O presidente Jair
Bolsonaro mandou e o ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello,
liberou, hoje (20/05), o uso da hidroxicloroquina para tratamento da Covid-19 nas fases iniciais da doença.
Até então, o
medicamento só podia ser usado, na rede pública de saúde, em pacientes internados,
em estado grave.
Nem Bolsonaro nem
Pazuello são médicos e nenhum médico assinou o novo protocolo do Ministério da
Saúde, diz o jornal O Globo.
Para usar o remédio,
o paciente terá de assinar um documento dizendo que sabe que não há garantia de
que ele funcione e que há o risco de graves efeitos colaterais, como incapacidade
temporária ou permanente, e até morte.
Esse termo de
consentimento terá de ser assinado também pelo médico que receitou.
Mas, na prática,
transfere para a possível vítima (o doente) a responsabilidade por tudo o que
de ruim vier a lhe acontecer.
Um fato ainda mais assustador
quando se leva em conta que os pacientes do sistema público de saúde são, na
maioria, pessoas pobres, de baixo nível educacional e pouquíssimo acesso à
informação.
E que, ainda por cima,
estão desesperadas, com medo dessa doença.
Leia mais aqui: https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,ministerio-da-saude-libera-cloroquina-para-todos-pacientes-de-covid-19,70003308705
Rede de
fake news induz população a usar em massa o medicamento
A liberação da hidroxicloroquina
pelo governo de Bolsonaro foi antecedida por dias de intensa atividade da rede
de notícias falsas (fake news), controlada pelos bolsonaristas.
Na foto que abre esta
postagem, você vê essa rede espalhando um boato de “cura” da Covid-19, através
de um coquetel de remédios à base de azitromicina (AZT), hidroxicloroquina
(HCQ) e zinco.
Durante a pandemia de Covid-19, já foram várias as mentiras espalhadas no Facebook, Twitter, Youtube e WhatsApp
por essa rede, para fazer com que a população não acreditasse no perigo da
Covid-19 e voltasse a trabalhar.
Agora, a rede tenta
fazer com que a população use em massa a hidroxicloroquina, um remédio que pode
causar problemas de audição, visão, danos no fígado e nos rins, e alterações no
ritmo das batidas do coração (as chamadas arritmias cardíacas), que podem até levar
à morte.
Tão ou mais grave é que
NÃO há comprovação de que a hidroxicloroquina funcione contra a Covid-19.
Pelo contrário: a maior
e mais recente pesquisa, realizada com mais de 1.400 pacientes dos hospitais do
estado de Nova York, nos Estados Unidos, concluiu que esse remédio NÃO evita
que as pessoas morram por causa da Covid-19, e ainda pode causar problemas no
coração.
Leia aqui
(a notícia é de 11 de maio): https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/05/11/cloroquina-nao-evita-mortes-por-covid-19-e-pode-afetar-coracao-diz-estudo.htm
E aqui (a notícia é de 15 de maio): https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2020/05/15/lupa-na-ciencia-cloroquina-novos-estudos/
Na Suécia, hospitais
pararam de usar esse remédio, devido às arritmias cardíacas e problemas de
visão que teria causado nos pacientes.
Leia aqui
(a notícia é de 10 de abril) : https://epoca.globo.com/mundo/hospitais-da-suecia-suspendem-uso-de-cloroquina-em-pacientes-com-coronavirus-devido-efeitos-colaterais-1-24364183
A Agência de Saúde Pública do Canadá e a FDA, a
agência reguladora de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos, chegaram a emitir
alertas sobre os riscos da hidroxicloroquina na prevenção ou tratamento da
Covid-19.
Leia aqui. A notícia é de 26 de abril: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2020/04/26/interna_ciencia_saude,848561/canada-alerta-sobre-riscos-da-cloroquina-e-da-hidroxicloroquina.shtml
Em Manaus, um estudo sobre esse remédio teve de ser
interrompido depois da morte de 11 pacientes.
Leia no site da Deutsche Welle, emissora
internacional da Alemanha. A notícia é de 14 de abril: https://www.dw.com/pt-br/estudo-sobre-cloroquina-no-brasil-%C3%A9-cancelado-ap%C3%B3s-morte-de-pacientes/a-53122089
Ontem, 19/05, Marcos Espinal, que é diretor do
Departamento de Doenças Transmissíveis da Organização Pan-Americana da Saúde
(Opas), braço regional da Organização Mundial de Saúde (OMS), disse que a Opas
NÃO recomenda o uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 e que NÃO há
evidência científica de que ela funcione contra essa doença. Ele também ressaltou
os seus efeitos colaterais, principalmente os problemas cardíacos.
Objetivo é acabar com o isolamento social
Então, por que a insistência de Bolsonaro em liberar a hidroxicloroquina?
Na minha opinião, o que ele quer é que a população
acredite que pode voltar a trabalhar porque “já existe” um remédio para a
Covid-19.
O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, também
acredita que seja essa a motivação do presidente.
