Direto
do Facebook:
Por
Charles Alcântara*
Deparo-me com uma nova narrativa dos defensores do
golpe, desta feita mais ardilosa.
O ardil consiste em acusar os que se opõem ao golpe,
de quererem soltar os corruptos e prender o juiz Moro.
A narrativa dos golpistas parte da premissa de que
estes são os detentores da moral, daí porque qualquer voz dissonante é acusada
de conivente com a bandidagem.
Qualquer voz que se ergue a favor do Estado de
Direito, do princípio da não culpabilidade, da presunção da inocência, do
devido processo legal, é calada histericamente.
Os golpistas agora investem contra quem defende a
legalidade, com uma acusação diversionista: "querem soltar os bandidos e
prender o Moro".
Vejo velhos conhecidos - que não conseguem dizer um
"ai" contra a corrupção que acontece sob os seus narizes - com o dedo
em riste vociferando contra a corrupção de Brasília.
Vejo velhos conhecidos - que não conseguem esboçar
um gesto sequer contra as denúncias de corrupção das autoridades locais -
enchendo suas redes sociais de mensagens e imagens de indignação contra a
corrupção das autoridades federais.
Vejo velhacos em profusão.
Eu não quero soltar os bandidos e prender o Moro,
seus estúpidos!
Sabem o que eu quero?
Quero todos os bandidos pagando pelos seus crimes,
mas o meu querer é antagônico ao querer dos golpistas.
Quero (todos!) os bandidos pagando pelas suas
bandidagens, sejam os de Brasília, sejam os do Pará.
Quero, todavia, que todos os cidadãos acusados
tenham direito a um julgamento justo, sem supressão dos direitos e garantias
previstos na Constituição Federal e que, só depois de - e se - condenados,
sejam considerados culpados.
O que eu não posso aceitar é que, em nome do combate
à corrupção ou a qualquer malfeito, juízes, promotores e policiais desrespeitem
as leis, porque não há causa nobre capaz de enobrecer a conduta de um
magistrado que desrespeita as leis.
A sociedade que concede a quem quer que seja
"autorização" para cumprir ou não cumprir a lei, ao seu alvedrio,
está fadada à injustiça, à violência, ao caos.
Ocorre que o golpista precisa relativizar o
cumprimento da lei para viabilizar o golpe. Essa é a arapuca que os golpistas
armaram para capturar a democracia brasileira.
Golpe pressupõe quebra da legalidade, regime de
exceção, licença para suprimir direitos e garantias fundamentais. Vem daí a
licença que querem conceder ao juiz Moro.
Os que hoje aplaudem os abusos cometidos contra os
direitos dos seus adversários políticos, amanhã, serão as próximas vítimas do
arbítrio que ajudaram a implantar.
Não me sinto menos honesto ou menos indignado com a
corrupção do que qualquer um desses que andam a pedir a cabeça dos corruptos.
A minha trajetória de servidor público não fica a
dever à trajetória de nenhum desses demagogos que andam por aí a liderar
manifestações contra a corrupção.
O meu querer não tem máscaras.
Quero que todos os corruptos - depois de julgados e
condenados - paguem pelos seus crimes.
Quero o mesmo destino para os sonegadores, que são
os maiores ladrões do dinheiro público.
Mas eu também quero que seja punido qualquer
magistrado, promotor ou policial que desrespeitar as leis.
O que eu não quero?
Não quero ser conduzido coercitivamente, sem que eu
tenha me recusado a prestar depoimento quando intimado.
Não quero que as minhas conversas privadas sejam
grampeadas sem autorização legal e expostas na televisão.
Não quero ser condenado sem um julgamento justo.
E quero mais!
Quero ter o direito de andar livremente nas ruas,
vestindo as cores que eu quiser, sem correr o risco de ser xingado e
violentado.
Mas eu não quero isso apenas para mim e para a minha
família. Quero para todos os brasileiros!
Do contrário, será a barbárie.
*Auditor
fiscal da Sefa, ex-presidente do Sindifisco-PA