domingo, 19 de junho de 2016

OAB pode denunciar Jatene por crime de responsabilidade. Governador teria descumprido liminar do STF que mandou suspender pagamento de aposentadorias a ex-governadores. Jatene é beneficiário direto do descumprimento da liminar, já que recebe mais de R$ 31 mil como ex-governador. Duas aposentadorias rendem a Jatene mais de R$ 67 mil por mês.





A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) poderá denunciar o governador Simão Jatene por crime de responsabilidade, caso seja comprovado que ele descumpriu a liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendeu o pagamento de pensões a ex-governadores, entre os quais o próprio Jatene. 

A afirmação foi feita pelo presidente da Seccional do Pará da OAB, Alberto Campos.

Segundo ele, o caso, se comprovado, também poderá ser enquadrado como improbidade administrativa (leia, ao final, os principais trechos da entrevista concedida por Alberto Campos à Perereca da Vizinha, na última quarta-feira, 15).

Na última sexta-feira (17), a OAB/PA enviou ofício à Procuradoria Geral do Estado (PGE), para que ela informe se tais pensões continuam, de fato, a ser pagas. 

Não foi fixado prazo para a resposta, mas Campos lembrou que os prazos em processos administrativos são de 30 dias.

O ofício da OAB foi motivado por uma reportagem da Perereca da Vizinha, mostrando o possível descumprimento da liminar: http://pererecadavizinha.blogspot.com.br/2016/06/aposentadorias-de-jatene-somariam-mais.html 

Abaixo (clique nos quadrinhos para ampliar) o ofício da OAB: 





Sem amparo legal 


A pensão vitalícia para ex-governadores foi estabelecida pelo artigo 305 da Constituição do Pará.

Mas, em 2011, o Conselho Federal da OAB ajuizou, no STF, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4552, pedindo o fim desse privilégio.

A OAB mostrou que a Constituição Federal (CF) “não prevê e não autoriza a instituição de subsídios para quem não é ocupante de qualquer cargo público”, e que isso fere os princípios da Impessoalidade e da Moralidade da administração pública. 


Em abril do ano passado, o STF concedeu a liminar pedida pela OAB, para suspender a eficácia do artigo 305 da Constituição do Pará e, portanto, o pagamento dessas pensões, até que seja apreciado o mérito da questão.


Não houve recurso e a liminar transitou em julgado. Veja a certidão extraída pela Perereca da página do STF (clique em cima para ampliar):



Mesmo assim, segundo os demonstrativos de Remuneração do Estado, que se encontram no portal da Transparência, o Governo do Estado continuou pagando essas pensões.

Elas consumiriam 305,5 mil por mês, ou quase R$ 4 milhões por ano, incluindo o décimo terceiro.

Até o mês passado, beneficiavam  5 ex-governadores e 5 viúvas de ex-governadores.

No caso de Jatene, ele teria renunciado à remuneração de governador, para ficar com a pensão de ex, que, por sinal, é maior.

Nem todas essas pensões, porém, seriam irregulares, já que estariam sendo questionadas apenas as que são pagas a quem governou o Pará após a Constituição de 1988 – o que vale, também, para as ex-primeiras-damas. 

É que haveria previsão legal para esse tipo de benefício, na Constituição Federal anterior. 

Veja as pensões recebidas, no mês passado, por ex-governadores e viúvas, segundo o Demonstrativo de Remuneração do Governo do Estado que está no portal da Transparência e no site da Secretaria de Administração (SEAD). Todos os valores são brutos:

Ex-Governadores
 
Ana Júlia Carepa: R$ 31.994,67 
Aurélio do Carmo: R$ 48.753,78 
Carlos Santos: R$ 31.994,67 
Jarbas Passarinho (falecido dia 5): R$ 30.471,11 
Simão Robison Oliveira Jatene: R$ 31.994,67

Ex-primeiras-damas:
Maria do Faro Lopes Chaves, viúva do ex-governador Aloysio Chaves: R$ 25.900,44
Maria do Socorro França Gabriel, viúva do ex-governador Almir Gabriel: R$ 25.900,44
Marilda de Figueiredo Nunes, viúva do ex-governador Alacid Nunes: R$ 25.900,44 
Norma de Azevedo Guilhon, viúva do ex-governador Fernando Guilhon: R$ 26.780,44 
Therezinha Moraes Gueiros, viúva do ex-governador Hélio Gueiros: R$ 25.900,44  

Total, em maio: R$ 305.591,10
Total, em um ano, com o 13: R$ 3.972.684,30



R$ 49,4 milhões/ano, em 21 estados 


A ADI 4552 é uma entre as várias ações ajuizadas pelo Conselho Federal da OAB, no STF, para acabar com as pensões de ex-governadores e viúvas, em todo o Brasil.

