Em campanhas eleitorais, o economista e governador
do Pará, Simão Jatene, cansou de afirmar que teve até de tocar na noite de
Belém (ele é músico), para se sustentar e pagar seus estudos. E em 2014, ao se
candidatar pela terceira vez ao Governo do Estado e depois de uma vida inteira
como político, funcionário público e professor universitário, Jatene declarou
ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um patrimônio de R$ 3,2 milhões.
Melhor sorte teve, porém, o advogado Alberto
Lima da Silva Jatene, o “Beto Jatene”, filho do governador. Com apenas 41 anos
de idade, Beto é um homem muito, mas muito rico. Tanto assim que, no segundo
semestre do ano passado, ele realizou duas impressionantes movimentações
financeiras, que totalizaram R$ 13 milhões, em pagamentos à BB Corretora de
Seguros e Administradora de Bens S.A.
O fato está documentado em um relatório do
Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), do Ministério da
Fazenda, ao qual a Perereca e o
jornal Diário do Pará tiveram acesso, e que você vê parcialmente reproduzido no
quadrinho que abre esta reportagem.
De onde veio tanto dinheiro ninguém sabe.
Afinal, Beto não é de família rica, só atuou em três processos como advogado e
desde o ano 2000 trabalha, basicamente, como assessor em órgãos públicos
estaduais. Hoje, ele ganha R$ 19,6 mil líquidos por mês.
Para azar dele, a movimentação desses R$
13 milhões, em um espaço de tempo inferior a um mês, acabou por chamar a
atenção das autoridades financeiras nacionais, já que pode ser um indício de lavagem
de dinheiro, até pelos rolos em que ele e o pai-governador estão envolvidos.
Em fevereiro do ano passado, Beto foi
indiciado pela Polícia Federal por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e
participação em organização criminosa, porque teria recebido propina de uma suposta
quadrilha que desviava royalties da mineração, e que foi desarticulada pela
Operação Timóteo, em dezembro de 2016, quando ele chegou até a ser preso.
Ele também é processado pelo Ministério
Público Estadual, devido ao escândalo do Betocard: o abastecimento de viaturas
da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros em postos de gasolina dele, apesar
de ser filho do governador.
Já o tucano Simão Jatene, é suspeito de
corrupção passiva, no Caso Cerpasa, e teve o mandato cassado, no ano passado,
pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE), por compra de votos na eleição de 2014.
Tais acusações, contra o governador e seu
filho são mencionadas, aliás, no relatório do COAF, cujas cópias já se
encontrariam em poder dos ministérios públicos Federal e Estadual, da Receita e
da Polícia Federal.
No entanto, as assessorias de Comunicação da
Receita, PF e MPF disseram não ter informações sobre o caso. Mas admitiram que
não têm acesso a apurações eventualmente sigilosas. Já no MPE, a Perereca procurou um dos integrantes
que processa Beto Jatene, no escândalo do Betocard, mas ele se negou a comentar
o assunto.
“Características
peculiares” que podem indicar lavagem de dinheiro
Como você pode ver no quadrinho acima, o
primeiro pagamento de Beto Jatene à BB Corretora de Seguros, no valor de R$ 1
milhão, ocorreu no dia 25/07/2017. Já o segundo pagamento, no valor de R$ 12
milhões, ocorreu no dia 10/08/2017.
Ambos esbarraram na Resolução 445/2012 da
Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), que dispõe sobre os controles
internos das operadoras do setor, para a prevenção dos crimes de lavagem ou
ocultação de bens e dinheiro.
A Resolução prevê o acompanhamento das
movimentações financeiras das chamadas “pessoas expostas” (agentes públicos que
ocupam altos cargos, como é o caso dos governadores) e de seus parentes em
primeiro grau.
O primeiro pagamento, de R$ 1 milhão, atingiu
o limite mensal, para aportes ou pagamento único de planos de previdência
privada ou títulos de capitalização.
