É possível que nunca tenha existido uma queda de braço entre os militares bolsonaristas e o Centrão, pela ocupação de espaços no Governo Federal (como muitos afirmaram), mas uma estratégica cessão temporária de poder.
Posso estar enganada, mas me parece que o verdadeiro projeto desses militares não é “apenas” a desindustrialização, mas a desurbanização do Brasil, o que exige tempo para executar e consolidar.
Uma espécie de marcha para o campo, que tornaria menos visível a eliminação de milhões de brasileiros pobres, por doenças e pela fome, e acabaria mais facilmente com direitos conquistados pelas mulheres, negros e gays.
Creio que o que se pretende não é “apenas” condenar o Brasil à condição de mero exportador de matérias-primas, o que atende a interesses internacionais.
Mas realmente fazê-lo retroceder a meados do século passado, em termos de costumes.
Um tipo de retrocesso mais fácil de obter em sociedades predominantemente rurais, especialmente em países como o Brasil, onde vários fatores contribuiriam para um maior controle social e a supressão do diferente.
Entre eles, a dispersão e pobreza dos núcleos familiares; a falta de informações e a baixa escolaridade; a forte autoridade das igrejas, militares e policiais; o conservadorismo talvez inerente a essas populações.
Ao fim e ao cabo, isso dificultaria o combate às violências físicas e psicológicas contra mulheres, negros e gays, naturalizando tais práticas e a execração pública dos “diferentes” e de quem “ousasse” defendê-los.
Significaria ir retirando, na prática, os direitos conquistados, até que existam condições objetivas para retirá-los, também, da legislação.
Não é por acaso que a urbanização e o avanço dos costumes coincidem ao longo da História: apesar de todos os seus problemas, as cidades, principalmente as maiores, são, também, as mães da civilização e da globalização: o “abrir-se para o outro e para o mundo”.
Nelas, floresceram a Ciência, a Filosofia, a Democracia, a Política, a Justiça, os grandes sistemas econômicos, a organização dos trabalhadores, os movimentos sociais, as lutas pelos direitos humanos.
As cidades são, portanto, uma espécie de Poder modernizador que tem de ser reduzido o máximo possível, para a recondução do mundo ao patriarcado, como pretendem esses bárbaros.
Se possível, devem servir apenas às movimentações financeiras e à Educação e deleite dos mais ricos.
Mas, mesmo em tais condições, devem possuir um controle social mais rígido, em decorrência das leis aprovadas pela maioria rural.
Infelizmente, grande parte dos democratas demorou a perceber que o cerne da luta dessas forças retrógradas é “a moral e os bons costumes”.
Muitos companheiros, aliás, ainda relutam em admitir isso, eis que só conseguem enxergar os interesses econômicos envolvidos nessa questão.
Tudo bem: os bilionários, os grandes senhores do mercado financeiro e do agronegócio, por exemplo, estão a lucrar horrores com tudo isso.
Mas para essas massas que hoje defendem os interesses deles, pouco importa pagar 3, 7 ou 10 reais no litro da gasolina.
O que elas não suportam mais é enxergar “em seus domínios” um gay, um negro ou uma mulher independente.
É claro que para nós, que vivemos na realidade verdadeira, a tentativa de desurbanizar ou reagrarizar um país de mais de 200 milhões de habitantes parece uma empreitada destinada ao fracasso e, sobretudo, capaz de produzir um dos maiores genocídios deste século.
Mas precisamos atentar a três problemas.
O primeiro é que estamos a lidar com pessoas capturadas por uma “realidade paralela”, para as quais qualquer sacrifício vale a pena (mesmo que seja de milhões de seres humanos), desde que isso resulte em uma sociedade altamente repressiva, para negros, mulheres e gays.
O segundo é que um projeto desses cai como uma luva para boa parte das nossas lideranças políticas, já que a desurbanização facilitaria velhos esquemas de manutenção de poder, como é o caso dos currais eleitorais, além de possibilitar maiores negociatas.
O terceiro é que o Brasil parece ter virado uma espécie de laboratório, para as forças internacionais do patriarcado e do nazismo.
Até pelo tamanho, população e papel estratégico do Brasil na América Latina, os projetos que essas forças conseguirem executar aqui servirão de modelo e alavanca, para que consigam dominar outros países.
Não se iluda: esse é um projeto de dominação mundial, e sustentado por grandes fortunas.
E se parece coisa de Pink e o Cérebro, ou até do Doutor Fantástico, do Stanley Kubrick, é bom não esquecer que os estrategistas dessas forças conseguiram emplacar Donald Trump, nos Estados Unidos, em 2016; e Bolsonaro, no Brasil, em 2018.
Penso que as próximas eleições serão um jogo de tudo ou nada, para os militares bolsonaristas e toda essa massa retrógrada.
E não apenas em se tratando da Presidência da República, mas, em igual medida, também do Congresso Nacional.
Porque se vencerem as próximas eleições, na Presidência e no Congresso, eles poderão ter décadas de poder, para desurbanizar o Brasil e impor a sua “nova cultura”.
Não creio que vençam, mas o arsenal bolsonarista é preocupante: bilhões de reais para propaganda e compra de votos, redes de fake news, cooptação de policiais, juízes e procuradores de Justiça, articulações internacionais do nazismo que permitirão vários ataques “de fora para dentro” (como já começou a ocorrer, aliás), gerando maior credibilidade às suas notícias mentirosas.
Outra arma, a meu ver uma das mais poderosas, acabou prejudicada pela pandemia e pela incompetência bolsonarista, economia guedista e sucessivas crises políticas: o plano de investimentos em obras públicas, lançado, no ano passado, pelo general Braga Netto.
Tais investimentos, que os próprios militares compararam a um Plano Marshall, deveria aquecer a economia e gerar empregos, principalmente para as camadas mais pobres, no período eleitoral.
Aliado à propaganda de um Brasil imaginário, ele recriaria a atmosfera da década de 1970, para iludir o eleitorado e isolar as oposições.
Mas com a inflação e a alta dos juros, é improvável que esse “Plano Marshall” consiga produzir os frutos desejados, no ano que vem.
No entanto, restou a outra “perna” desse ilusionismo: a propaganda, com verbas realmente extraordinárias, que exaltará o povo brasileiro e o Brasil imaginário dos militares.
Penso que as oposições precisam acordar para a real dimensão do que pode estar em jogo no ano que vem.
E, também, para os enormes desafios que enfrentaremos, no confronto eleitoral com a máquina de guerra desses bárbaros.
Porque, se perdermos, é possível que o Brasil enfrente décadas de repressão e massacres, em dimensões como nunca vimos em toda a sua história.
E o país que teremos, já na década de 2030, parecerá saído de um pesadelo.
FUUUIIIII!!!!
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