar diferente
Lá depois da saideira
Tem homem que vira macaco
E mulher que vira freira

Comandante! Capitão! Tio! Brother! Camarada !
Chefia! Amigão!
Desce mais uma rodada
Comandante! Capitão! Tio! Brother! Camarada!
Chefia! Amigão!
Desce mais uma rodada

Desce mais
Desce mais

Tem um lugar diferente
Lá depois da saideira
Tem bandeira que recolhe
Tem bandeira que hasteia
Tem um lugar diferente
Lá depois da saideira
É tomando uma gelada
Que se cura a bebedeira

Comandante! Capitão! Tio! Brother! Camarada!
Chefia! Amigão!
Desce mais uma rodada
Comandante! Capitão! Tio! Brother ! Camarada !
Chefia! Amigão!
Desce mais uma rodada

Tem um lugar diferente
Lá depois da saideira
Quem é de beijo, beija
Quem é de luta, capoeira

Tem um lugar diferente
Lá depois da saideira
Tem homem que vira macaco
E mulher que vira freira

Comandante! Capitão! Tio! Brother! Camarada!
Chefia! Amigão!
Desce mais uma rodada
Comandante! Capitão! Tio! Brother! Camarada!
Chefia! Amigão!
Desce mais uma rodada


(Rodrigo F. Leão / Samuel Rosa)



Três Lados


Escutei alguém abrir os portões
Encontrei no coração multidões
Meu desejo e meu destino brigaram como irmãos
E a manhã semeará outros grãos

Você estava longe, então
Por que voltou
Seus olhos de verão
Que não vão entender?

E quanto a mim, te quero, sim
Vem dizer que você não sabe
E quanto a mim, não é o fim
Nem há razão pra que um dia acabe

Cada um terá razões ou arpões
Dediquei-me às suas contradições, fissões, confusões
Meu desejo e seu bom senso, raivosos feito cães
E a manhã nos proverá outros pães

Os deuses vendem quando dão
Melhor saber
Seus olhos de verão
Que não vão nem lembrar

E quanto a mim, te quero, sim
Vem dizer que você não sabe
E quanto a mim, não é o fim
Nem há razão pra que um dia acabe

Somos dois contra a parede e tudo tem três lados
E a noite arremessará outros dados
Os deuses vendem quando dão
Melhor saber
Seus olhos de verão
Que não vão nem lembrar

E quanto a mim, te quero, sim
Vem dizer que você não sabe
E quanto a mim, não é o fim
Nem há razão pra que um dia acabe


(Samuel Rosa / Chico Amaral)

domingo, 1 de abril de 2007

Divagando


A Infidelidade Partidária



I

Se o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmar o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), acerca da perda de mandato de quem trocou de partido, haverá uma mexida sem precedentes nos tabuleiros políticos municipais – e às vésperas das eleições de 2008.

No Brasil, informa o vereador Raimundo Castro, presidente da secção paraense da Federação Brasileira das Câmaras Municipais, há 60 mil vereadores. Se a degola atingir, apenas, 10% desse universo – e a previsão é de um estrago bem maior – só aí seriam 6 mil. Quer dizer, quase que uma “nova eleição”.

No Pará, isso significaria substituir, por suplentes fiéis, numa estimativa por baixo, de 20% a 30% dos 1.360 vereadores – ou de 270 a 400 deles.


Na Câmara de Belém, a maior do estado, a mexida atingiria quase 40% dos 35 vereadores. Mas há municípios do interior onde ultrapassaria mais da metade.

“Essa será, de fato, a verdadeira dança das cadeiras” – brinca o advogado Inocêncio Mártires, especialista em direito eleitoral, um dos melhores do estado.

A aposta de Inocêncio é que o Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta corte do país, confirme a manifestação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E ela, como se sabe, é no sentido de que perde o mandato quem deixa o partido pelo qual se elegeu.

Daí que a questão central é: quem perde e quem ganha com alteração dessa magnitude, às vésperas das eleições de 2008? Ou, seja, na largada para a grande corrida de 2010?

Sim, porque o que está em jogo não é a simples posse de prefeituras e câmaras municipais. Mas o significado delas na estruturação dos partidos, para a conquista das posições estratégicas de 2010: as assembléias legislativas, os governos dos estados, o Congresso Nacional, a Presidência da República.]

Com poderes e verbas extraordinárias, esses gigantes abstratos são fundamentais para irrigar, mover, modificar, o cotidiano que se realiza, de fato, nos municípios. Trata-se, portanto, de relação de dupla troca.

E o que se discute é o maremoto que pode atingir em breve – e pode, mesmo - a configuração ideológica da base desse sistema, às portas da renovação.

II

Ninguém que pretenda, de fato, a modernização política brasileira pode ser contra a fidelidade partidária. Afinal, como lembra o articulador político do governo, Charles Alcântara, ela fortalece os partidos e tende a elevar o patamar das negociações. Despersonaliza, institucionaliza. Ou seja, conduz o diálogo para o tão sonhado nível da discussão programática.

Porque a fidelidade partidária, como aponta o cientista político Cláudio Lago, acirra a disputa de poder no âmago das agremiações. Espécie de repetição da cosmogonia grega, estimula a “matar” o velho devorador, para que possa reinar, afinal, a juventude devorada. Ou, mais modernamente: sai o “paizinho”. Entra em cena a articulação societária.

Mas é claro que, como pondera o deputado federal Gerson Peres, é preciso equilibrar fidelidade partidária e convicções individuais.

Vai que o PP decida ser favorável ao aborto? Eu sou favorável ao aborto. Mas, alguém imagina o Gerson Peres defendendo isso e até votando a favor disso?

Para mim, a posição de Gerson é retrógrada, não leva em conta a realidade brasileira, de milhões de mulheres pobres que morrem, todos os dias, em decorrência de abortos clandestinos. Mais que isso: não leva em conta que o corpo pertence a mulher e não pode, de forma alguma, ser considerado propriedade social. Não somos, em suma, um simples útero, de utilização coletiva.

Mas Gerson tem todo o direito de pensar do jeito que pensa. E, se nos dispuséssemos a debater, ele teria, certamente, argumentos tão ou mais fortes que os meus. E é preciso respeitar isto: a defesa dos próprios ideais.

Daí que sou obrigada a concordar com Gerson neste ponto: há que considerar as vírgulas da fidelidade partidária. Porque os partidos têm obrigações programáticas com os partidários. Quer dizer: a fidelização não pode representar simples mudança de lugar da banca de negociações. E muito menos o esmagamento das minorias – e quantas vírgulas cabem no que chamamos minorias, não é?


III

Óbvio, também, que o STF não tem de olhar para os lados, a considerar os interesses de persas, atenienses e espartanos, a cada vez que interpreta a Lei. Se o fizer, deixará de calças curtas o conjunto dos cidadãos. Porque, numa espécie de túnel do tempo, nos levará de volta ao direito consuetudinário.

Mas, se o STF confirmar a manifestação do TSE, é provável que tenhamos uma crise política de graves proporções, de Norte a Sul do país.

Afinal, a degola não se assemelha à protagonizada pela Revolução Francesa. Os grupos ora atingidos, de um lado e de outro, guardam fortes relações com os grupos econômicos que formam opinião no país.

