A Auditoria Geral do Estado (AGE), o principal órgão
de controle e fiscalização do Governo, quer a prisão preventiva do ex-governador
do Pará, Simão Jatene, a quem acusa de ser o “líder” de uma “organização
criminosa”, que teria “saqueado” os cofres públicos, através do programa Asfalto
na Cidade.
A Representação Criminal da AGE foi protocolada, em 2
de abril último, no Ministério Público Estadual (MP-PA) e na Delegacia Geral de
Polícia Civil, para que eles peçam à Justiça a prisão do ex-governador.
No documento, a AGE também solicita as prisões
preventivas dos ex-secretários estaduais de Desenvolvimento Urbano e Obras
Públicas Ruy Klautau, Pedro Abílio Torre do Carmo e Noêmia Jacob; dos
proprietários das construtoras Leal Junior, Rodoplan e JM Terraplanagem e de
dois engenheiros da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas (SEDOP),
José Bernardo Pinho e Raimundo Almeida.
A AGE afirma que as prisões são necessárias para evitar
a destruição de provas e a fuga dos envolvidos nos supostos crimes.
No ano passado, o Asfalto na Cidade consumiu mais de
R$ 369 milhões, na maior farra de asfalto já vista no Pará, em um ano
eleitoral.
Há suspeitas de superfaturamento, obras fantasmas, corrupção,
pagamento de propinas, improbidade administrativa e caixa dois.
Devido às supostas irregularidades, o programa foi
suspenso em janeiro deste ano.
Mas segundo a AGE, que abriu uma investigação sobre o
caso, há provas de que as ilegalidades fariam parte de um “esquema criminoso”
que operou na SEDOP, o órgão executor do programa, nos últimos oito anos, e não
apenas no ano passado. Naquela secretaria teria ocorrido uma espécie de “formalização
da corrupção”, nos pagamentos dessas obras.
Na Representação Criminal, a AGE sustenta que tudo
isso ocorreu com o “aval” do então governador Simão Jatene, “que em contato com
as empresas e com o secretário da SEDOP, articulavam quais empresas seriam
beneficiadas com pagamentos antecipados e tal ordem ilegal era repassada para
os fiscais, que de maneira fraudulenta apresentavam os Boletins de Medições,
avalizando a liberação de valores de supostas pavimentações, por vezes nunca
realizadas”.
Ela também afirma que o funcionamento desse suposto “esquema
criminoso”, que teria “a nítida finalidade de se locupletar de verbas públicas”,
foi relatado pelo engenheiro da SEDOP José Bernardo Pinho, que trabalhou como
fiscal dos contratos da secretaria com as construtoras Leal Junior, Rodoplan e
JM Construções.
Segundo a AGE, José Bernardo afirmou que alterava os boletins
de Medição das obras, “para adequar os quantitativos medidos aos valores disponíveis
para pagamento”.
No depoimento, o engenheiro teria se recusado a citar
nomes, “porque não estava ali para delatar ninguém”. No entanto, teria afirmado
que recebeu “ordens superiores” de todos os ex-secretários da SEDOP, que tinham
o “aval” do então governador.
Ele também teria dito que mantém contato com as
empresas que receberam pagamentos antecipados, para que elas finalizem os
serviços, o que, para a AGE, é uma tentativa de prejudicar as investigações.
Segundo a AGE, os envolvidos no suposto esquema cometeram
crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, prevaricação, falsidade
ideológica, uso de documento falso e organização criminosa.
Se forem condenados, diz ela, as penas previstas no
Código Penal podem chegar a 41 anos para Jatene, “mentor e organizador de toda
a organização criminosa”; 36 anos para os funcionários públicos, e 30 anos para
os empresários.
Ainda segundo ela, apesar de os acusados possuírem
residência fixa, emprego e não apresentarem antecedentes criminais, “nada
contribuem para que os mesmos sejam mantidos em liberdade, pois a partir do
momento em que os mesmos tiverem conhecimento das imputações penais e suas
implicações, estes vão se evadir do distrito da culpa, posto que possuem
significativas condições financeiras”.
Outro fato que demonstraria a necessidade da prisão
preventiva, ainda segundo a Auditoria Geral do Estado, é que os envolvidos nos
supostos crimes continuariam a manter contato “com o fito de concluírem as
pavimentações que não foram realizadas, porém recebidas de forma fraudulenta, e
no atual momento estão tentando ocultar as provas dos cometimentos dos
ilícitos, demonstrando assim que no decorrer da investigação os mesmos irão
tumultuar a colheita de provas e até prejudica-las, com a nítida finalidade de
que a impunidade prevaleça”.