Já o segundo, de R$ 12 milhões em um único
dia, lembrou aos responsáveis pela vigilância o artigo 13-II-h, da Resolução
445 da Susep: as transações “cujas características peculiares, principalmente
no que se refere às partes envolvidas, valores, forma de realização,
instrumentos utilizados, ou pela falta de fundamento econômico ou legal” podem
caracterizar indício de lavagem de dinheiro ou outras ilegalidades.
Daí as seguintes informações adicionais no
relatório do COAF, que você também pode ler no quadrinho acima: “Participante (Beto Jatene) indiciado por corrupção
ativa, crime contra a Administração Pública, formação de quadrilha, fraude,
lavagem de dinheiro e organização criminosa, no âmbito da Operação Timóteo.
Filho de seu PEP (pessoa exposta)
principal, Simão Jatene, denunciado pelo MP-PA por corrupção ativa e passiva,
crime eleitoral, crime contra a Administração Pública e falsidade ideológica”.
A quadrilha desbaratada pela Operação
Timóteo teria desviado R$ 65 milhões em royalties da mineração.
Segundo a PF, Beto Jatene teria recebido
R$ 750 mil, em troca de “vantagens” ou “facilidades” a essa organização
criminosa.
De onde veio o dinheiro?
Em fevereiro deste ano, diz o portal da
Transparência, Beto Jatene recebeu R$19.643,65 líquidos, como assessor do Ministério
Público de Contas junto ao Tribunal de Contas dos Municípios do Pará (MPC/TCM).
Já a mulher dele, Luciana Lopes Labad
Jatene, recebe R$ 13.586,44 líquidos, como coordenadora do Gabinete do
desembargador Milton Nobre, no Tribunal de Justiça do Estado (TJE).
Veja nos quadrinhos abaixo:
Isso significa que o casal ganha R$
33.230,09 líquidos por mês, ou R$ 431.991,17 por ano, já incluído o décimo
terceiro.
Beto e Luciana estão casados há, no
máximo, 15 anos e têm pelo menos duas filhas.
Mas ainda que conseguissem guardar tudo o
que recebem hoje, sem gastar nem mesmo um centavo, teriam de trabalhar quase 31
anos para juntar os R$ 13 milhões que ele usou para o pagamento, à vista, da BB
Corretora de Seguros.
O pior é que esses R$ 13 milhões são
apenas uma parte do enorme patrimônio de Beto Jatene, que ninguém sabe dizer de
onde veio e cujo tamanho real ainda se desconhece.
Ele se formou em Direito em 2003. Mas uma
busca nos sites do Tribunal Regional Federal da 1 Região e no Tribunal de
Justiça do Estado revela que atuou como advogado em apenas 3 processos, dos
quais só um foi realmente significativo: ele ganhou R$ 4 milhões em honorários
de êxito. Nos outros dois, ainda em tramitação, os valores das causas somam
apenas R$ 90 mil.
Na verdade, Beto Jatene sempre foi,
basicamente, assessor em órgãos públicos: desde o ano 2000, trabalhou na ARCON,
a agência estadual de regulação de serviços públicos; nos tribunais de Justiça
do Estado (TJE), de Contas do Estado (TCE), de Contas dos Municípios (TCM) e no
MP de Contas.
No entanto, ele possui pelo menos três
postos de combustíveis: o Girassol (CNPJ: 01.087.686/0001-62), o Umarizal
(CNPJ: 14.082.648/0001-69) e o Capital (CNPJ: 26.626.875/0001-97).
O Girassol, que fica na Augusto Montenegro
e foi comprado em 2011, pertence a ele e a mais dois sócios: Nélio Pontes Murta
Filho e Eduardo Simões Araújo (que foi assessor especial do governador até
outubro do ano passado). Veja no quadrinho:
No Umarizal, que fica na Jerônimo Pimentel
e foi comprado em março de 2007, ele tem como sócios Nélio Pontes Murta Filho e
Ricardo Augusto Garcia de Souza, que é marido de Izabela Jatene, a outra filha
do governador, e assessor no TCM. Veja no quadrinho:
Ainda não se sabe quando Beto comprou o
posto Capital, que fica na rodovia Arthur Bernandes, km 04, e foi aberto em
novembro de 2016. Mas, diz a Receita Federal, ele pertence a Beto, a João
Carlos Eizo Harada e a Ricardo Augusto, o marido de Izabela. Veja no quadrinho:
Até o final de 2016, o trio também era
dono do posto Verdão (CNPJ: 03.143.587/0001-86), que hoje, porém, está em nome
de um certo Renan Uliana Baena.