Não está descartada, aliás, uma crise interpoderes. Com o Congresso aprovando um casuísmo básico, para acuar o Judiciário. E com ministros e magistrados, apesar da lagosta e do champagne, mas com aquilo roxo, afirmando que “dura lex sed lex”. Tudo coroado pelo “assembleísmo” executivo do PT...


IV

E voltamos à pergunta que, aliás, motivou este post: quem ganha e quem perde com essas alterações, se elas se concretizarem?

O único fato indiscutível é que boa parte das câmaras municipais tornará à configuração original de 2004, em termos de capacidade das legendas.

Todo o poder aos partidos? Em termos. Político é, essencialmente, ladino. Expert em sapateado de catita. Mistura de Frank Sinatra, Gene Kelly e Fred Astaire, com charme a George Clooney – numa visão bem feminina, digamos assim...Em termos de Ver o Peso, é capaz de tratar do piolho à unha encravada...

E nem poderia ser diferente, pelo menos neste país tão desigual chamado Brasil.

Imaginem a dona Maria ou o seu José procurando um político e derramando um mundo de queixas.

E ele, sinceramente, dizendo o seguinte: “O seu problema, minha senhora, decorre da configuração da sociedade brasileira, que é historicamente escravista”.

“A senhora e o seu José sofrem porque temos uma elite devoradora” – prosseguiria – “Uma elite patrimonialista.Por exemplo, emprega 300 parentes incompetentes, que nem o inferno quer - com verbas públicas, diga-se de passagem – que dariam para contratar médicos, com salários bem melhores, para atender a senhora e o seu José”.

“O pior é o preconceito dessa elite, minha senhora – prosseguiria - “Para essa elite, a senhora e o seu José não significam nada. Se vocês não têm casa, comida, saúde, educação, é porque merecem viver assim. Descendem dos índios. São preguiçosos e só querem beber. Exemplo: a Cabanagem”.

E acrescentaria: “A nossa luta é coletiva, minha senhora. Queremos mudar isso, não apenas para a senhora e o seu José, mas para o conjunto de marias e josés deste imenso Pará”.

De tal discurso, dona Maria e o seu José reteriam, apenas, os 300 e a preguiça – que é nossa. E que coisa maravilhosa é a preguiça!

E votariam no político que, sem mais delongas, lhes “doasse” o pão para saciar a fome...


V

Sinceramente, trabalhei demais na sexta e no sábado. Estou esgotada. Preciso desligar. Encher a cara. Até para conseguir trabalhar neste domingo.

Entrevistei muita gente. Inclusive o Charles, o Gerson, o Giovanni, o Claudinho, que não aproveitei na matéria de domingo. E que preciso usar no jornal, na segunda, até para que eles não me estrangulem...

Mas, essa questão da fidelidade partidária, a nível municipal, é tentadora, para essas incursões de pensamento.

Vou encher a cara. Mas, recomendo, a quem me lê, pensar sobre isso.
Resultado dos eleitos, em 2004, para vereadores: PSDB: 240; PMDB 192; PT 139; PTB 133; PP 120; PL 102; PFL 99; PDT 87; PSB 59; PV 48; PPS 44;PSC 41; PRP 17; PSL 11. O resto é nanico, abaixo de 10.

Pensem. Eu quero mais é sonhar... FUUUUIIIIIIIIIII!!!!!!!!!

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Adorei a frase do Bial: “Prego, quando se destaca, leva martelada”.
Pensei: “Que venha a caixa de ferramentas!”.

quinta-feira, 22 de março de 2007

Festa mais novo

Festa no Meu Apê VIII



(Abrem-se as cortinas. O clima no Apê é de salloon. Os convidados estão sentados em mesas, na parte de baixo, onde bebem, fumam e jogam. Eles estão vestidos de cowboys; elas, de dançarinas de can-can, inclusive a Correspondente e a Perereca, que estão em pé, num canto, com badejas nas mãos. No alto da escada, surge a Beijoca, com um longo prateado. Ao lado dela, o lorde Sudão e o Barão de Inhangapi, vestidos de branco, fraque, cartola e bengala; além do lorde Tirésias (de óculos escuros), do lorde Balloon, do lorde Ki-Nem, do Príncipe Clean e do Conde de Bota-Bem. Eles cantam, dançam e sapateiam Hellô Dolly, tendo em primeiro plano a Beijoca, o Sudão e o Barão, cada um de um lado: Hello dolly,well, hello, dolly/It's so nice to have you back where you belong/You're lookin' swell, dolly...i can tell, dolly/ You're still glowin'...you're still crowin'...you're still goin' strong/I feel that room swayin'...while the band's playin'/One of your old favourite songs from way back when/So... take her wrap, fellas...find her an empty lap, fellas/Dolly'll never go away again/Hello dolly,...well, hello, dolly/It's so nice to have you back where you belong/You're lookin' swell, dolly...i can tell, dolly/You're still glowin'...you're still crowin'...you're still goin' strong/I feel the room swayin'...while that ole band keeps on playin'/One of your old favourite songs from way back when/So...golly, gee, fellas...find her an empty knee, fellas/Dolly'll never go away...i said she'll never go away/Dolly'll never go away again)

(Aplausos. E os dançarinos se dirigem para uma mesa central, para jogar cartas. A Beijoca é a carteadora).