Segundo reportagem do jornal Correio Braziliense, de fevereiro deste ano, essas aposentadorias são pagas em 21 estados e consomem R$ 49,4 milhões por ano. Ao todo, 114 ex-governadores são beneficiados.

Na movimentação processual da ADI 4552 (http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=4552&classe=ADI&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M) consta que o STF requisitou informações sobre o caso, em agosto do ano passado, à Assembleia Legislativa do Pará (Alepa).

A Alepa teria afirmado que tais pensões são uma decisão política e que o Estado do Pará possui autonomia para essa concessão.

Leia a íntegra da manifestação da Alepa, extraída do site do STF: https://drive.google.com/file/d/0B8xdLmqNOJ12T0F6ZGQ5SXJTMms/view?usp=sharing 

Mas, em fevereiro deste ano, a Procuradoria Geral da República (PGR) se manifestou contra tais “benesses”.

Segundo a PGR, “Não há regra constitucional ou federal que discipline benesse semelhante; não é, portanto, admissível produção de regra dessa natureza pelos entes periféricos da estrutura federativa. No federalismo adotado pela Constituição de 1988, nem mesmo a autonomia dos estados ou sua competência concorrente em matéria de previdência social os autoriza a inovar o ordenamento jurídico mediante instituição de pensão especial em benefício de ex-governadores”.

Leia a íntegra da manifestação da PGR, assinada pelo procurador geral da República, Rodrigo Janot: https://drive.google.com/file/d/0B8xdLmqNOJ12LUJvQ0dFaDRmVWs/view?usp=sharing 

E confira a manifestação da Advocacia Geral da União (AGU), também contrária a essas pensões: https://drive.google.com/file/d/0B8xdLmqNOJ12Q3pvVzBQVW8zM2s/view?usp=sharing 



A entrevista de Alberto Campos



Perereca: O blog publicou postagem mostrando que o Jatene tem duas aposentadorias, que somam mais de R$ 67 mil brutos. Uma dessas pensões é como ex-governador. Ocorre que essas pensões a ex-governadores e viúvas foram suspensas por uma liminar do STF, em abril do ano passado, em decorrência de uma ADI ajuizada pelo Conselho Federal da OAB. Ou seja: aparentemente, o governador Simão Jatene está descumprindo essa liminar. O que é que a OAB vai fazer em relação a isso? 
Alberto Campos: Primeiro, em razão dessa comunicação agora feita, pelo seu blog, vamos instar a Procuradoria Geral do Estado, para saber do cumprimento da decisão.

Perereca: Vão pedir informações à PGE? 
Alberto Campos: Informações à PGE, indagando a respeito do cumprimento ou não, e as razões pelas quais, se porventura não estiver sendo obedecida a decisão do Supremo Tribunal Federal; quais as razões pelas quais não está sendo obedecida. A partir daí, com a resposta afirmativa ou negativa, a Ordem tomará as medidas que o Conselho entender cabíveis, para a hipótese de, porventura, ele estar recebendo irregularmente essa pensão, em descumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal. 

Perereca: Então, o Senhor vai comunicar o fato ao Conselho Federal da OAB? 
Alberto Campos: Assim que chegar a informação, é claro. Porque essas medidas passam pelo Conselho Federal, todas. Se eu quiser ajuizar, por exemplo, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade com relação a alguma legislação aqui, o Conselho Federal que faz. Então, eu encaminho a demanda para o Conselho Federal e o Conselho Federal é que encaminha. 

Perereca: Quando é que o senhor vai pedir informações à PGE? 
Alberto Campos: Hoje. Já mandei fazer o ofício. Estou esperando que a assessoria me traga o ofício, para assinar e encaminhar à Procuradoria Geral do Estado. 

