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Engecon: ligação ao sobrinho de
Jatene e contratos de R$ 3,5 milhões
A avenida Barão do Rio Branco, 1800, no bairro da Titanlandia, é um concorridíssimo endereço de Castanhal. De acordo com certidões cartorárias, documentos do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), da Junta Comercial do Pará (Jucepa), listas telefônicas e processos judiciais, lá funcionam ou funcionaram pelo menos três empresas: a Ferccon – Ferro, Comércio e Construções Ltda, a LJB Cruz Indústria e Comércio e a Engecon – Engenharia e Construções Ltda.
Essa última, a Engecon, recebeu, entre 2000 e 2004, quase R$ 3,5 milhões do Governo do Estado, para a recuperação de estradas e a construção de microssistemas de abastecimento de água. Nada de mais não fosse por um detalhe: a avenida Barão do Rio Branco, 1800, no bairro da Titanlandia, era, até o ano passado, o mesmíssimo endereço do empresário Eduardo Salles, sobrinho do governador Simão Jatene.
A Engecon é uma empresa de história estranha, a começar pelo fato de pelo menos dois de seus endereços coincidirem com os de Eduardo. Durante muito tempo, aliás, sua grande referência, em Castanhal, foi sempre o sobrinho do governador. Tanto assim, que o nome dele chegou a figurar entre parênteses, ao lado da denominação da empresa, nas notificações a ela encaminhadas pela Justiça do Trabalho.
Na Junta Comercial do Pará (Jucepa), porém, não há vestígio de Eduardo no contrato societário da Engecon, que já teve oito proprietários, desde a sua fundação, em 1991. Os laços entre empresa e empresário só se tornam visíveis quando se cruzam informações de diferentes fontes. E quando se visitava, até o ano passado, o endereço da Engecon: um galpão dentro da fazenda de Eduardo, ao lado da subestação da Rede Celpa.
Ligações perigosas
A estreita ligação entre empresa e empresário pode ser detectada, aliás, já na fundação da Engecon (CNPJ 63.841.795/0001-80). Desde 1991 e até 1993, ela teve como endereço, na Jucepa, a Maximino Porpino, 2985 – o mesmo apresentado por Eduardo Salles, em diversas certidões cartorárias, no início da década de 90.
Na época, ainda de acordo com certidões cartorárias, funcionava, no mesmo endereço, a Ferccon – Ferro, Comércio e Construções Ltda. (CNPJ 14.057.335/0001-50), cujos proprietários eram Eduardo e seu pai, José Salles, com suas respectivas esposas, Selma e Reny.
Mais: segundo depoimento do cidadão Ronald João Hennington de Faria, que trabalhou como motorista da campanha de Eduardo Salles a prefeito de Castanhal, em 1992, o comitê eleitoral do empresário também funcionava no endereço da Ferccon. A informação, aliás, é confirmada pelos representantes de Eduardo, no processo 1910/1992, arquivado na Justiça do Trabalho, em Castanhal.
Mas as coincidências que aproximam o sobrinho do governador da Engecon não param nos endereços: abrangem, também, pelo menos três sócios majoritários da empresa, em diferentes períodos.
O primeiro deles é o advogado Adalberto da Mota Souto, que figurou em sua constituição societária durante dois meses: da fundação, em 07 de junho de 1991, até a primeira alteração contratual, em 16 de agosto daquele ano.
Adalberto – que, no final da década de 80, foi diretor da Empresa de Desenvolvimento e Urbanização de Castanhal, o mesmo organismo que concedeu três títulos de aforamento a Eduardo – funcionou como procurador de pelo menos duas pessoas que venderam terrenos ao empresário: o deputado estadual Márcio Miranda e o pecuarista Mairto Magalhães Filho.
A transação, que aconteceu em novembro de 2000 e só foi registrada em março do ano seguinte, envolveu cinco propriedades. E, em todas, aparece como “interveniente anuente” o industrial Linaldo José Bezerra da Cruz - a mesma pessoa para quem Adalberto transferiu suas cotas, ao deixar a Engecon.
Um sugestivo nome de fantasia
Esse Linaldo vem a ser, também, o proprietário da L. J. B. Cruz Indústria e Comércio (CNPJ 83.763.045/0001-45), empresa individual com o sugestivo nome de fantasia “Alupar – Alumínio Paraense”.
O problema é que o endereço da L.J.B consta como sendo a avenida Barão do Rio Branco, 1800, no bairro da Titanlândia, em pelo menos dois registros cartorários.
No primeiro, o de número 1895, de abril de 1994, a empresa compra de Eduardo uma pequena parte da fazenda do empresário, situada na Transapeu. No segundo, o de número 10578, de julho de 1998, ela vende a mesma terra ao sobrinho do governador.
Ainda mais estranho é que, conforme documentação da Jucepa, a avenida Barão do Rio Branco, 1800, só passou a sediar a Engecon em 9 de setembro de 1997. Mas Linaldo só figurou nos quadros da empresa até novembro de 1993.