_Ô comadre! Só mermo você pra enfiá a gente nessa roupa ridícula!
_Fica quieta, animal! Pode ser a única chance da gente se vestir desse jeito!
_Ué, de dançarinas de can-can?
_Como diria o lorde Balloon, é um velho sonho que se torna realidade...
_Credo, comadre, que você atem cada tara!...
_Mas que tara, animal? Isso é uma performance artística!...
_Pois pra mim isso tem otro nome. É sem-vergonhice, mermo!...
_Que é isso, cumadizinha? Não era você que ficava dizendo pra eu manter a mente aberta?
_Mas era assó a mente, comadre, era assó a mente...
_Ô cumadizinha, o seu problema é que você tem uma moral complexa! Você devia era aprender com a corte do Brejo, que mais parece uma imensa terma romana!
_Vixe Maria, comadre! Eu acho que essa festa ta é lhe fazendo é mal. Mas, num se avexe, que eu vô chamá um especialista em terma romana...
_Na, na, ni, na, não! O Barão, de novo, não!
_Huuummm!...E quem foi disse que eu ia chamá o Barão? Eu ia era chamá o lorde Sudão!...
_Não brinque, cumadizinha, o homem também é especialista?
_Ô comadre!... Eu juro que vô manda rezá uma novena pra você, pra vê se a Nazica lhe assocorre! Você e esse seu blog velho nunca assabem de nada! Apreste atenção, comadre: o Barão e o Sudão – não necessariamente nessa ordem – são os maiores especialistas do Brejo. Os ômi são super-habilitados, comadre! Intendem de mulhé, de política, de limpeza, de alma e é claro – off course! – de terma romana!...
_Puxa, cumadizinha!...Tadinha da Beijoca!...
_Mas aoooonnnnnde!...
_Mas, cumadizinha, se os homens são super-habilitados e ela ta cercada pelos dois...
_Ô comadre, cum você a gente atem de começá pelo básico. Arrepita comigo: mim Tarzan, you Chita!
_Mim Tarzan...
_I’...
_I’ ...
_I’...
_I’...
_Ô comadre, é pra arrepeti invertendo...
_Ah!...You Tarzan, I’ Chita! (...)
_Tá ‘rendo, comadre, como a gente se esforçando até que você intendi? E atome essa banana que é pra modo de ficá calma!...
_(...)
_Agora, vamo pra segunda alição. Arrepita comigo, comadre: BA, BE, BI, BO, BU!
_BA, BE, BI, BO, BU!
_Alindo, comadre! Vai para o trono ou não vai?... E você acaba de ganhá a segunda banana da noite!...
_(...)
_E agora, comadre, vamo pra tercera e última alição. Se você assoubé essa, num precisa aprendê mais nada: Vai virá PHD em terma romana. Arrepita comigo, comadre: Vo-vô a-viu a u-va!
_Vovô a-viu a u-va!
_Tá ‘rendo, comadre? Cum esse intensivão você faria sucesso até na corte do Rei Sol!
_(...)
_Qui é que foi, comadre, ta isperandu a tercera banana, é?
_(...)
_Bom, agora, que você já assabe, pra modo, o básico, vamo assepará o joio do trigo...Pra começá, comadre, você assabe a Chapeuzinho Vermelho e a donzela das Orleans?
_É claro que sei, né, animal!
_Pois a Beijoca não é nenhuma delas. E muito menos a Cinderela, comadre! Ela afica assim, vamo dizê, em tercero lugá de terma romana...
_Ué, mas a Beijoca também entende de terma romana?
_E num é, comadre? Nesse ponto, ela é iscritinha você: num apode vê um efebo que se acoça toda...Aliás, no caso de vocês, é só trocá pra “vovó aviu o uvo”...
_O que é isso, animal? Como é que você fica falando essas coisas pra platéia?
_Mas num é, comadre? Vocês quatro adeviam era criá um franchising da Pom-Pom... É botox por osmose, comadre! E é botox aqui, botox acolá...E a Suzana V. se ofertando pra madrinha da bateria. E o Ponce de Leon se aconsumindo de inveja!...
_Sabe de uma coisa, cumadizinha, o que lhe mata é essa sua...essa sua... compulsão Agostiniana!...
_A minha pra modo de quê?
_Ó Senhor, onde estás que não respondes?
_Chamarrr, minha senhorrra?
_ (...)...Ô seu Inri, não me atrapalhe que este é um momento de alta dramaticidade...(as luzes diminuem. Em BG, “E o Vento Levou”)... Por quê? Por quê? Por que, meu Deus?...Por que eu tive de nascer com um carma desses? Por que me fizeste nascer com cara de choque elétrico, pra atrair tudo que é doido? Logo eu, Senhor, uma pessoa tão sã, tão normal, no meio de um hospício... Por que, meu Deus, por quê? Where is Tara? Ó Rhett, Rhett!.. (fica petrificada).
_Vixe Maria, que a comadre pirou!...Égua, que até pareci aquela minina de Santo Alexandre!...Seu Inri, será que o sinhô apodia fazê um exorcismo básico nela?
_Deixarrr comigo, querrrida! (dirigindo-se para a Perereca, colocando as mãos no coldre. Rufam tambores. Em BG, “O Dólar Furado”, mas só a parte dos tiros). O sangue de Indaiarrr terrr poderrrr! (o salloon repete: o sangue de Indaiarrr terrr poderrr!) Demônio! (o salão: Demônio!) Safado! (o salão: Safado!) Filho duma cadela peçonhenta! (o salão: filho duma cadela peçonhenta!). Filho dum cão pustulento! (o salão: Filho dum cão pustulento!) Coisa-ruim, bicho de pé, peido mal rrresolvido! (o salão: coisa-ruim, bicho de pé, peido mal rrresolvido!) Chato do culhão do chato! (o salão: chato do culhão do chato!) Merda de elefante, ameba, caganeira! (o salão: merda de elefante, ameba, caganeira!) Filho do George Bush com Saddam Hussein! (o salão: Filho do George Bush com Saddam Hussein!) Sai, Satanás, em nome de Indaiarrr! (o salão: Sai, Satanás, em nome de Indaiarrr!)

(A Perereca treme, treme, mas volta a petrificar. Só que começa a espumar pelos cantos da boca...).

_Ô seu Inri, num é gabá não, mas a sua moral ta very baixa com Satanás!... Esse treco só piorô a situação da comadre! Ela tá até espumando!...Mas, também, depois de toda essa esculhambação!...Se eu fosse o sinhô, num apassava nem perto do inferno!...
_Mas é que a senhorrra não me deixarrr terminarrr o exorrrcismo. É prrreciso açoitar a Perrrerrreca com a varrra do perrrverrrso! (o salão, feito um coro grego: Ó vinde, vinde varrra do perrrverrrso!)
_Mas que vara do perverso!...Vocês piraram, é? Se fizer isso, aí é que a comadre não desencrua!...(dirigindo-se para a Perereca, agarrando-a e sacudindo) Ô comadre, acorde, comadre!...Eu juro que num abrigo mais com você!... Até coloco anúncio no tem-tem da Gazeta de Arribação, pra modo de lhe arranjá 300 escravos sexuais! Tudo com vinte aninhos, comadre! E juro que nunca mais que arrepito que vovó aviu o uvo...
_ (o Jujuba, vestido de maitre, acompanhado de um garçom) Me desculpe, querida, mas por que você não oferece pra ela essa deliciosa poule prêt au vin? (tirando uma coxa e comendo) Para acompanhar, farrofá du manioc frite au kerosene. Tudo regado (bebendo) a petite canne...E para terminar (acendendo), um estonteante charrutô parragaiô...
_(A Barbie) Que nada, Jujuba, o melhor é fazer a Perereca vomitar!
_Vocês endoidaram de vez, é? Se a comadre tá petrificada, como é que vai comê ou vomitá?
_Me desculpe, querida, mas se ela está assim a culpa é sua...
_Eu sei, seu sei, dona Barbie...Num adevia te pegado tão pesado com a comadre...E muito menos mandado o doido do Inri fazê um exorcismo nela...
_Não é isso, querida. É que exorcismo não resolve!...
_Ué, por que dona Barbie?
_Eu tentei com o Bota-Bem e ele nada de botar...
_Num me adiga, dona Barbie!
_E não foi só exorcismo, não...Cá entre nós, tentei o sabonete da salvação, a água do rio Jordão e até o chicote do maligno... e nada!...
_Vixe Maria, mas o caso dele é tão grave?
_Você nem imagina, querida, você nem imagina...
_Assério?... Vai vê que gosto da vara do perverso, ué!...
__Eu tenho uma sugestão: por que não limpamos a Perereca? Podemos passar um aspirador aqui e acolá, jogar uma K-boa, recolher os papéis...
_E se der sopa, até merendá em cima dela, né, seu Clean? O sinhô tá pensando que isso daqui é aquele filme “o Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante dela”?
_Com licença! O que a dona Perereca precisa, certo?, é de um incentivo, certo?
_É, de incentivo o sinhô intendi, né, seu Sudão?
_Como diria Napoleão, certo?, só grandes incentivos, certo?, para atravessar o deserto do espírito humano!...
_O que vocês precisam compreender é que isso tudo é o imponderável do imponderável! É uma coisa nova e extraordinária – e eu não tenho nenhuma dúvida disso, cabocos! Vejam: com a dona Perereca petrificada, nós, os personagens, podemos ir pescar, afinal...(ajeitando o violão) Eu já até compus uma música sobre isso. Vocês querem ouvir, cabocos?
_(Todos) Nãããooo!!!
_(...)
_Aperem lá, que o lorde Balloon qué assoprá nos meus zuvido!..
_(...)
_Hum, Hum...Mas o sinhô tem certeza disso?
_(...)
_(o lorde Ki-Nem, impaciente) Mas o que é, mana, que meu pai-pai tá recomendando?
_Ele ta dizendo que é pra gente aconsultá o Oráculo!...
_(Todos, para a correspondente) E quem é o Oráculo?
_É o lorde Tirésias, ué!...
_(Todos) Ó vinde, vinde, ó Poderoso Oráculo!

