terça-feira, 21 de abril de 2020

Um menino chamado Chico Melo




Há alguns dias, um amigo me ligou para avisar que o Chico Melo estava na UTI. 

Acho que ele queria desabafar. E também me preparar, para o que poderia acontecer. 

Mas da última vez em que vi o Chico, há uns três meses, percebi que ele não ficaria muito mais tempo entre nós... 

Chico estava bem mais magro, frágil, com um tubinho no nariz, porque sofria de uma doença pulmonar. 

Olhei para ele aflita, dei-lhe um abraço. Ele percebeu a minha aflição e sorriu. 

Desde então, comecei a me preparar para a sua partida. 

Mas é engraçado como a gente nunca está preparado, né? 

Mesmo que a gente acredite que são muitas as vidas do nosso espírito neste Planeta, não há como diminuir a tristeza e a dor. 

Chico era um guerreiro valoroso.  

Mas hoje perdeu a batalha que todos perderemos um dia... 

Conhecemo-nos em 2005, quando o Diário do Pará me chamou para analisar pilhas de documentos sobre o projeto Alvorada. 

E à medida em que fui convivendo com os seus três diretores (Chico, Camilo e Jader), percebi uma coisa engraçada. 

Eles eram pessoas tão complementares, que mais parecia que Deus havia pegado uma alma e dividido em três corpos. 

Jader era o mais emotivo e também o mais instável. Camilo, um empresário focado, mas também extremamente leal. 

E quando eles dois e eu nos empolgávamos diante de uma reportagem bombástica, Chico era o pé no freio, a racionalidade que precisava se impor à empolgação. 

Essa era, aliás, uma das coisas mais instigantes naquela caixinha de surpresas chamada Chico Melo. 

Em vez de ser uma pessoa fria, que é o que a gente geralmente associa à racionalidade, era extremamente caloroso, e generoso, e humano.  

Ajudava muita gente. Fazia o que podia por quem precisava.  

Não é à toa que estudou para ser padre: em verdade, nunca perdeu aquela benevolência sacerdotal... 

Possuía um sorriso largo e uns olhos que riam junto. 

Uns olhos brincalhões, do menino que nunca deixou de ser. 

Acho que essa era a coisa mais bacana no Chico: ele nunca permitiu que a vida lhe roubasse a meninice... 

Apesar de tudo o que viu, de todas as dificuldades que enfrentou, o menino continuou lá, na alma, com a capacidade de rir de si mesmo e do mundo... 

Era também uma pessoa muito culta, com quem dava um prazer danado a gente conversar. 

Dava para falar de Filosofia, Política, Economia, Religião, Música, e até de Latim. 

Também possuía um conhecimento fantástico de Contabilidade – e vou ficar lhe devendo muito do que aprendi nessa matéria. 

Algumas vezes, até chegava com ele e pedia: “Chico, dá uma olhada nessa papelada, porque não sei se o que estou achando é isso mesmo”. 

E em vez de responder: “Tu não és repórter? Te vira!”, ele tinha a paciência de analisar todos aqueles demonstrativos contábeis, apesar de ser o diretor financeiro do jornal... 

Chico era assim: humilde, acessível e sempre pronto a ajudar. 

Acho que essa proximidade também ocorreu porque nos conhecemos em tempos muito difíceis. 

Naqueles idos de 2005, o Diário do Pará não era a potência que é hoje. 

Como escrevi certa vez (e ele riu à beça), o jornal era, então, “uma baladeira velha”. 

Os tucanos estavam no poder desde 1995 e nós éramos, a bem dizer, “um exército de Brancaleone”. 

Isso nos obrigou a conhecer uns aos outros e a aprender a confiar uns nos outros, para que pudéssemos, ao menos, sobreviver. 

Certa vez, aliás, até disse ao Camilo: “Cometi a temeridade política de me envolver emocionalmente com vocês. Porque isso não deveria ser um casamento, mas apenas um flerte!”. 

Mas hoje, olhando para trás, vejo que esse “casamento”, com todas as suas idas e vindas, proporcionou-me a honra de conviver, ainda que por um pouco, com alguém como o Chico Melo. 

Ele vai fazer uma falta danada, não por ser diretor do jornal ou alguma coisa assim, mas pela pessoa encantadora que sempre foi. 

Não tivesse deixado de beber, iria agora tomar umas e ouvir uns duetos do Nelson Gonçalves, em homenagem a ele. 

Sei que essa não foi a primeira vez que nos encontramos, e nem será a última. 

Mesmo assim, dói à beça saber que nunca mais verei, nesta vida, aquele menino bom. 

Até breve, meu amigo!  

Deus deve estar muito feliz em te receber de volta! 

Que Ele conforte a tua família, a tua mulher, os teus filhos, os teus netos e as dezenas de amigos que deixas neste mundo. 

Pra ti, Chico (grande guerreiro!), pra gente lembrar das muitas batalhas que lutamos juntos.


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