O Verdão, que fica na Doutor Freitas e
está no centro do escândalo do Betocard, havia sido adquirido por Beto, Eduardo
Simões Araújo e Ricardo Antonio Miranda em junho de 2006.
Teria custado apenas R$ 25 mil, apesar de
ter alcançado uma receita líquida de R$ 7,9 milhões naquele ano, segundo o
balanço contábil registrado na Junta Comercial do Pará (Jucepa).
Aliás, segundo Beto, as quotas de capital
do Verdão, Girassol e Umarizal ficaram em apenas R$ 155 mil.
Mas um levantamento da Perereca e do Diário do Pará, em 2014,
mostrou que postos de combustíveis eram vendidos, em Belém, a preços que iam de
R$ 3 milhões a R$ 5 milhões.
Mais documentos e informações sobre os
postos de Beto Jatene na reportagem “Fortuna da família do governador Simão
Jatene pode chegar a mais de R$ 40 milhões. Postos de gasolina de Beto Jatene
faturam 21,6 milhões por ano e valem pelo menos R$ 15 milhões”: http://pererecadavizinha.blogspot.com.br/2014/10/fortuna-da-familia-do-governador-simao.html
Um enrolado “Rei da noite”
O filho do governador Jatene também foi
(ou ainda é) dono de bares e casas noturnas, em Belém, embora não existam
registros disso na Jucepa e na Receita Federal.
O mais conhecido foi o bar Ventura, que
ficava na Almirante Wandenkolk, 727.
Em 5 de dezembro de 2010, em entrevista à
Revista Troppo, o advogado Paulo Sérgio Mota Pereira Filho contou que era sócio
de Beto (que é primo dele) e de Ricardo Souza (o marido de Izabela), em um
concorrido bar de Belém, aberto, então, há três anos e com filial no bairro do
Marco. Veja no quadrinho:
Na Receita Federal, o bar Ventura estava
em nome da empresa Paulo S M Pereira Filho Bar e Restaurante –EPP (CNPJ:
09.165.733/0001-50). Ele foi aberto em setembro de 2007 e possuía uma filial no
bairro do Marco. A denominação da empresa (que é individual) também coincide
com o nome de Paulo. Veja no quadrinho:
Depois, o Ventura teria sido transferido
para uma rede de casas noturnas que inclui os bares Baronesa, Maricotinha,
Favela Chic, Boteco Modesto e Cortiço Pub.
A rede pertenceria ao empresário Albert
Farid Soares Labad, que é sogro de Beto Jatene, e à decoradora Milene do
Socorro Fonseca Franco, que foi administradora da Manufatura Exportação
Indústria e Comércio de Roupas e Acessórios Ltda (CNPJ: 08.091.497/0001-02),
quando a empresa pertencia a Izabela Jatene e à mãe dela.
No processo 0001257-63.2017.5.08.0019, do
Tribunal Regional do Trabalho da 8 Região, a juíza Karla Martins Frota diz, na
sentença, que os autos comprovam que Albert Farid foi sócio de fato desses estabelecimentos,
dos quais sempre foi apontado como sócio oculto. Leia a íntegra da sentença: https://drive.google.com/file/d/14s4yZbGe5TNAYbOS25HuGD_jJq9odffn/view?usp=sharing
No TJE, Beto Jatene, Albert Farid e o MF
Walter Bar e Restaurante Ltda (CNPJ 10.576.611/0001-36) figuram como requeridos
no processo 0023749-59.2017.8.14.0301, que tramita na 5 Vara Cível e
Empresarial de Belém.