(As luzes se apagam. No meio do salão estão a Beijoca, o Sudão e o Barão. Em segundo foco, que vai aparecer de vez em quando, uma mesa de roleta, com alguns jogadores e o cara que canta o resultado da roleta. Os três personagens dançam um tango, cantado pelo Tirésias, à frente de todos. A Beijoca dança, ora com o Barão, ora com o Sudão. O Sudão e o Barão, ora com eles – e quem está sozinho primeiro ensaia uns passos e depois, através de mímica, protesta. A música é Vermelho 27: “Jogo no pano... jogo... feito! Vermelho 27!”/ Esse homem que hoje passa maltrapilho/ Fracassado no seu traje furta-cor/ Um dia já foi homem, teve amigos,/ Teve amores, mas nunca teve amor/ Soberano da roleta e da campista/ Foi sua majestade o jogador!/ Vermelho vinte e sete/ Seu dinheiro mil mulheres conquistou/ Vermelho vinte e sete/ Seu dinheiro tanta gente alimentou/ Um rio de champagne sorrindo derramou/ E a sua mocidade em fichas transformou/ “Jogo no pano...jogo...feito! ... Vermelho 27!”/ Vermelho vinte e sete/ Quando a sorte caprichosa o abandonou/ Vermelho vinte e sete/ Cada amigo num estranho se tornou./ Os ossos do banquete aos cães ele atirou,/ A vida honra tudo,/ Num lance ele arriscou.../“Jogo...jogo...feito! Preto 17!”/ Deu preto dezessete/ Nem um cão entre os amigos encontrou!).

(continua)

domingo, 18 de fevereiro de 2007

Festa VII

Festa no eu Apê VII


(Abrem-se as cortinas. Em BG, o “Boi da Cara Preta” e os quatro dispostos como no capítulo anterior)


_Pra modo de organizá essa suruba, digo, essa sessão, vamo acomeçá pelo seu Sudão. Vamo lá, seu Sudão, vamo abri o coração!... Quando foi que acomeçô esse seu trauma de bastidô?
_Eu tinha oito aninhos, certo? E ganhei uma rãzinha, certo? Tão pequenina, querida correspondente! Eu passava horas olhando pra ela, certo?, e ela olhando pra mim, certo? Eu fazia: roac, roac! E ela me respondia: roac, roac!
_Qué dizê que aquela rã foi, a bem dizê, o seu primeiro amô?
_E que amor, querida correspondente, e que amor! Depois dela, certo?, comecei a ver rãs em todo canto: na pia, na geladeira, no banheiro, no quarto, no jardim. Mas o problema, certo?, é que ninguém mais via aquelas rãs!...Lembro até de uma ocasião, certo?, em que eu disse: paiê, olha lá que rã tão bonita! E ele, certo?, me deu um cascudo e disse: fica quieto, moleque doido! Você não está vendo que aí não tem rã nenhuma!
_Comadre, anote aí: Num isquecê de arreceitá a terapia da rã...
_E como é que é essa terapia?
_Ah, não se avexe, seu Sudão, que adepois eu lhe adigo, na hora do receitório. Mas, me explique, o que é que essa rã tem a vê com o seu trauma de bastidô?
_Ah, é que eu sofri muitíssimo quando ela partiu, certo?
_Ué, e como é que foi isso?
_Um belo dia, certo?, eu peguei a caixinha em que ela vivia e chamei: roac, roac! Mas ela, certo?, não me respondeu. Aí, certo?, eu abri a caixa, certo?, e ela estava, assim, ó, dura e esticada, certo?
_Atava morta?
_Eu não diria, certo?, exatamente morta, certo? Como a senhora bem sabe, querida correspondente, nem as palavras são definitivas!...
_Comadre, aescreva aí: esse sujeito, além de doido de pedra, num amorre nunnnnca!...
_Perdão, querida correspondente, mas eu discordo do seu diagnóstico!
_E desde quando o sinhô intendi de psicanálise, seu Barão?
_Mas não é preciso entender de psicanálise, para compreender o que o lorde Sudão quis dizer. Veja: isso é algo novo e extraordinário! Na verdade, ele está discorrendo sobre o imponderável: a diferença entre o ser e o parecer.
_Concordo plenamente, certo?, com você, certo?, meu caro Barão. Aliás, quero lhe dizer, certo?, que sempre concordamos em muita coisa, certo?
_Eu não tenho nenhuma dúvida sobre isso, caboco! Porque, veja: tirando uma diferença aqui e acolá, a careca, por exemplo, as sobrancelhas...Aliás, como foi que você conseguiu essas sobrancelhas?
_Ah, eu mandei, certo?, levantar e esculpir, certo? Mas eu acho, certo?, que ainda ficou uma falha bem aqui, ó!
_Mas isso é preciosismo seu, caboco! É uma reduzidíssima falha! Quase nem se nota!
_Vocês querem apará com esse papo de comadres! Aqui, quem tricota sou eu! Comadre, apegue aquela garrafa de pinga! E assirva cinco copos, que um é pro santo! Mas vamo avortá, seu Sudão, praquela primeira rã. E o sinhô, seu Barão, afique calado, mais é! Sim, seu Sudão, aí o sinhô acha que ela atava morta ou viva?
_Mas isso, certo?, é uma pergunta, como direi, extemporânea, certo? Se eu disser morta, certo?, a senhora vai dizer, certo?, que não estava viva. E se eu disser viva, certo? a senhora vai dizer, certo?, que não estava morta!...
_Veja, querida correspondente: esse é um problema extraordinariamente complexo! O que você precisa compreender é a imponderabilidade de tudo isso! Que é a vida? Que é a morte? Que é isso que é?
_Eu não diria melhor, certo?, meu caro Barão, certo? Aliás, quero lhe dizer mais: nem Napoleão, do alto de mil pirâmides, conseguiria afirmar, certo?, se as rãs existem ou não existem de fato!...
_Eu lhe diria mais, caboco: tudo, afinal, é uma questão de ponto de vista. Se considerarmos a cadeia produtiva do imponderável, teremos, 50% de chances de as rãs existirem e 50% de não existirem. Afinal, com a curvatura do universo em 571 graus na latitude 666 e os mundos paralelos a 5.880.000 anos-luz e o observador, que pode estar, por exemplo, a 1.800.809.900 ares ou hectares... Você não abriu a caixa, certo?
_Certo!...
_Acerto! Qué dizê, Vixe Maria! Vocês aquerem apará com isso? Credo, que esse negócio é contagioso, seu Sudão! Ô comadre, assirva mais uma rodada, que eu já to me acoçando toda! E o sinhô, seu Barão, si aquiete no seu canto. Se não, lhe amando pro choque elétrico! E aí, o sinhô vai se atreme todinho!
_Perdão, querida correspondente, mas tremer, certo?, ele já treme, certo?...
_E não é que é verdade, seu Sudão? Olhe só pro estropício! Até parece que vai alevantá vôo!...
_Rumo, certo?, a um universo paralelo, certo?...
_É, acho que o sinhô tem razão, seu Sudão. Pra ele, choque elétrico num arresolve!...
_Acho que o ideal, certo?, seria o oposto, certo?...
_Bem pensado, seu Sudão! Comadre, aescreva aí: num isquece de arreceitá pro Barão a terapia da múmia!
_(vindo se arrastando de joelhos) Não, pelo amor de Deus, querida correspondente, a terapia da múmia, não! Da última vez, quase fiquei doido!...
_Quase, certo?...
_Até hoje tenho alucinações extraordinárias por causa disso!
_Sujeito num assabe que alucina o tempo todo...
_Em qualquer universo, certo?, curvo, reto ou paralelo, certo?...
_Depois daquilo eu tinha até medo de acordar. Porque me via cercado pelos leões. E eu gritava para os meus companheiros: não podemos nos dispersar, não podemos nos dispersar! (levanta, volta-se e começa a dar cabeçadas na parede)
_Pronto, certo?, lá vem a história do gladiador!...
_Num me adiga, seu Sudão, num me adiga! Já num aconsigo nem vê esse filme sem me alembrá desse estropício...
_Mas, de onde é, certo?, que ele tira essas histórias, como direi, tão imaginativas, certo?...
_E doido arretira história de algum lugá? Ele acria, ué!...
_Mas isso, como direi, deve ser uma necessidade existencial muito profunda, certo?
_E desde quando doido tem necessidade existencial? É bilé, lunático, maluco, zureta...
_Mas você não acha que seria melhor, certo?, mandar contê-lo, certo? Afinal, desse jeito, certo?, ele acaba quebrando a parede...
_Bem pensado, seu Sudão!... Aliás, o sinhô apensa em tudo, num é?
_É que eu sempre tive, como direi, uma atração irresistível pelo espírito humano, certo? Andei por aí, certo? Li Gracian, Maquiavel... Mas, como direi, sempre tive certa facilidade em compreender as motivações de cada um...É como se eu conseguisse, certo?, enxergar a alma das pessoas, certo?...
_Que coisa linda, seu Sudão!... Mas o sinhô avê tudo de branco, é?
_Pelo contrário, certo?, querida correspondente! Vejo quase todas cinzentas, certo? E você não imagina, certo?, o quanto dói, certo?, essa constatação! Mas a sua, certo?, eu vejo com uma alvura exemplar!
_Num abrinque, seu Sudão! Branquinha, branquinha, é?
_Como direi, reluzente, certo?...
_Vixe Maria, seu Sudão! Que eu avô me desfazê em lágrimas! Mas, apere lá, que eu vô chamá um especialista em alma: ô seu Barão, ô seu Barão, apare de batê com a cabeça na parede e achegue aqui! Ô comadre, assaia da escuridão e se achegue aqui, também. E atraga a pinga e o gelo. Vamô mais é jogá um pôquer básico! Ô seu DJ, ataque aí o Thriller! E atoca a jogá!...

