quinta-feira, 11 de junho de 2020

Helder rebate acusações da PF e garante que não houve prejuízos ao erário com a compra de respiradores da SKN, para tratamento dos pacientes da Covid-19. PF realizou operação “Para Bellum”, que investiga a aquisição desses equipamentos.



Não houve qualquer prejuízo aos cofres públicos paraenses com a compra de respiradores, para o tratamento dos pacientes da Covid-19: a SKN do Brasil, que entregou ao Governo do Estado equipamentos diferentes daqueles que foram comprados, ainda teria a receber do governo R$ 1,580 milhão, por outros produtos que vendeu.

Mas, além de suspender esse pagamento, o governo ainda pediu à Justiça que essa dívida de R$ 1,580 milhão seja transformada em indenização ao Pará, pelos danos morais que a empresa causou à coletividade.

A afirmação foi feita pelo governador Helder Barbalho, durante entrevista à imprensa, após a operação “Para Bellum”, da Polícia Federal (PF), na manhã de ontem (10), que investiga a compra desses equipamentos.

Segundo Helder, essa dívida do governo é decorrente de um “encontro de contas”: a empresa já depositou na Justiça a quase totalidade dos R$ 25,2 milhões que havia recebido pelos respiradores, faltando apenas R$ 2,404 milhões.

Mas o governo só pagou R$ 4,095 milhões (ou seja, a metade) do dinheiro devido pelas 1.600 bombas de infusão que comprou da empresa na mesma época, a um custo total de R$ 8,4 milhões, e que foram todas entregues, e em boas condições de uso.

As bombas de infusão são equipamentos essenciais para o funcionamento de respiradores e todas já se encontram até instaladas, nos leitos de UTI dos hospitais públicos paraenses, destinados aos pacientes da Covid-19.

Os respiradores deveriam custar, no total, R$ 50,4 milhões, mas o Governo só chegou a efetuar também a metade do pagamento.  


As acusações da “Para Bellum”


Na manhã de ontem, a PF realizou a operação “Para Bellum”, que cumpriu mandados de busca e apreensão nas residências do governador e do secretário de Saúde, Alberto Beltrame, entre outros investigados; além das sedes da Casa Civil do Governo e das secretarias de Saúde (Sespa) e da Fazenda (Sefa).

A suspeita é de irregularidades na compra desses equipamentos, através de uma Dispensa de Licitação supostamente forjada, para beneficiar a SKN do Brasil, e de um superfaturamento superior a de 85%.

Entre os indícios estaria o fato de a SKN não possuir registro na Anvisa, para fornecer esses equipamentos; a antecipação de pagamento, com base em um decreto assinado pelo governador, o que não teria previsão legal; e até o fato de Helder ter ido receber pessoalmente os respiradores, quando foram desembarcados no aeroporto de Belém.

A operação foi pedida pela Procuradoria Geral da República (PGR), comandada pelo procurador-geral Augusto Aras, nomeado para o cargo pelo presidente Jair Bolsonaro, e que estaria até no centro de uma rebelião no MPF (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52948926).

A PGR também sustenta que o governador teria uma relação de proximidade com um dos donos da SKN, e que ele sabia que esses equipamentos eram inadequados para o tratamento da Covid-19.

O ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), atendeu aos pedidos da PGR para as buscas e apreensões e o para o bloqueio de R$ 25 milhões em bens do governador e de outros 7 suspeitos das supostas irregularidades.

No entanto, segundo o governador, a empresa já depositou, em uma conta bancária da Justiça do Pará, praticamente todo o dinheiro que recebeu do Governo.

Além disso, na época em que esses equipamentos foram comprados pelo Pará a disputa mundial em torno deles gerou grande aumento de preços.

E foi uma disputa tão intensa que os Estados Unidos chegaram a ser acusados de “pirataria”, já que compravam cargas inteiras de respiradores nas pistas dos aeroportos chineses, à vista e por milhares dólares, quando os aviões se preparavam para levá-los a outros países.


Operações da PF sob suspeita


No último 26 de maio, a PF realizou a Operação Placebo, que teve como alvo o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, por supostas irregularidades na compra de equipamentos e instalação de hospitais de campanha, para os doentes da Covid-19.