O processo pede o despejo dos locatários
do imóvel da Almirante Wandenkolk, 727, onde funcionou o bar Ventura e hoje
fica o Baronesa.
Na Receita Federal, o MF Walter, cujo nome
de fantasia é “Favela”, tem como sócios Murilo Fonseca Franco Walter (filho de
Milene) e Haroldiceia Menezes de Lima – mesmo nome de
uma assessora de Gabinete do governador Simão Jatene, entre novembro de 2011 e
fevereiro de 2014, cujo salário base era de apenas R$ 934,69. Veja nos
quadrinhos:
Bolada da empresa que recebeu incentivos
fiscais
O único processo realmente significativo
de Beto Jatene, do qual se tem notícia, foi contra a PR Distribuidora de
Bebidas e Alimentos Ltda, que distribuía os produtos da Schincariol - empresa
que recebeu incentivos fiscais milionários do governador Simão Jatene, para se
instalar no Pará.
O processo, de número
0242283-04.2016.8.14.0301, foi uma ação de execução de título extrajudicial por
quantia certa, que tramitou na 7 Vara Cível e Empresarial de Belém.
Nele, Beto figurou como advogado e autor,
junto com o escritório Conduru Advogados Associados S/S Ltda.
Eles ganharam o pagamento de R$ 8 milhões
em honorários de êxito, quitados pela PR Distribuidora em cinco parcelas de R$
1,6 milhão, entre abril e agosto do ano passado.
No entanto, nem mesmo esses honorários
explicam os R$ 13 milhões que Beto Jatene movimentou.
Afinal, os honorários foram divididos
irmãmente: metade de cada parcela de R$ 1,6 milhão era depositada na conta de
Beto Jatene, e a outra metade na conta do escritório Conduru, como eles mesmos
pediram ao juiz.
O escândalo do Betocard
Beto Jatene é réu em um processo de
improbidade administrativa, ajuizado em junho de 2016 pelo Ministério Público
Estadual. O caso, que teve repercussão nacional, ficou conhecido como o
escândalo do Betocard: o abastecimento de viaturas da Polícia Militar e do
Corpo de Bombeiros em dois postos de gasolina dele (o Verdão e o Girassol).
Na Ação Civil Pública (ACP), de número
0320293-62.2016.8.14.0301, também figuram como réus a secretária estadual de
Administração, Alice Viana, e a Distribuidora Equador de Produtos de Petróleo.
Segundo o MPE, entre janeiro de 2012 e
outubro de 2014, o Verdão foi o posto de gasolina que mais vendeu combustíveis
à PM: mais de R$ 5 milhões, em valores da época.
O pagamento ao filho do governador pelo
abastecimento de veículos do Governo tinha tudo para não ser descoberto, já que
era realizado através de uma triangulação.
Em 2011, a Distribuidora Equador de
Produtos de Petróleo venceu uma licitação da Secretaria de Estado de
Administração (Sead), para gerenciar o abastecimento da frota estadual, através
de cartões magnéticos (o Petrocard), em postos credenciados.
Assim, o Governo pagava a Equador, que
pagava os postos.
Antes de Jatene assumir o Governo, quem
fazia esse gerenciamento era o Banco do Estado do Pará (Banpará), que não
cobrava nada por isso.
Leia
a reportagem da Perereca, de junho de 2016, “Empresa que paga postos de gasolina de Beto Jatene recebe
R$ 214 milhões do Governo do Estado. Postos do filho do governador faturam R$ 5
milhões abastecendo carros do Governo. Dono da Distribuidora Equador é preso
pela Lava-Jato. Ministério Público ajuiza Ação Civil Pública contra Jatene.
Perereca encontra 5 taxas menores que a da Equador, para gerenciar
abastecimento da frota”: http://pererecadavizinha.blogspot.com.br/2016/06/empresa-que-paga-postos-de-gasolina-de.html
Um comentário:
Eu queria que o povo votasse em mim,se eu consigo administrar minha casa sozinha,imagine o estado com os colaboradores isto seria um brinco de esmeralda nossa Belém😍
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