Leia as declarações dele, no último dia
15: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2020/05/15/mandetta-bolsonaro-quer-cloroquina-para-conseguir-reabrir-a-economia.htm
Ou seja, trata-se de mais uma tentativa de
Bolsonaro de sabotar o isolamento e o distanciamento sociais, as únicas medidas
eficazes para conter o avanço do novo coronavírus, mas que ele se recusa a
aceitar.
Penso também que a hidroxicloroquina continua a ser
receitada contra a Covid-19, por médicos do Brasil e de outros países, devido à
pressão da população, que, apesar de todas as pesquisas científicas, prefere acreditar
nas declarações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Interesses bilionários e financiamento eleitoral
Foi Trump o primeiro a anunciar o tal “milagre” da hidroxicloroquina,
em março último.
No entanto, o seu entusiasmo não teria motivações humanitárias,
mas sim financeiras, pessoais e partidárias.
Segundo o jornal New York Times e a revista Forbes,
dois dos maiores veículos de comunicação dos Estados Unidos, o bilionário Ken
Fisher, que é um dos principais doadores das campanhas eleitorais de Trump e do
partido dele, é também um dos maiores acionistas da Sanofi, empresa que
produz o Plaquenil, um dos medicamentos à base de hidroxicloroquina.
O próprio Trump é um pequeno acionista da Sanofi. E o
secretário de Comércio do governo dele foi administrador de um fundo que investiu
na empresa.
Leia a notícia de 7 de abril, do site da
revista Forbes: https://forbes.com.br/negocios/2020/04/trump-tem-pequena-ligacao-com-farmaceutica-francesa-que-produz-hidroxicloroquina/
E no site da Opera Mundi, o link para a reportagem
(em inglês) do New York Times: https://operamundi.uol.com.br/permalink/64012
Outros gigantes da indústria farmacêutica, como a Novartis,
Teva e Bayer também devem lucrar com a hidroxicloroquina.
As três, aliás, seriam membros da Pharmaceutical
Research and Manufacturers of America (PhRMA), uma das financiadoras do Job
Creators Network, que é um grupo de apoio ao presidente Donald Trump, fundado pelo
bilionário Bernard Marcus, que, além de doador das campanhas eleitorais do
partido de Trump, já teria prometido que gastará parte de sua fortuna para
reeleger o presidente norte-americano.
Leia no site do jornal português Diário de
Notícias, a matéria publicada em 7 de abril: https://www.dn.pt/mundo/por-que-insiste-trump-no-tratamento-com-hidroxicloroquina-12042840.html
No jornal O Estado de São Paulo, também em matéria de
7 de abril, há informações de que outras indústrias farmacêuticas, que fabricam
medicamentos genéricos, se preparam para produzir pílulas de hidroxicloroquina.
Uma delas é a Amneal Pharmaceuticals, que tem como co-fundador
Chirag Patel, membro do Trump National Golf Course Bedminster, um clube de
golfe criado por Trump.
No entanto, até mesmo a Sanofi, que produz o Plaquinol
(aparentemente, o nome brasileiro do Plaquenil) admitiu em uma nota publicada
em seu site, em 26 de março, que não há evidência científica de que a
hidroxicloroquina seja eficaz contra a Covid-19.
“Até o momento,
não existem evidências clínicas suficientes para tirar conclusões sobre a
eficácia ou segurança clínica da hidroxicloroquina (ou cloroquina) no
tratamento da COVID-19. Os resultados preliminares de diferentes estudos independentes
requerem análises adicionais e estudos clínicos mais robustos e amplos para
avaliar o perfil de riscos e benefícios do Plaquinol para o paciente com
COVID-19”, diz a nota.
E você aí pensando que esses “causos” só acontecem no
Brasil...
Um coquetel de Trump, Bolsonaro e Nicolás
Maduro. É mole ou quer mais?
Com o avanço das pesquisas mostrando a ineficácia e os
riscos da hidroxicloroquina, Trump deu uma pausa na defesa do medicamento.
Aparentemente, só Bolsonaro e, ironicamente, o
presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, continuavam a defender o tal “milagre”.
Leia a reportagem, de 16 de maio, da
revista Carta Capital: https://www.cartacapital.com.br/politica/nem-trump-fala-mais-da-cloroquina-por-que-bolsonaro-insiste-nela/
No entanto, no último dia 18, Trump voltou a defender
a hidroxicloroquina e disse até que está a usá-la para prevenir a Covid-19,
apesar das recomendações em contrário dos órgãos de saúde de seu próprio governo.
Leia na reportagem da BBC do Brasil: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52717323
A pressão popular, as fake news e os fatos
A propaganda da hidroxicloroquina por Trump levou, ainda
em março, a uma corrida às farmácias em busca desse medicamento, em vários países
do mundo, inclusive no Brasil.
Além disso, criou uma pressão popular sobre os médicos
e autoridades de saúde, um problema agravado, no Brasil, pela rede de fake news
do bolsonarismo e pelos pronunciamentos de Bolsonaro.