(Apaga-se o foco sobre os quatro. Foco num corpo de balé (umas 20 pessoas), vestido de zumbis, demônios e religiosos (de todas as religiões, estilizados, seminus). À frente o Inri, só de sunga, coroa de espinhos e manto vermelho. Fumaça sobe do chão. Há lápides. Uivos, raios. E criaturas da noite – lobisomens, vampiros - aprisionadas em gaiolas que pendem acima do palco, tentando sair. Ao fundo, no alto, feiticeiras e um caldeirão. O Inri e os bailarinos cantam e dançam: It's close to midnight/something evil's lurkin' in the dark/Under the moonlight/You see a sight that almost stops your heart/You try to scream/But terror takes the sound before you make it/You start to freeze/As horror looks you right between the eyes/You're paralyzed/'Cause this is thriller/Thriller night/And no one's gonna save you/From the beast about to strike/You know it's thriller/Thriller night/You're fighting for your life/Inside a killer/Thriller tonight, yeah/You hear the door slam/And realize there's nowhere left to run/You feel the cold hand/And wonder if you'll ever see the sun/You close your eyes/And hope that this is just imagination/Girl, but all the while/You hear a creature creepin' up behind/You're outta time/'Cause this is thriller/Thriller night/There ain't no second chance/Against the thing with the forty eyes, girl/(Thriller)/(Thriller night)/You're fighting for your life/Inside a killer/Thriller tonight/Night creatures call/And the dead start to walk in their masquerade/There's no escaping the jaws of the alien this time/(They're open wide)/This is the end of your life/They're out to get you/There's demons closing in on every side/They will possess you/Unless you change that number on your dial/Now is the time/For you and I to cuddle close together, yeah/All through the night/I'll save you from the terror on the screen/I'll make you see/That this is thriller/Thriller night/'Cause I can thrill you more/Than any ghost would ever dare try/(Thriller)/(Thriller night)/So let me hold you tight/And share a (killer, diller, chiller)/(Thriller here tonight)/'Cause this is thriller/Thriller night/Girl, I can thrill you more/Than any ghost would ever dare try/(Thriller)/(Thriller night)/So let me hold you tight/And share a/(killer, thriller)/I'm gonna thrill you tonight/[Rap]/Darkness falls across the land/The midnight hour is close at hand/Creatures crawl in search of blood/To terrorize y'all's neighborhood/And whosoever shall be found/Without the soul for getting down/Must stand and face the hounds of hell/And rot inside a corpse's shell/I'm gonna thrill you tonight/(Thriller, thriller)/I'm gonna thrill you tonight/(Thriller night, thriller)/I'm gonna thrill you tonight/Ooh, babe, I'm gonna thrill you tonight/Thriller night, babe/[Rap]/The foulest stench is in the air/The funk of forty thousand years/And grizzly ghouls from every tomb/Are closing in to seal your doom/And though you fight to stay alive/Your body starts to shiver
for no mere mortal can resist/the evil of the thriller)


(continua)

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Sobre a maioridade penal.

I

Essa discussão recorrente em torno da diminuição da maioridade penal é típica da política brasileira do avestruz.

É certo que um crime bárbaro foi cometido. Uma criança de seis anos foi arrastada por quilômetros. E todos sentimos, não apenas com os pais dela. Mas, principalmente, pelos gritos dela. Pelo que sabemos que sofreu, sem que a pudéssemos socorrer.

É bom que seja assim. Que sejamos solidários com ela; que soframos com ela. E não apenas com ela, mas com todas as crianças deste imenso país. É humano que nos comova. E, mais que isso, que nos revolte, ao pensarmos nos filhos que temos em casa.

Afinal, pais e mães, tendemos a enxergar, naquela criancinha, o rosto do próprio filho.

Porém, é preciso mais que a pura e justificada emoção, para evitar a repetição de fatos como esse. E, ao escrever isso, tenho perfeita consciência do risco a que me exponho. Afinal, quem se opõe aos leões, corre o risco de acabar devorado também.

Mas, é preciso um mínimo de sanidade mental nesta hora de dor. Porque é de todos, do coletivo, que se trata.


II

Não vou defender os criminosos, porque isso, diante da comoção que se instalou nacionalmente, beiraria o suicídio.

Afinal, o tribunal popular já os julgou e condenou sumariamente. Todos – advogados, promotor, testemunhas, juiz e júri – já decidiram que são monstros.