Desde então, dizem fontes do Governo do Pará, já era esperada uma ação semelhante contra Helder e outros governadores que decretaram medidas de isolamento social da população, para conter o avanço da Covid-19, apesar das críticas e pressões crescentes de Jair Bolsonaro.

O presidente queria manter as empresas funcionando, já que defendia apenas o isolamento de idosos e doentes, apesar das recomendações em contrário de infectologistas, pesquisadores e da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Desde abril deste ano, a PF passou por várias alterações, determinadas por Bolsonaro, o que levou, inclusive, ao pedido de exoneração do então ministro da Justiça, Sérgio Moro, após a troca do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo.

Para o lugar de Valeixo chegou a ser nomeado o delegado Alexandre Ramagem, chefe da Agência Brasileira de Investigação (ABIN).

Ramagem é amigo pessoal de um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro, do Rio de Janeiro, que é investigado pela PF daquele estado por suspeita de envolvimento na rede de fake news controlada pelo bolsonarismo, entre outros crimes.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) acabou barrando a nomeação de Ramagem.

Mas no lugar dele foi nomeado para a direção da PF o delegado Rolando Alexandre de Souza, que era braço direito de Ramagem na ABIN.

Rolando assumiu o cargo em 4 de maio e, no mesmo dia, trocou o Superintendente da PF no Rio de Janeiro, uma providência que teria sido pedida há meses por Bolsonaro.

E o não-atendimento, na época, seria um dos motivos que levaram à queda de Valeixo e Sérgio Moro

(Aqui: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/2020/05/04/novo-diretor-geral-da-pf-troca-superintendente-no-rio-de-janeiro E aqui: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52467171).

Além do superintendente do Rio de Janeiro, também foram trocadas toda a cúpula da PF e várias outras chefias.

Ao deixar o cargo, o ex-ministro Sérgio Moro acusou Bolsonaro de tentar interferir na PF. Entre outros motivos, para ter acesso a informações sobre investigações em andamento.

No último 25 de maio, na véspera da operação Placebo contra o governador Wilson Witzel, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), uma das mais fiéis apoiadoras de Bolsonaro, teria até antecipado a ação policial.

Durante uma entrevista à Rádio Gaúcha, Zambelli disse que a PF estava prestes a deflagrar operações contra supostos desvios de recursos da Saúde, nos estados

(Aqui: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/26/deputada-zambelli-ligada-a-bolsonaro-antecipou-que-haveria-operacoes-da-pf-sobre-desvios-na-saude-nos-estados.ghtml E aqui: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/06/10/pgr-investigacao-zambelii-pf-vazamento.htm).

Em 27 de maio, o próprio Bolsonaro afirmou que a PF realizaria outras operações desse tipo.

"Vai ter mais, enquanto eu for presidente, vai ter mais. No Brasil todo. Isso não é informação privilegiada não, vão falar que é informação privilegiada", disse ele.

(Leia aqui: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/27/vai-ter-mais-no-brasil-todo-diz-bolsonaro-apos-operacao-da-pf-contra-witzel.ghtml).


“Não houve danos ao erário”


Na entrevista de ontem, Helder lembrou que, além de decretar o isolamento social, no último 16 de março, também passou a buscar maneiras de estruturar a rede de Saúde do Pará, para atender os pacientes dessa doença, o que teria de incluir a ampliação dos leitos de UTI.

Mas o problema, segundo ele, é que não havia respiradores disponíveis no mercado nacional, até porque o Governo Federal havia “confiscado” os poucos existentes. A solução, então, foi procurar no mercado internacional.

Durante essa procura, disse ele, o governo recebeu várias propostas e acabou optando pela SKN, que traria para o Pará respiradores fabricados na China, que é o maior fabricante de produtos médicos do mundo.

Cada respirador oferecido pela SKN ficaria em R$ 126 mil. E, segundo o governador, era um preço bem abaixo dos R$ 170 mil pagos, na época, por esses equipamentos, por grandes grupos empresariais do Brasil.

Ao todo, foram comprados 400 respiradores, por R$ 50,4 milhões.

Além disso, foram compradas 1.600 bombas de infusão, por R$ 8,4 milhões, já que cada respirador precisa de 4 dessas bombas para funcionar.