Perereca: O Senhor chegou a ver a documentação que está no meu blog? 
Alberto Campos: Eu estava de férias, tirei dez dias, cheguei nesta madrugada. 

Perereca: Então, o senhor não viu a documentação que está lá, né? 
Alberto Campos: Não. 

Perereca: Está toda a documentação lá: está o Demonstrativo de Remuneração... 
Alberto Campos: É, mas a gente precisa de uma resposta oficial, porque, se porventura estiver correta a interpretação que você deu com base na decisão do Supremo Tribunal Federal, nós precisamos de documentos. E precisamos de uma resposta oficial da Procuradoria Geral do Estado a respeito. 

Perereca: Consultei um advogado e ele me disse que, inclusive, a liminar transitou em julgado. Não houve contestação e ela está vigendo... 
Alberto Campos: A liminar é uma coisa; precisa se apreciar o mérito; não sei se o mérito já foi julgado pelo Supremo... 

Perereca: Não. Foi pautado para este ano. É a pauta 10/2016. 
Alberto Campos: Então, não foi julgado o mérito... 

Perereca: Não, não foi. Mas a liminar, doutor, ela não funciona para essa suspensão? 
Alberto Campos: É, se mandar suspender, obviamente que sim. 

Perereca: Existe alguma justificativa para o descumprimento da liminar, se de fato isso aconteceu? 
Alberto Campos: Você dar justificativas, ou tentar dar justificativas, para uma decisão do Supremo Tribunal Federal, realmente, é estar... É brincar com o Judiciário, com a mais alta Corte de Justiça do País. Dessas decisões de liminar cabe o que a gente chama de recurso interno, que são previstos, via de regra, no Regimento Interno da própria Corte. E se não foram manejados os recursos competentes, no momento cabível, a liminar realmente está de pé até agora. E só será revogada se, porventura, no mérito, os ministros julgarem improcedente a ação. Então, é claro que qualquer governador do Estado ou qualquer autoridade que esteja se beneficiando de forma irregular, descumprindo-a, vai responder por isso. 

Perereca: No caso desse envio ao Conselho Federal, passa primeiro pela aprovação do Conselho Seccional? 
Alberto Campos: Não, porque é só descumprimento de uma decisão. Não vamos ajuizar uma ação nova, ela já existe; vamos apenas denunciar o descumprimento da liminar. E esse pedido (a ADI) foi feito originariamente pela OAB do Pará. Não precisa aprovar mais nada. 

Perereca: No caso de vocês denunciarem que ele descumpriu (a liminar), ele pode ter que devolver o dinheiro? 
Alberto Campos: Claro. Mas isso a gente tá em suposição, né? 

Perereca: E, hipoteticamente, vamos dizer que mesmo que o Supremo julgue contrário, no mérito, mesmo assim ele teria de devolver o dinheiro ou não? 
Alberto Campos: É, tu tens uma liminar que está em vigor. E essa liminar precisa ser cumprida. Enquanto ela não for revogada, alterada, ele tem de cumprir a decisão liminar, ainda que depois os efeitos, se porventura a ação for julgada improcedente, os efeitos o ministro relator do voto vencedor é que vai definir. Mas, por enquanto, o que vale é a decisão liminar. 

Perereca: É improbidade, doutor? 
Alberto Campos: É improbidade. 

Perereca: Essa improbidade é agravada pelo fato de ele ser beneficiário desse tipo de coisa? Porque ele se beneficia, também. Não é o irmão, o parente. É ele que também é beneficiário. Isso não agrava a situação? 
Alberto Campos: Para mim, um simples desrespeito a uma decisão do Supremo Tribunal Federal já é tão grave que eu não vejo que o fato de ele ser governador agrave ainda mais. Já é grave, já está no limite, se configurado, realmente, o recebimento irregular da verba. 

Perereca: Se houver isso, é crime de responsabilidade ou não? 
Alberto Campos: É crime de responsabilidade, é crime de desobediência... Tens ali na Lei de Responsabilidade uma série de dispositivos em que poderia facilmente enquadrar aqueles que porventura estejam violando... 