Mas o FATO, sem fake news, pressão popular ou disputas
políticas, é que a hidroxicloroquina só tem eficácia comprovada contra outras
doenças (como é caso da artrite
reumatoide), todas muito diferentes da Covid-19.
E mesmo nas doenças em que tem efeito comprovado, esse
remédio tem de ser usado com acompanhamento médico e exames periódicos.
Além disso, até medicamentos aparentemente “banais” como
AAS, Melhoral e Aspirina, usados rotineiramente pela população para dor e
febre, podem ter resultados desastrosos em pessoas que tenham doenças como a
dengue, por exemplo, já que aumentam o risco de hemorragia.
Vou deixar abaixo outros links, caso você queira mais
informações.
E aí, caro leitor, você
decide se acredita nas pesquisas científicas realizadas em vários países, ou se
prefere acreditar em uma rede de notícias falsas e no Bolsonaro, um ex-capitão
do Exército que não entende patavina nem de governo nem de Medicina.
FUUUIIIIII!!!!!
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Aqui, uma reportagem, de 29 de abril, sobre
o “estudo” da empresa Prevent Senior, que bolsonaristas espalham, nas redes
sociais, como “prova” de eficácia da hidroxicloroquina contra a Covid-19, no
começo da doença:
Aqui, uma reportagem da revista Carta
Capital, de 17 de maio, mostrando que os hospitais da Prevent Senior, em São
Paulo, também estão lotados, apesar dos resultados do tal “estudo”: https://www.cartacapital.com.br/saude/exemplo-de-sucesso-da-cloroquina-prevent-senior-tem-utis-no-limite/?fbclid=IwAR2JAR8bjhDf2yj1LBQPJMZxagzwYYw0fEFHEK1BB61QGbmeZzz7cRbq9IY
Aqui, reportagem da RFI (Rádio França
Internacional), de 22 de abril, sobre uma pesquisa, em hospitais para
ex-combatentes de guerra norte-americanos, que não encontrou evidência da
eficácia da hidroxicloroquina contra a Covid-19 e ainda detectou maior taxa de
mortalidade entre os que tomaram o remédio: http://www.rfi.fr/br/am%C3%A9ricas/20200422-veteranos-americanos-que-tomaram-hidroxicloroquina-contra-covid-19-tiveram-alta-taxa-de-mortalidade-diz-estudo
Aqui, o Parecer do Conselho Federal de
Medicina (CFM), que permitiu, em abril, que os médicos prescrevessem esse
medicamento contra a Covid-19, mas tendo de alertar sobre os seus possíveis
efeitos colaterais e sobre o fato de que não há comprovação de eficácia desse
remédio contra essa doença, além de obterem uma declaração de consentimento do
paciente. https://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=28672:2020-04-23-13-08-36&catid=3
Aqui, Nota
da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) também dizendo que, até aquela
data, 9 de abril, não havia evidência científica suficiente sobre a eficácia
desse remédio contra a Covid-19 e até citando a publicação do British Medical
Journal sobre os riscos da hidroxicloroquina, devido aos seus efeitos
colaterais: https://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2020/04/09/unicamp-divulga-nota-sobre-uso-de-cloroquina-e-hidroxicloroquina
Aqui, uma boa reportagem do site The
Intercept, de Jornalismo Investigativo, datada de 8 de maio, que desmente,
inclusive, a fake news divulgada até por Donald Trump de que portadores de
lúpus não estariam contraindo a Covid-19 porque tomam hidroxicloroquina: https://theintercept.com/2020/04/08/tratamento-hidroxicloroquina-covid-19-coronavirus-trump-bolsonaro/
Aqui, uma boa reportagem da Pública,
Agência de Jornalismo Investigativo, datada de 13 de abril, sobre o uso desse
medicamento contra a Covid-19: https://apublica.org/2020/04/a-cloroquina-nao-e-a-bala-de-prata-que-o-bolsonaro-diz/
Aqui, a ministra Damares Alves tentando
convencer a população sobre a “cura milagrosa” da Covid-19 através da
hidroxicloroquina, também tendo por base uma fake news: a de que um hospital do
Piauí teria “zerado” a UTI usando esse remédio. A notícia, do site Viomundo, do
jornalista Luiz Carlos Azenha, é de 15 de maio : https://www.viomundo.com.br/politica/agencias-da-uniao-europeia-e-dos-eua-advertem-sobre-mortes-causadas-por-cloroquina-mas-deputada-evangelica-receita-e-damares-diz-que-viu-milagre-video.html?fbclid=IwAR1e8eT0fFEwisLyuZT489Tr4SsTY8-GawxBhUF0HmjxlfS6k-lSIzbspcE
Aqui, o desmentido de outra fake news do
bolsonarismo: a de que médicos de 30 países confirmam a eficácia da
hidroxicloroquina. A informação da Agência Lupa é de 16 de abril. Mesmo assim,
a fake news continua a circular com força nas redes sociais e nos sites que
produzem as notícias falsas dessa rede. Leia aqui: https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2020/04/16/verificamos-medicos-30-paises-eficacia-cloroquina/
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