domingo, 27 de janeiro de 2019

Brumadinho: os culpados somos nós.





Sejamos justos: Bolsonaro não é o culpado pela tragédia de Brumadinho. 

Ele está há poucos dias no cargo e esse crime foi provocado por anos e anos de omissão dos governos, das instituições.

Se for para apontar o dedão acusador apenas a presidentes da República, então teremos que começar por Fernando Henrique Cardoso, que privatizou a Vale. 

Mas também teremos de acusar Lula, Dilma e Temer, que pouco ou nada fizeram para apertar a fiscalização sobre essas mineradoras. Tanto é assim que essa tragédia se consumou. 

Mas penso que é muito fácil, reconfortante até, apontarmos o dedão acusador apenas a presidentes, governadores, políticos em geral, já que isso nos distancia da nossa própria responsabilidade por todo esse horror. 

Com raríssimas exceções, cada um de nós é responsável pela tragédia de Brumadinho. 

Cada um de nós tem as mãos sujas de lama e de sangue, neste momento. 

A verdade verdadeira é que, nós, os brasileiros, não vemos o meio ambiente como uma questão essencial, até para a nossa sobrevivência como espécie humana. 

Isso é visível em nossas ruas cheias de lixo, nos animais abandonados e maltratados, nos nossos rios e praias poluídas, nas nossas florestas devastadas, nas nossas cidades, casas, prédios, ruas cinzentas de tanto cimento, onde o verde praticamente inexiste. 

Mas sabem, queridos, isso tem uma lógica. 

Uma lógica cruel, perversa, mas ainda assim uma lógica. 

Afinal, se não conseguimos valorizar nem mesmo a vida humana, como poderemos valorizar outras formas de vida? 

Neste Brasil que todos construímos – TODOS! – mata-se por qualquer coisa. Por um celular, por uma divergência, por uma discussão, por uma antipatia, por uma rejeição. 

Mata-se, mata-se, mata-se! 

Mata-se de bala, de faca, de porrada, de veneno, de humilhação. 

Mata-se até em pensamento, com agressões, xingamentos, perseguições de todo o tipo. 

Mata-se de vida e morte Severina. Ou, como escreveu o grande João Cabral de Melo Neto: “de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia”... 

A criminosa Vale jamais teria conseguido cometer um crime como Brumadinho em uma nação que não fosse tão omissa e insana quanto a nossa. 

Em uma nação onde houvesse RESPEITO entre os semelhantes e AMOR a tudo o que vive. 

Em uma nação onde um deputado não tivesse até de largar o mandato e fugir, para não ser assassinado, simplesmente por defender direitos humanos. 

E não, não estou a falar de respeito à Democracia. 

Estou a falar é de respeito ao básico do básico: o respeito à integridade e à vida de outro ser humano. 

Dezenas de pessoas, animais, árvores, rios, pagaram e pagarão com a vida pela nossa omissão. 

É essa é que é a dolorosa verdade. 

Brumadinho não é de esquerda ou de direita, de ricos ou pobres, de brancos ou negros, de homens ou mulheres, de civis ou militares. Brumadinho é de cada um de nós.

Se tivéssemos só um pouquinho de respeito ao próximo e de amor à Vida, a criminosa Vale e todas as mineradoras, e todas as empresas criminosamente poluidoras, devastadoras, não teriam feito a festa que sempre fizeram, comprando, corrompendo, políticos, magistrados, promotores, jornalistas, veículos de comunicação. 

Comprando, corrompendo, todas as instituições, para poderem agir como se este país não passasse de uma grande latrina. 

Elas só agem assim porque não temos uma sociedade solidária, organizada – HUMANA! – a lhes fazer frente; a lhes impedir o saque, a ganância, a destruição. 

Elas fazem o que fazem porque NÓS permitimos – é essa é que é a verdade! 

Brumadinho passará, como passou Mariana, como passaram tantas outras tragédias, que vitimaram gente, rios, florestas, bichos... 

Daqui a dois, cinco, dez anos será apenas uma fotografia que surge aqui e acolá, nas redes sociais. 

Ou uma história em um livro, perdido entre milhares, milhões de livros, em alguma biblioteca. 

Brumadinho passará... 

As famílias, hoje dilaceradas, encolhidas de tanta dor, terão de seguir em frente... 

Os processos se arrastarão décadas na Justiça. 

A Vale pagará milhões e milhões de anúncios, campanhas publicitárias, reportagens, patrocínios a grandes espetáculos, exposições de arte, para mostrar a todos a sua “benemerência”... 

Brumadinho passará... 

Lá como cá, os minérios vorazmente extraídos seguirão para bem longe dos miseráveis que habitam em cima de tanta riqueza. 

A Vale e outras mineradoras continuarão a encravar impressionantes manchas de devastação, recortes alaranjados no meio da exuberante floresta, como se estivessem a tentar expulsá-la, como se expulsa a um mal, a uma doença, para bem longe de seus domínios. 

Brumadinho passará... 

Barragens e mais barragens surgirão. 

As leis e a fiscalização, cada vez mais frouxas, farão com que já nem seja o maior ou um dos maiores crimes ambientais deste país. 

Nos telões em nossos quartos e em nossas salas de vista, assistiremos confortavelmente a novos resgates de mais e mais corpos, de mais e mais mares de lama. 

Brumadinho passará... 

E daqui a 100 anos, em meio a um calor insuportável, enchentes, furacões, vendavais, provocados pela insanidade do Homem, pela incapacidade de ouvir o silêncio da natureza cada vez que o animal humano derruba uma árvore, tira uma vida, se alguém mencionar Brumadinho, nossos netos e bisnetos perguntarão: “quem foi?” 

Brumadinho passará... 

Até quando? 

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PS: um leitor informou, há pouco, que a foto acima não é de Brumadinho. Agradeço a informação e a atenção do leitor, mas vou mantê-la como ilustração da postagem, porque de todas as fotos que vi como sendo dessa tragédia, essa foi aquela que mais refletiu a sensação que estou a sentir neste momento. No entanto, fica a informação a todos os leitores.

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Pra vocês, pra todos nós, por tantas tragédias, por tanta destruição:


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