Mas o caso fica ainda mais interessante quando se levam em conta dois detalhes.
O primeiro é que a Transapeu é a mesmíssima Barão do Rio Branco.
O segundo, é que a única propriedade registrada por Eduardo Salles, naquelas bandas, até 2001, era justamente a sua fazenda, no KM 02 - ao lado da subestação da Rede Celpa - e onde hoje é o badalado número 1.800 da Barão do Rio Branco.
No ano passado, porém, dificilmente se localizaria a L.J.B.Cruz nesse concorrido endereço: Linaldo José Bezerra da Cruz estava sendo processado, por estelionato, na Justiça Federal. E o processo, de número 1998.39.00011023-5, se encontrava suspenso porque se desconhecia o seu paradeiro.
Dono da Engecon é preposto de Eduardo
Ainda mais intrigante, porém, é a relação entre Eduardo Salles e o atual sócio majoritário da Engecon, o comerciante Washington Luiz Antunes Nóbrega: em pelo menos dois processos contra Eduardo, na Justiça do Trabalho, é Washington quem figura como preposto do empresário.
Os processos, de número 00025 e 00026, ambos de 2004, foram movidos por Márcio e Maurício Natividade Pessoa, ex-vaqueiros da fazenda Alvorada, de Eduardo, em Inhangapi.
As notificações das audiências de conciliação foram enviadas para a Presidente Vargas, 2428, em Castanhal, onde funciona a Agrosalles (CNPJ 05.345.350/0001-03), empresa que, de acordo com a Jucepa, Eduardo transferiu para seu irmão, Jorge Salles, em 1992. Mesmo assim, as notificações foram recebidas e, no dia 11 de fevereiro de 2004, quem compareceu às duas audiências foi Washington.
Paraibano, Washington chegou a Castanhal no final dos anos 80 e foi gerente da filial do Banco Bamerindus. Em 01 de agosto de 1996, assumiu o comando da Engecon, com 80% das cotas.
Em setembro de 1997, transferiu a sede da empresa para a Barão do Rio Branco, 1.800 – onde permanece até hoje. Em novembro, modificou-lhe a denominação para “Engecon Construção Ltda” e aumentou o capital social de R$ 100.000,00 para R$ 500.000,00.
Mas, apesar desse aumento de capital e de a empresa ter recebido, em quatro anos, cerca de R$ 3,5 milhões do Governo do Estado, Washington permanece com um patrimônio imobiliário modestíssimo: no cartório de registro de imóveis de Castanhal constava em seu nome, até o ano passado, apenas um terreno na Travessa Floriano Peixoto, 2920, no bairro da Estrela, com 10 metros de frente por 30 metros de fundos e 108,28 metros quadrados de área construída.
Adquirida em 1988, sob hipoteca, a casa – de classe média e na qual faltavam, inclusive, os portões da frente - é até hoje o endereço de Washington. Mesmo ela, no entanto, acabou adjudicada à Caixa Econômica Federal, em 1999, por pouco mais de R$ 51 mil, contra o cancelamento da hipoteca.
Empresa fornecia endereço falso
No site do INSS, constam apenas três CND’s (Certidões Negativas de Débito), pedidas e impressas pela Engecon. A primeira data de 16/10/1997 (para fins de contratação com o Poder Público), a segunda de 01/07/1998 e a terceira de 22/01/99, com validade até julho daquele ano.
Ou seja, não existem CND’s emitidas, pelo menos via Internet, no período que vai de 2000 a 2004, justamente quando ela foi contemplada com grande número de contratos, pelo Governo do Estado - que a Perereca conseguiu documentar, através do Diário Oficial on line. E a CND é documento básico, nas transações com o Estado.
Além disso, em todas as CND’s o endereço da Engecon é a rua Lauro Sodré, 1028, no bairro do Milagre, o mesmo que consta na Receita Federal. De acordo com Jucepa, o endereço da Lauro Sodré teria sido ocupado pela Engecon entre novembro de 1993 e setembro de 1996.
O problema é que lá ninguém se lembra da empresa – e a proprietária do imóvel, Luzia Mariano Gripp, que mora na casa ao lado, garante que ela nunca funcionou ali.
Vale salientar, ainda, que, ao contrário do que acontece na Barão do Rio Branco, 1800, onde todas as notificações enviadas pela Justiça do Trabalho são devidamente assinadas e recebidas, as correspondências enviadas a Engecon, no endereço da Lauro Sodré, foram, invariavelmente, devolvidas ao remetente.
Próxima
Na próxima reportagem, a Perereca trará a relação dos contratos da Engecon, com o Governo do Estado. Vale salientar que eles se referem, apenas, ao que foi encontrado nos diários oficiais que estão on line, no site da Imprensa Oficial – ou seja, a partir de meados de 2000.
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