Não, não há a mínima possibilidade de que não soubessem que a criança estava sendo arrastada. Afinal, todos se convenceram disso; é o consenso. Passou na Tv. A polícia afirmou. Eles confessaram – sabe-se lá sob que condições, mas isso é adereço. E, certamente, aparecerão mais e mais testemunhas do fato, a descrever a cena, de forma vívida.

Não importa que a Justiça saiba, de há muito, que a testemunha é a prostituta das provas, não apenas pela capacidade de corrupção, mas, principalmente, pelas falhas que a memória apresenta, sempre tendente a esquecer o fato e, até, a adicionar detalhes puramente imaginários. O que importa é que fulano disse que viu. E ponto. Principalmente, se a lembrança for acompanhada de um mar de lágrimas...

Não, eles não são humanos. Ao contrário de nós, jamais comoveria, a qualquer deles, os gritos de uma criança. Podemos esquartejá-los, enforcá-los, afogá-los, fritá-los, sujeitá-los a toda a sorte de dores e humilhações porque, simplesmente, não são humanos. E, depois de mortos, podemos até mesmo, tocar-lhes os corpos, curiosamente, para termos certeza de que são “coisas”, postas nos mundo pelo demônio, para afrontar a nossa humanidade.

Não tiveram nem pai nem mãe. E se tiveram, temos de, também, condenar quem os pariu. Que a vergonha recaia, também, sobre a família que acalentou “criaturas” assim.

Que coisa espantosa! Evoluímos tanto, em todos estes milhares de anos. Mas, hoje, se fosse permitido, esses cidadãos – sim, porque deveriam, também, ser cidadãos – seriam submetidos aos mesmos horrores dos primórdios da sociedade humana. Não faltaria quem se oferecesse para vazar-lhes os olhos. Ou para arrastá-los quilômetros a fio. Ou, ainda, para prender as tenazes e derramar o piche fervente.

E, no entanto, nada traria aquela criancinha de volta. Os faria cessar os gritos dela, que pareceremos escutar. Ou, ao menos, impediria que outras dezenas, centenas, milhares de crianças possam sofrer o destino dela.


III

Até que ponto, toda a brutalidade que queremos impor aos criminosos serve para evitar as dores de outras crianças, ou para evitar, simplesmente, a nossa própria dor? Até que ponto a barbárie a que somos tentados, procura, apenas, atenuar a nossa própria inércia, diante da raiz de toda essa questão?

Com certeza, o leitor pensará: lá vem mais um falar de miséria e de direitos humanos para os criminosos!

Ilude-se, porém, o caro leitor: não vou falar de nada disso.

Afinal, todos estamos cansados de saber como nascem, vivem e morrem, todos os dias, milhares, milhões de criancinhas, neste gigante da miséria chamado Brasil.

Todos sabemos que passam fome, que não têm escola, que levam porrada todo santo dia. E que, muitas vezes, morrerão sem saber o que é um abraço, um carinho, do pai ou da mãe. Pois, que muitos vêm de famílias desestruturadas, onde a luta por comida assume proporções tais, que deforma. Mas, isso, todos estamos cansados de saber, não é?

Também estamos cansados de saber que os traficantes arrastam esses pequenos morro abaixo do tráfico, do roubo, do assassínio. Todo santo dia. Várias vezes por dia. Anos a fio. E que não aparece ninguém para lhes fazer frente.

Porque o Estado brasileiro, simplesmente, não funciona. Porque temos policiais corruptos, juízes corruptos, políticos corruptos, advogados corruptos, empresários corruptos e corruptores.

Porque a nossa moral permite que seja assim. Porque achamos, sinceramente, que o certo, o inteligente, é levar vantagem. E que burros são os que não ingressam na doce teia da corrupção.

Então, eu jamais poderia falar ao leitor daquilo que já conhece. Do que está, todos os dias, à porta, na rua, a cada vez que põe a cabeça de fora do sacrossanto Lar.

Queremos sangue. E o que eu venho propor é, justamente, a normalização da indústria da vingança social.


IV

Li que um deputado do PFL propôs a redução da maioridade penal para 16 anos. Veja só: é pouco mais que a idade da minha filha, que tem 17, e uma cabeça de vento, um juízo de galinha que eu tenho certeza de que, largada no mundo, não conseguiria sobreviver sem mim.

Não, fique calmo, leitor, que isso não me comoveu, absolutamente. Jamais veria no rosto dela, o rosto de um desses monstros. Jamais imaginaria que, inteligente do jeito que ela é, talvez pudesse ser um deles, a roubar carros, traficar drogas e até a matar por um outro tipo de vida, se, ao invés de todo o carinho e atenção que teve, tivesse sido criada num ambiente de brutalidade, pelas ruas, na base da lei do mais forte.

Afinal, a minha filha é a minha filha. E eu jamais poderia imaginá-la tendo de gramar a dor da infância e da adolescência que não se teve, porque foi preciso garantir um pedaço de pão para aplacar a fome – que dói, sim, leitor, dói – ou porque foi preciso encarnar, todo santo dia, a personificação da crueldade, para sobreviver entre tantos outros cruéis, que essa é a lei das ruas.

Não, nem eu, nem a minha filha, nem o caro leitor, nem os filhos que, com igual carinho, está a criar seriam capazes de qualquer brutalidade, mesmo que submetidos a toda a sorte de brutalidades, todo santo dia, não é mesmo?

Por isso, só me revoltei com douto parlamentar do PFL devido à timidez da proposta dele. Para mim, deveríamos reduzir a maioridade penal para dez anos. Ou para seis, tal e qual a idade da criancinha que todos estamos a chorar.

Já foi assim - ou o caro leitor ignora? Ao longo da história da civilização, já enforcamos criancinhas, aos oito, dez anos, por roubarem um pedaço de pão. Mas, creio que falhamos ao não adaptar tão justa e importante medida à necessidade das massas, que ficaram meio que órfãs, após o fim dos autos de fé.

Que reuniam, diga-se de passagem, do príncipe ao plebeu, passando, obviamente, por religiosos, sempre prontamente piedosos, para aquelas ocasiões em que o in era o churrasquinho de gente...


V

Hoje, com as tecnologias de que dispomos podemos tornar isso sublime. Aliás, até os deuses invejariam a nossa capacidade de criação e de espetacularização.

Para começar, aprovemos a proposta do douto deputado. E enquanto trancafiamos e matamos esses jovens monstros de 16 anos, já podemos ir adaptando a nossa indústria, para, mais adiante, abrangermos, também, os monstros, dos 14, dos 12 dos 10, dos 8, dos 6.

Sim, porque é certo que enquanto trancafiamos e matamos os de 16, os traficantes, que não são bestas, passarão a recrutar os de 15 e os 14. E, depois, os de 13 e os de 12. E quem sabe, um dia, de forma surrealista, até bebês de colo.

Mas, enquanto isso acontece, podemos organizar a nossa indústria. Podemos, por exemplo, criar linhas de produção para cordas de enforcamento de acordo com a faixa etária. Sim, porque não convém colocar corda de 16 num corpo de 8 ou de 6. Não dá certo. Pode não enforcar corretamente...

Também dá tempo para que possamos realizar os devidos processos licitatórios. Sim, porque não é justo que apenas a Rede Globo retransmita, ao vivo e em cores, a todo o país, o espetáculo do adolescente ou da criança enforcada. É preciso garantir concorrência. Para que o serviço vendido ao Estado fique mais barato ao contribuinte.