Segundo o governador, a fabricante chinesa queria até que o Pará pagasse antecipadamente todos os R$ 50,4 milhões.

Mas como o governo se recusou, ela acabou aceitando receber antecipadamente apenas a metade, ou seja, R$ 25,2 milhões.

O problema é que a entrega desses equipamentos começou a se arrastar: eles foram comprados no começo de abril, deveriam estar no Pará no dia 15 daquele mês, mas só chegaram em 4 de maio e, mesmo assim, parcialmente: apenas 152.

Mas a maior surpresa veio quando técnicos do governo tentaram realizar a instalação: foi aí que se descobriu que eram respiradores diferentes do modelo comprado pelo governo e que não serviam para as UTIs destinadas aos pacientes da Covid-19.

Helder disse que logo que foi informado do problema, resolveu agir: primeiro contatou a Embaixada da China e a fabricante dos respiradores, para que ela ou entregasse os equipamentos no modelo adquirido, ou devolvesse o dinheiro.

Como a empresa respondeu que não tinha condições de entregar o produto, o Governo partiu, então, para as medidas judiciais: em 10 de maio (ou apenas 6 dias após a chegada dos equipamentos), ajuizou um processo pedindo o bloqueio dos bens e a retenção dos passaportes dos donos da SKN, para que eles não pudessem fugir do Brasil.

Também negociou com a empresa, na Justiça, a devolução dos R$ 25,2 milhões que ela recebeu.

Desse total, disse o governador, ela já devolveu R$ 22.795.186,00 (milhões), através de depósitos em uma conta bancária da Justiça, e faltam apenas pouco mais de R$ 2,4 milhões.

No entanto, segundo Helder, hoje seria o governo que ainda deveria dinheiro à empresa: como ela entregou a totalidade das bombas de infusão, mas só recebeu a metade do dinheiro (cerca de R$ 4 milhões, de um total de R$ 8 milhões), o Governo ainda teria de lhe pagar R$ 1,580 milhão, já descontadas as multas contratuais.

Só que o governador disse que se recusa a pagar esse R$ 1,580 milhão.

E, na última segunda-feira, pediu à Justiça que todo esse dinheiro seja considerado como indenização da SKN ao Estado, por danos morais coletivos.

“Recebemos (de volta) todos os recursos que pagamos é já estamos é com um crédito de R$ 1,5 milhão, por esses respiradores. Não há dano ao erário. Garantimos o ressarcimento integral”, salientou.

Ele se disse “indignado” com o comportamento dos empresários da SKN e afirmou: “onde é que essas pessoas estavam com a cabeça? Imagine um empresário se aproveitar de uma pandemia e vender um produto não habilitado; vender um produto e entregar outro e achar que ficará impune”.

“Aqui não vão se criar aqueles que imaginam que só porque estamos na Amazônia, no Norte, vão lesar o povo e sair impunes”, disse ainda.  


Sem “rabo preso”


“Se eu tivesse amizade (com os empresários da SKN) ou tivesse o rabo preso, não teria mandado bloquear os bens e reter os passaportes deles”, afirmou o governador, ao responder a perguntas de jornalistas sobre as acusações de que seria “amigo” de um dos donos da empresa, André Felipe Oliveira Silva.

“Não tenho amizade alguma com qualquer empresário que possa ter participado disso”, afirmou também.

Ele lembrou que a Polícia Civil abriu inquérito para investigar o caso e que o Governo do Estado agiu rapidamente, para evitar prejuízos aos cofres públicos e à população.

“Foi o Governo do Pará que foi pra cima dessa empresa, além de conseguir o ressarcimento do dinheiro que havia sido pago”, destacou.

Sobre os motivos que o levaram a efetuar essas compras sem licitação, o governador lembrou que essa possibilidade está prevista na Medida Provisória 961, de autoria do próprio presidente Bolsonaro, justamente para agilizar a aquisição e pagamento de equipamentos e outros produtos de Saúde, durante o estado de calamidade pública provocado pela pandemia.

Disse, também, que as mensagens que trocou com um dos donos da SKN (e que a PF e a PGR apontam como indício da “proximidade” entre ele e o governador) foram justamente para cobrar da empresa a entrega desses respiradores.