Além da prisão preventiva, ela também pede a quebra do
sigilo bancário e fiscal de Jatene, dos três ex-secretários estaduais, dos dois
engenheiros da SEDOP e dos sócios da Leal Junior, Rodoplan e JM Terraplanagem.
A Representação Criminal foi endereçada ao delegado
geral de Polícia Civil, Alberto Teixeira, e ao Procurador Geral de Justiça,
Gilberto Valente, que encaminhou o caso ao promotor Alexandre Couto Neto, coordenador
do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Patrimônio Público (CAO), do MP-PA.
No sábado, 13 de abril, durante a operação “Tapa
Buraco”, a AGE teria flagrado a construtora Leal Junior executando obras do
Asfalto na Cidade, no município de Itupiranga, no Sudeste do Pará, apesar de o
programa estar suspenso, devido às investigações.
Farra
de asfalto coloca envolvidos no olho de um furacão
Os R$ 369 milhões torrados no Asfalto na Cidade, no
ano passado, superaram tudo o que ele consumiu nos anos de 2014, 2015, 2016 e
2017, somados: R$ 299 milhões, em valores atualizados pelo IPCA-E de dezembro.
No entanto, a farra de asfalto acabou por colocar os envolvidos
no olho de um furacão.
Ainda no ano passado, o MP-PA abriu investigação sobre
o caso, a pedido do Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
O partido pediu que fosse investigado o possível uso
do programa em favor da candidatura de Márcio Miranda, o candidato apoiado pelo
então governador Simão Jatene ao Governo do Estado, o que poderia configurar
improbidade administrativa.
A coligação Esperança Renovada (MDB/DC/PSD) também
ajuizou uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), no Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Nessa AIJE, em 15 de janeiro deste ano, a procuradora
regional eleitoral Nayana Fadul da Silva emitiu um parecer pedindo a condenação
à inelegibilidade, por 8 anos, de Simão Jatene e Márcio Miranda e dos
ex-secretários Pedro Abílio Torres do Carmo, que comandava a SEDOP; e Izabela
Jatene, filha do ex-governador e que era titular da Secretaria Extraordinária
de Municípios Sustentáveis (SEMSU), órgão responsável pela implantação das
ações governamentais.
A procuradora concluiu que houve abuso de poder
político e econômico, com a utilização do Asfalto na Cidade para turbinar a
campanha de Márcio Miranda, em claro desvio de finalidade do programa.
Com base no parecer de Nayana Fadul, o auditor-geral
do Estado, Giussepp Mendes, determinou a abertura de uma investigação.
Nela, foram encontrados vários indícios de
irregularidades no programa. Entre eles, o fato de que vários dos convênios que
teriam embasado a contratação dessas obras nem sequer existiriam.
Outro problema detectado foi o descompasso entre os
pagamentos e a realização desses serviços.
Em 2015, a construtora Leal Junior foi contratada para
executar 70 km de pavimentação, em 9 municípios da região do Lago de Tucuruí.
Mas, segundo a AGE, a construtora só concluiu uns 30%
desse total (20 km), embora tenha recebido 88% do valor do contrato, que era de
R$ 18,5 milhões.
Além disso, no ano passado, um novo contrato da SEDOP com
a Leal Junior, para 70 km de pavimentação em 7 municípios da mesmíssima região,
ficou em R$ 38,7 milhões – ou 109% a mais.
As supostas irregularidades levaram a AGE a encaminhar
uma denúncia ao Ministério Público de Contas (MPC).
E, em 27 de fevereiro, o procurador Guilherme da Costa
Sperry, da 4 Procuradoria do MPC, encaminhou uma Representação ao Tribunal de
Contas do Estado (TCE) contra os ex-secretários da SEDOP, Ruy Klautau e Pedro
Abílio Torres do Carmo, que teriam cometido várias irregularidades nos
pagamentos a essas construtoras.
O procurador pediu ao TCE a abertura de uma
fiscalização desses gastos, com a
inspeção in loco das obras.
Segundo Sperry, há “fortes indícios de grave violação
à norma legal” e de possível dano ao erário.
Confira
os gastos ano a ano do Asfalto na Cidade. Os valores, extraídos do SIAFEM, o
sistema de administração financeira de estados e municípios, foram atualizados
pela Perereca com base no IPCA-E de dezembro último:
2012
R$ 73.851.353,51
2013
R$ 101.908.178,37
2014
R$ 88.360.022,73
2015
R$ 67.106.749,35
2016
R$ 75.344.358,88
2017
R$ 68.051.596,59
2018
R$ 369.118.021,97
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A reportagem acima, com várias modificações, foi
publicada pelo jornal Diário do Pará, no domingo, 28/04.
O blog está aberto à manifestação de todas as pessoas citadas na matéria.
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