Perereca: Mas dependendo da decisão do Supremo ou independente da decisão do Supremo? 
Alberto Campos: O que vai acontecer? Se comprovado isso, a gente vai fazer a denúncia, do desrespeito à decisão judicial, e o Supremo Tribunal Federal vai definir qual ou quais as punições que caberão a cada um daqueles que porventura esteja violando a decisão. Como são vários envolvidos, tem que checar realmente se essa decisão liminar ainda não está pendente de recurso. 

Perereca: Vocês vão denunciá-lo por crime de responsabilidade? 
Alberto Campos: Por que não? A Ordem não é a instituição responsável pela defesa da Constituição e da ordem jurídica? 

Perereca: Mas a quem vocês farão essa denúncia? 
Alberto Campos: No Supremo Tribunal Federal. É tudo lá. 

Perereca: É uma outra denúncia, né? 
Alberto Campos: Porque também ele tem foro privilegiado. É tudo lá. Na verdade, a gente faz a denúncia e o Supremo Tribunal Federal encaminha e toma as medidas que eles entenderem cabíveis para a hipótese. 

Perereca: Mas à parte essa informação ao Supremo sobre o descumprimento de liminar, vocês vão denunciá-lo, também, por crime de responsabilidade? 
Alberto Campos: O próprio Supremo Tribunal Federal pode encaminhar todas as peças para o Ministério Público, para promover a responsabilidade criminal dele. Isso tudo quem decide é o Supremo Tribunal Federal. 

Perereca: Desculpe-me a insistência, mas se for comprovado o descumprimento da liminar, os senhores farão ou não a denúncia específica do crime de responsabilidade? 
Alberto Campos: Temos competência para fazê-lo. Se comprovado, a Ordem não se furtará a promover a responsabilidade de qualquer ente público que viole a legislação. Isso é histórico nosso. 

Perereca: Então, eu posso colocar que a Ordem poderá entrar com uma denúncia de crime de responsabilidade contra o governador? 
Alberto Campos: Se comprovado, sim. 

Perereca: Vocês estão dando algum prazo para que a PGE forneça essas informações? 
Alberto Campos: Não, a gente não estabelece prazo. A gente pede informações e ele presta. O prazo é geralmente cinco dias... Mas se for pela lei do processo administrativo são 30 dias, por isso que a gente... A gente não tem o poder de estabelecer prazo. 

Perereca: Mas quanto tempo vocês estão dispostos a esperar? 
Alberto Campos: Trinta dias é o prazo do processo administrativo. 

Perereca: A par disso, vocês vão também coletar outras provas? 
Alberto Campos: Vamos atrás. Já que você está denunciando, a gente vai tentar pegar aí as informações, através do site, né? 

Perereca: Nesse caso, é só do Jatene a responsabilidade, ou é também do secretário que paga? 
Alberto Campos: É quem percebe. Quem recebe é o principal. Os outros são acessórios. Os outros vêm em responsabilidade solidária, de um crime de responsabilidade, talvez. Mas aí vai depender muito da interpretação. 

Perereca: Esse tipo de coisa dá até intervenção no Estado, não dá? 
Alberto Campos: Acho que dá. 

Perereca: Eu estava olhando as hipóteses de crimes de responsabilidade, na Constituição. E uma delas é justamente o descumprimento da legislação. 
Alberto Campos: O descumprimento da decisão judicial do Supremo é o principal. 

Perereca: Vocês vão pedir intervenção no estado? 
Alberto Campos:  Não sei. A gente está falando muito hipoteticamente aqui. Eu preciso ter documentos na mão, nós precisamos avaliar juridicamente, não pode ser assim. Uma iniciativa tão séria quanto esta, ela exige análise de documentos, né? Com calma, com tranquilidade, para realmente você tomar a medida adequada para não cometer equívocos e nem ser irresponsável ao ponto de colocar para opinião pública o que não é verídico ou juridicamente possível. É por isso que a gente precisa avaliar a situação como um todo.

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Diário do Pará noticia o caso 


No jornal Diário do Pará de hoje, (19/06/2016), há matéria sobre o caso:

2 comentários:

Marcos Paulo disse...

Ana Célia parabéns pela sua coragem!!!

Anônimo disse...

Gostaria de saber porque que o MP e TJ do Pará não se manifestam? Será que tem rabo preso (ou será parentes ganhando DAS?)? Sinceramente, temos o pior judiciário do país.

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