Ele também rebateu com uma pergunta a acusação de que a sua ida ao aeroporto, para receber aqueles 152 respiradores, seria um “indício” de seu envolvimento nas supostas irregularidades: “Se eu soubesse que aqueles produtos eram inadequados, teria ido ao aeroporto para recebê-los?”


“Mandei exonerar imediatamente”


Helder também informou que mandou “exonerar imediatamente” o secretário adjunto de Gestão Administrativa da Sespa, Peter Cassol, em cuja residência a PF encontrou R$ 700 mil em dinheiro, na manhã de ontem, durante a “Para Bellum”.

Helder disse ter ficado surpreso com o fato e que considera “atípico um servidor público ter em seu poder um valor dessa magnitude”.

Daí a perda de confiança do governo em Cassol e a sua exoneração.

Respondendo à pergunta de um jornalista, o governador disse também não ter ideia sobre a possível origem desse dinheiro.

“É absolutamente inexplicável. E cabe a ele (Cassol) dar satisfação à sociedade e à Justiça. Mas não permitirei que um servidor que mantenha esse valor continue no governo”, afiançou.


Politicagem com a pandemia


Apesar das perguntas de jornalistas, Helder disse que não entraria na discussão acerca de eventuais motivações políticas da operação da PF.

A seu ver, o mais importante é prestar contas à população sobre a compra desses equipamentos.

No entanto, observou: “eu não vou entrar na discussão política. Enquanto tem politicagem neste assunto, tem gente morrendo, em todo o Brasil”.

“Eu não entendo ser razoável, com tanta gente sofrendo, perdendo a vida, fazer política com a pandemia”, disse ainda, em outro momento.

Ele também evitou críticas à PGR e ao ministro Francisco Falcão, do STJ.

“Respeito a decisão do ministro do STJ e da PGR; não cabe a mim desqualificar, opinar se a operação perdeu ou não a razoabilidade, já que o governo recebeu integralmente o valor”, disse apenas.


Sem ações do governo, mortes seriam maiores


Ao longo da entrevista, que durou cerca de uma hora e foi realizada via internet, Helder ressaltou, por diversas vezes, que o governo agiu rápido e que não houve qualquer prejuízo ao erário.

Ele também enfatizou as medidas contra a Covid-19 e no tratamento dos doentes.

Lembrou que, em poucos meses, o Governo conseguiu criar 1.212 leitos clínicos e 612 leitos de UTI, para os pacientes dessa doença.

Também criou hospitais de campanha, em Belém, Santarém, Breves e Marabá, além de firmar convênios com municípios, para ampliar a rede hospitalar em todo o estado.

Para ele, as ações do governo “foram decisivas”, para diminuir a situação dramática vivida pela população.

Foi com esse objetivo, segundo ele, que o Governo também abriu o Hospital Abelardo Santos à toda a população, e lá já realizou mais de 70 mil atendimentos; além de passar a atender esses doentes também com a Policlínica, que já contabiliza mais de 50 mil atendimentos.

“Se não tivesse havido o isolamento e o governo não tivesse viabilizado leitos clínicos e de UTI teríamos tido muito mais perdas do que aquelas que tivemos”, disse o governador.

Ele lembrou que há “muitos caminhos” nessa pandemia: “posso negá-la, ou me omitir, fechando prontos socorros, UPAs e deixando o povo morrer”.

Mas que a sua escolha foi outra: “foi cuidar das pessoas, diminuir o sofrimento das pessoas, essa foi a opção que adotei. Se não tivesse o Abelardo, a Policlínica, os hospitais de campanha; se hoje é sofrido, nos dói a quantidade de gente que perdeu a vida, imagine se não tivéssemos feito o que fizemos”.

Hoje, disse ele, a ocupação dos leitos clínicos para os pacientes da Covid-19 é de 51,6% e, os de UTI, de 70%.

Um quadro bem diferente dos tempos de sufoco, quando todos os hospitais de Belém, públicos e privados, estavam superlotados.

“Não só acabamos com a fila de pacientes, como hoje passamos a ter até uma reserva de leitos”, comemorou.

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