E para que o telespectador habitual, de um ou outro canal, não precise nem acionar o controle remoto, para poder assistir, confortavelmente, no sacrossanto Lar, a um espetáculo tão grandioso.

Obviamente, que as TVs terão de se comprometer a espalhar câmeras em cada canto da câmara de execução, para que possamos acompanhar, passo a passo, todos os movimentos musculares do adolescente ou da criança executada.

Claro, também, que serão vendidos ingressos, para camarotes e arquibancadas.

Mas, para quem prefere ficar em casa, sempre haverá o conforto dos deliverys, de pipocas, batatas fritas, cervejas e refrigerantes.


VI

O único problema é que, depois de algum tempo, tais espetáculos, talvez, comecem a cansar. Afinal, serão tantas e tantas levas de executados que as pessoas começarão a exclamar: de novo?

Com o agravante, leitor, que os executados não terão qualquer glamour. Serão, invariavelmente, pobres e negros – ou, quando muito, pardos – famintos e esfarrapados.

Mas isso não será problema, de modo algum, para as grandes redes de TV e os jornalões. Elas poderão até criar, por exemplo, um Big Brother no corredor da morte – será fantástico, não é?

Ou, quem sabe, maravilhosos novelões, patrocinados pelas empresas brasileiras que dão tudo pelo social.

Obviamente, que, como já disse, em nossa política brasileira do avestruz, não resolveremos o problema.

Seguiremos a ser um país miserável e desigual, no qual 5% - ou até menos que isso – dos mais ricos detêm a maior parte da riqueza que é produzida pelo conjunto dos cidadãos.

Um país de favelas, palafitas, subúrbios, baixadas, no qual bebezinhos brincam na lama, que nem animais.

No qual, todo santo dia, milhões de bebezinhos pobres, negros, pardos são arrastados pela morte, por diarréias, gripes, sarampos, doenças que não matam nem cachorro nos países desenvolvidos.

Mas, isso é detalhe. Afinal, o que é importa é o sangue, a comoção, a vingança, o espetáculo.

Seguiremos, de consciência limpa, dizendo que nossas crianças se tornam, hoje, adultas mais cedo, por conta do que vêem na televisão. Que têm consciência plena, clara, do que querem ou não querem e do que é certo e do que errado.

Como se as opções sexuais que tomam; como se o sexo, que é apenas um aspecto da vida, pudesse ser considerado a totalidade.

E como se tais opções fossem feitas, realmente, sempre de forma clara e madura – aliás, nem temos sérios problemas com a gravidez precoce, não é menos? Nem somos um país onde a gravidez na adolescência já se tornou um problema de saúde pública, não é mesmo?

Façamos de conta que, hoje, por conta do alargamento da expectativa de vida, o ser humano não experimenta um prolongamento da infância e da adolescência.

Contra todas as evidências, tratemos nossas crianças como adultas. Como se a TV Globo e afins tivesse a capacidade de amadurecê-las, rapidamente, do ponto de vista mental – e não, apenas, físico, hormonal – para essa tarefa terrível que é exercício do livre arbítrio.

Que, até a nós, adultos, faz, por vezes, naufragar.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Sou honesta, e daí?


Sou honesta, e daí? Não sou burra, condescendente, ingênua, o raio que o parta. Sou, pura e simplesmente, honesta.

Estranho eu ter de justificar isso. Um dia, me disseram que era qualidade. Hoje, sinceramente, imagino que seja defeito. Afinal, honestidade, que vem a ser?

Me perdoe, leitor, mas estou abrindo o coração. Em mais ou menos 20 anos de política, já vi de tudo um pouco. E não posso dizer que nunca meti a mão na merda. Afinal, os “guerreiros” são para isso mesmo: para fazer o que é preciso.

Mas não tenho – e disso me orgulho – um palmo de terra no cemitério. Tenho, apenas, dívidas em profusão. E que eu espero, sinceramente, poder começar a pagar. Antes que os credores me mandem prender...

É estranha essa coisa dos valores. Por vezes, sinto a honestidade como um fardo. Primeiro, porque as pessoas não acreditam. Ou, outros, fazem de tudo para demovê-lo dessa “infeliz” condição. Ou, ainda, porque honestidade, neste país de moral lassa, tornou-se sinônimo de burrice.

Vim da classe média alta. Conheço, portanto, um bom whisky, o salmão defumado e o caviar iraniano. Mas, nada disso – infelizmente, caro leitor – conseguiu me seduzir. Sempre achei caviar pra lá de pitiu, salmão razoavelmente pai d’egua e o whisky pra lá de enjoativo.

Nunca consegui me ver apegada a coisas materiais. E, mais ainda, a coisas que a gente caga e mija na primeira esquina.

Sempre me foram muitíssimo mais sedutores a dona Maria e o seu José. Toda a beleza que são. Com as suas palavras, por vezes, incompreensíveis. Mas, com um sentimento que é maior que o mundo inteiro!

Amei, amo e creio que sempre amarei o seu José e a dona Maria. E é por isso que jamais conseguirei me conformar com a miséria em que vivem. Me transformei em um agente a serviço deles. Que se há de fazer?

Não sou incorruptível. Ninguém é. O problema, caro leitor, é que não consegui quem bancasse o meu preço. Porque o meu preço incluem o seu José e a dona Maria. É caríssimo, veja você.

É preço de doido. Afinal, poderia ter uma casa confortável, um carro (aliás, nunca consegui distingui-los; não conheço marcas) e um futuro tranqüilo para a minha filha.

Afinal, nasci para isso. Mas, não consigo “cumprir” o meu destino. Adoraria isso, seria bem menos estafante. E eu poderia ocupar um bom lugar de destaque em qualquer corte, não é mesmo? Pois é, com o meu talento, seria, quem sabe, quase um Galileu Galilei, a oferecer os céus como testemunha da autoridade do meu eventual mantenedor...

O problema é que o seu José e a dona Maria nem olhar para o céu podem. Vivem numa condição tão deplorável, sem comida, sem casa, sem educação, que eu nem consigo me imaginar como Galileu. Pois, se a dona Maria e o seu José, que são os meus senhores, não podem olhar para os céus displicentemente, como eu, escrava, vassala deles, poderia ver os céus que eles não vêem?

Tenho pela sociedade uma profunda gratidão. Sei que não existo individualmente; afinal, o Humano é uma construção coletiva. Meu talento não me pertence, nunca pertencerá. É um ganho coletivo. E ao coletivo eu preciso devolvê-lo.

Por isso, sigo honestamente pela vida. Cidadã orgulhosa da própria condição. Não consigo me corromper – simplesmente, não está em mim.

Adoraria isso, para ter todas as benesses que isso me proporcionaria. Afinal, sou humana. O problema é que não está em mim.

Gosto de me olhar no espelho e gostar de mim. Gosto que a minha filha goste de mim. Gosto disso. E é por isso que eu perguntei, ao começo: sou honesta, e daí?

P. S. Detesto, odeio, ter virado uma espécie de quintessência da moralidade. Porque sou humana, caramba! E eu penso nisso. Como todo mundo pensaria. Mas tenho vergonha. E isso é cruel!

domingo, 4 de fevereiro de 2007

Fragmentos biográficos V

A Menina e as Estrelas



A menina contava estrelas. E de tanto contar estrelas, passou a vê-las em todo canto. Resplandeciam nos grãozinhos de areia e nas superfícies das pedras. Nas folhas, nos galhos, nas raízes das árvores. No peito que se abria a cada manhã. Vivas, luzidias. Mas tão inalcançáveis como as que brilhavam nos céus.

