quinta-feira, 5 de abril de 2018

O ovo da serpente (1)




Ninguém se iluda: se essa turba conseguir passar por cima da liderança de Lula, babau. 

O que os manipuladores da turba pretendem não é apenas impedir a candidatura de Lula, coisa que, aliás, já está garantida, com a condenação dele em segunda instância. 

O que se pretende, em verdade, é neutralizá-lo; é remover o grande obstáculo popular a uma ditadura fascista. 

E o preocupante é que os nossos partidos políticos, as nossas lideranças políticas, parecem ainda não ter percebido a extensão do que está em marcha. 

É verdade: o alvo agora é o PT. Mas todos os partidos democráticos serão destruídos. 

Depois do PT, o PMDB. Depois do PMDB, o PSDB. E assim sucessivamente, até que não sobre nenhum. 

A estratégia é velha, mas nem por isso menos inteligente: o alvo foi fatiado, dividido, para que essa gente possa reinar. 

Eu não faria diferente, nem você, simplesmente porque não há como arremeter contra todos esses grandes partidos ao mesmo tempo e sair vitorioso. 

A prisão de Lula é, portanto, estratégica nesse jogo. Além de desgastá-lo aos olhos públicos e tentar amedrontar os que ousem defendê-lo, vai retirá-lo das ruas, enfraquecendo a sua possibilidade de ação. 

A prisão também acontece em um momento propício, já que os partidos se engalfinham, devido à campanha eleitoral. 

E, também, em um momento em que o maior partido nacional, o PMDB, o grande centro político do Brasil, mostra-se ainda seduzido por ocupar a Presidência da República. E, até quem sabe, seduzido pela possibilidade de comandar uma “centralização do poder”, ainda que jogando no lixo o próprio nome e história. 

E acontece, ainda, enquanto o PSDB continua a acreditar na possibilidade de reconquistar o poder, com a ajuda dessa turba. 

Mas que ninguém se iluda: o futuro que se desenha a nossa frente não é o de um simples governo constitucional de direita, o que de qualquer forma significaria alguma liberdade democrática. 

É, na verdade, um regime fascista, fora da lei, com a supressão de direitos fundamentais dos cidadãos. Com mais e mais prisões ilegais; mais e mais assassinatos de lideranças políticas e toda a sorte de violências. 

E para essa grande festa do fascismo, sinto informar, nem PMDB nem PSDB estão convidados. Ambos cairão, da mesma forma que o PT. É apenas uma questão de tempo. 

Então, é preciso que as nossas lideranças políticas acordem, urgentemente, para a necessidade de uma ampla frente democrática contra o fascismo. 

Uma frente que não seja apenas das esquerdas, com meia dúzia de gatos pingados. 

Mas uma frente – da esquerda à direita – que reúna todos os cidadãos que possuam um apreço mínimo que seja pela Democracia; todos os cidadãos que já tenham despertado para o perigo que ronda este país. 

A hora é de somar forças contra um, e apenas um inimigo: a ascensão do fascismo. 


O ovo da serpente (2) 

Além da estratégia, também o discurso dos manipuladores dessa turba é velho. E além de velho, é fácil, mas nem por isso menos eficaz: nenhum político presta, nenhum partido presta, todos são bandidos. 

E como “bandido bom é bandido morto”, que sejam arrastados pelas ruas e lançados em calabouços os mais infectos possíveis, para que mofem, se possível, até o fim da vida. 

Tenho um amigo que, quando falávamos nisso, lembrou-me da Revolução Francesa. 

E aí, eu disse a ele: “não, meu amigo, não dê todo esse Ibope a essa gente”. 

Porque a comparação mais adequada para essa turba é com as multidões medievais, daquelas domingueiras com “churrasquinho de gente” da Santa Inquisição. 

Quase não há “sans-culottes” nessa turba, a não ser para o trabalho braçal de balançar bandeiras e executar coreografias chinfrins. 

E o discurso que seguem é apenas catártico, e não socialmente transformador, evolutivo. 

O bode expiatório da política (com seus partidos e agentes políticos) como que lhes infunde uma espécie de “elevação moral”. 

Mas sem que tenham de pensar sobre o porquê de a corrupção alcançar, desde sempre, níveis assustadores no Brasil. 

No fundo, é um distanciamento, para que se possa manter uma pseudoinocência: “não, eu não sei de onde surgiram esses políticos. Eles simplesmente apareceram aí”. 

Como se os políticos, bons e maus, não tivessem sido eleitos, inclusive pelos integrantes dessa turba, e não espelhassem os anseios e comportamentos da sociedade brasileira. 

Muitos deles são desonestos? E o que dizer da sociedade brasileira, com as suas propinas, assédios, nepotismo e outras infrações legais cotidianas? 

É verdade: temos que melhorar a qualidade dos nossos políticos e do próprio sistema eleitoral. 

Temos que apertar as condições de elegibilidade e de permanência na vida pública. 

Temos, sim, que ter maior rigor com as campanhas eleitorais e com aqueles que nos representam. 

Mas enquanto considerarmos a nossa corrupção mais “santa”, mais justificável que a do outro; enquanto colocarmos os nossos interesses individuais acima dos interesses coletivos, lá, no segredo da urna, continuaremos a eleger cidadãos praticamente idênticos a esses que temos hoje. 

Nenhum de nós é “inocente” nessa história. Todos erramos, quer por ação ou omissão. 

E isso vale, também, para todas as nossas instituições, como é o caso do nosso Judiciário. 


O ovo da serpente (3) 

Os manipuladores da turba dizem defender a República. 

Mas isso é, no mínimo, uma contradição: quem, em verdade, defende a República, respeita as suas leis e ama a sua Constituição. 

E se ninguém, em uma República, está acima da Lei, também não está abaixo dela. 

Há muito tempo, aliás, até já escrevi aqui: não é arrastando os ricos e poderosos pelas ruas, para igualá-los à massa de brasileiros sem acesso à Justiça, que iremos melhorar este país. 

Temos é que inverter o raciocínio: o que é preciso é garantir que todos os cidadãos, por mais pobres que sejam, tenham acesso à Justiça e tenham preservada a sua dignidade contra as multidões. 

Isso, sim, é que é republicanismo. 

E o interessante é que os porta-vozes dessa turba, que dizem defender a “igualdade” de tratamento no judiciário, com a prisão de qualquer jeito das nossas lideranças políticas, são os mesmíssimos que não estão nem aí para as condições subumanas das nossas penitenciárias, e para a enorme quantidade de presos que nunca foram nem sequer julgados. 

Esses cidadãos foram simplesmente jogados lá, nesses presídios, para que apodreçam. E essas pessoas, tão “preocupadas” com a “igualdade” de tratamento legal, nunca disseram nem mesmo um ai. 

Então, não é o republicanismo que move essas pessoas. Não é nem mesmo uma sensibilidade em relação à massa pobre e desprotegida, sem acesso à Saúde, Educação e Segurança, devido à corrupção, como disse o ministro Luís Carlos Barroso. 

Isso é pura propaganda política, para tentar capturar mais e mais incautos. 

Além, é claro, de pitadas de canalhice: o uso de objetivos nobres, para se isentar de responsabilidade pela impunidade que sempre grassou neste país. 

O povo brasileiro precisa ser alertado para os reais objetivos desses messias. E precisa compreender, sobretudo, o seguinte: uma República que pretende se “refundar” no ódio e na intolerância, a pisotear direitos elementares do ser humano, não é, com certeza, um bom sinal.

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