“Estrelas não foram feitas para tocar” – sangrou. E pensou como não tocar o que se deseja, porque se ama. Ou que se ama porque se deseja, mesmo que em simples lampejo. A luz que rodeia e que nunca é a mesma. O ar que as narinas procuram sofregamente. O perfume. O instinto.

Ergueu as mãos ao encontro dos céus. E como que tocou os corpos que ardiam no negrume. Decompostos em cor. Ensimesmados. Gigantescos de solidão. Os corpos que jamais se encontram, porque não são exatamente corpos. Mas o anseio de um corpo.

Num rodopio, reencontrou-se no ventre da terra. Sentiu o azedume do bacuri que a árvore embalara tão docemente. O cheiro que se levantava do cupuaçuzeiro. O gosto do caju amarelinho que assobiava aos passarinhos. A chuva que afundava na terra, para ressurgir na primeira flor.

E a menina pensou que, talvez, não valesse à pena sonhar estrelas. Afinal, estariam bem ali em seus olhos. Mas embriagadas nas luzes de outras estrelas. E na combustão que as moveria à exaustão.

Ao alcance das mãos havia o jabutizinho que surgia de entre as pedras. A goiaba vermelha e sumarenta. O inebriante sapoti. Cacaueiros, ingazeiros, biribás. E todas as cores, e cheiros e sabores que a vida paria a cada momento. Infinitamente.

“Mas eles não ardem nem hipnotizam como as estrelas”, protestou, de si para si. Mas, que importava? As estrelas ficariam nos céus, como os enfeites que, tantas vezes, ajudara a pendurar na árvore de Natal. E cujo encanto era o encanto de não passarem de um encantamento. Que a gente olha, sonha e, um belo dia, embrulha. Para admirar, quem sabe, em outro Natal.

Belém, 04/02/2007.

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Saindo do Túmulo


I Got Life

I got life, mother
I got laughs, sister
I got freedom, brother
I got good times, man

I got crazy ways, daughter
I got million-dollar charm, cousin
I got headaches and toothaches
And bad times too
Like you

I got my hair
I got my head
I got my brains
I got my ears
I got my eyes
I got my nose
I got my mouth
I got my teeth

I got my tongue
I got my chin
I got my neck
I got my tits
I got my heart
I got my soul
I got my back
I got my ass

I got my arms
I got my hands
I got my fingers
Got my legs
I got my feet
I got my toes
I got my liver
Got my blood

Repete

I got my guts (I got my guts)
I got my muscles (muscles)
I got life (life)
Life (life)
Life (life)
LIFE!


Hare Krishna

Hare Krishna Hare Krishna
Krishna Krishna Hare Hare
Hare Rama Hare Rama
Rama Rama Hare Hare

Hare Krishna Hare Krishna
Krishna Krishna Hare Hare
Hare Rama Hare Rama
Rama Rama Hare Hare

Love love
Love love
Drop out
Drop out
Be in
Be in

Love love
Love love
Drop out
Drop out
Be in
Be in

Take trips get high
Laugh joke and good bye
Beat drum and old tin pot
I'm high on you know what

Take trips get high
Laugh joke and good bye
Beat drum and old tin pot
I'm high on you know what

Take trips get high
Laugh joke and good bye
Beat drum and old tin pot
I'm high on you know what

Marijuana marijuana
Juana juana mari mari
Marijuana marijuana
Juana juana mari mari

Beads, flowers, freedom, happiness
Beads, flowers, freedom, happiness
Beads, flowers, freedom, happiness
Beads, flowers, freedom, happiness

Beads, flowers, freedom, happiness
Beads, flowers, freedom, happiness
Beads, flowers, freedom, happiness
Beads, flowers, freedom, happiness


Aquarius

When the moon is in the Seventh House
And Jupiter aligns with Mars
Then peace will guide the planets
And love will steer the stars

This is the dawning of the age of Aquarius
The age of Aquarius
Aquarius!
Aquarius!

Harmony and understanding
Sympathy and trust abounding
No more falsehoods or derisions
Golding living dreams of visions
Mystic crystal revalation
And the mind's true liberation
Aquarius!
Aquarius!

When the moon is in the Seventh House
And Jupiter aligns with Mars
Then peace will guide the planets
And love will steer the stars

This is the dawning of the age of Aquarius
The age of Aquarius
Aquarius!
Aquarius!

Harmony and understanding
Sympathy and trust abounding
No more falsehoods or derisions
Golding living dreams of visions
Mystic crystal revalation
And the mind's true liberation
Aquarius!
Aquarius!


(Hair)

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Extra! Extra!

O Retorno da Perereca – a Missão

Pseudo-jornalista garante que
volta ao batente no mês que vem



Direto do Brejo News – O blog A Perereca da Vizinha retorna ao formato original no próximo 12 de fevereiro, em plena batucada do Carnaval. Segundo a proprietária do inusitado espaço político – a esquizóide Perereca – a decisão surgiu depois de mais uma de suas crises existenciais. “Tomei toneladas de Prozac e me submeti a intensivas sessões de eletrochoque. Também experimentei todas as griffes de camisa-de-força. E acho que, agora, finalmente, encontrei o caminho da salvação” – explicou a lunática.

Ela disse que o blog trará, novamente, matérias, notas e entrevistas exclusivas, além de análise política. “Eu e a minha equipe decidimos recuperar este importante espaço da blogosfera. Vamos, como diria a minha correspondente, ‘dar tudo de si’, para informar os leitores de tudo que é lado”, declarou, em português canhestro e repleto de sétimas intenções, como, aliás, é do estilo dela.

A Perereca reafirmou o compromisso de retomar o “Projeto Arco-Íris”, que nada mais é que um espaço político multicor. “Queremos ouvir atenienses, espartanos e, é claro, também, aos persas. Pretendemos transformar o blog num point democrático, sujeito a toda sorte de controvérsias” – disse, sem explicar, porém, como vai conciliar esse ideal com fato de ocupar uma assessoria de imprensa do novo governo.

A pseudo-jornalista (alô, alô, sindicato! Ela não tem diploma!) informou, ainda, que pretende implantar um projeto de “sustentabilidade econômica” do blog. “Graças à consultoria do Barão de Inhangapi, resolvemos colocar anúncios no blog. Mas, é claro, manteremos o compromisso primordial com os leitores. Porque, afinal, os leitores estarão, sempre, em primeiro lugar”, observou a hipócrita, que evitou explicar o fato de a tal “consultoria” ter sido contratada sem licitação.

O mailing da Perereca se encontra em fase de atualização. E o blog retornará com novos contadores de acesso, que permitam identificar a procedência dos leitores, bem como aqueles que se encontram online. “Aprendi muito nesses meses todos” – comentou a suspirosa Perereca – “Creio que os leitores gostarão muitíssimo das novidades que vamos apresentar”.

Entre as “novidades” de A Perereca da Vizinha está o ultra-esperado VII capítulo de “Festa no Meu Apê”. A pseudo-jornalista (alô, alô, sindicato! PÔ!) garante, porém, que não vai cutucar onça com vara curta – aliás, com vara alguma: “Apenas acreditamos que o Pará merece e que está perfeitamente amadurecido para uma incursão democrática como essa”.