quinta-feira, 18 de maio de 2017

Quem prenderá o carcereiro?



 

Chega a ser comovente a “indignação” do procurador da República, Deltan Dallagnol, para quem a reforma mais importante a ser realizada no Brasil é a “Anticorrupção”. 

“Se este Congresso não fizer as reformas necessárias contra a corrupção, será uma confissão de incompetência e merecerá a vergonha dos crimes que o cobrem - com as honrosas exceções daqueles que estão lutando por essas mudanças. E a melhor coisa que a sociedade poderá fazer, além de protestar, será mostrar sua indignação nas urnas, colocando no Congresso em 2018 pessoas comprometidas com as transformações que queremos ver. Não roubarão nosso país de nós. Lutaremos por ele até o fim", escreveu ele, em seu Facebook, segundo a Folha de São Paulo, após a divulgação da notícia de que Temer teria sido gravado pela JBS, a falar sobre a compra do silêncio de Eduardo Cunha. 

Apesar de comovente, é também um bocado esquisita a indignação do procurador. 

Afinal, fica parecendo que são apenas os políticos brasileiros, e tão somente eles, os responsáveis pela corrupção que corrói este país. 

A coisa toda fica ainda mais estranha quando se recordam as declarações de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Carlos Barroso, durante uma palestra em Londres, no último dia 13. 

Segundo o jornal O Globo, o ministro afirmou que a impunidade criou um país de “ricos delinquentes”. 

“A verdade é que um direito penal absolutamente incapaz de atingir qualquer pessoa que ganhe mais de cinco salários mínimos criou um país de ricos delinquentes, em que a corrupção passou a ser um meio de vida para muitos e um modo de fazer negócios para outros. Houve um pacto espúrio entre iniciativa privada e setor público para desviar esses recursos. E não é fácil desfazer esse pacto. Qualquer pessoa que esteja assistindo o que se passa no Brasil pode testemunhar”, teria dito Barroso. 

Ora, a quem compete denunciar e punir os “delinquentes”? 

Se você não sabe, caro leitor (e parece até que não querem que você tenha clareza disso), quem denuncia os “delinquentes” à Justiça é o Ministério Público. E quem tem o poder de punir tais “delinquentes” é o Judiciário. 

Logo, se o Brasil chegou ao ponto em que chegou, o Ministério Público e o Judiciário têm, sim, enorme parcela de responsabilidade – e até maior do que a de muitos desses “delinquentes” que vemos por aí. 

Afinal, muitos desses “delinquentes” podem até ser considerados simples reflexos do nosso sistema político, que é centrado na promiscuidade entre o público e o privado. 

No entanto, a que atribuir a inércia do Ministério Público e do Judiciário, durante décadas a fio, em relação a tais “delinquentes”? 

Será que os nossos procuradores e magistrados, tão distraídos quanto a nossa “pátria mãe gentil”, nunca viram nada de errado em tamanha “delinquência”? 

Ou, ao verem tamanha “delinquência”, simplesmente calaram, tornando-se cúmplices dela? 

Se foi assim, o que os levou a essa cumplicidade? Foi de graça? Sério? 

Pelos discursos de alguns promotores e magistrados, fica-se com a impressão de que tudo isso começou agora. 

Não houve irregularidades na venda da Vale, nas empresas de telefonia, na Celpa, no Banestado – nada! É tudo de ontem! Ou, pelo menos, foi apenas ontem que “acordaram” os nossos “xerifes” e “carcereiros”. 

É preciso, sim, combater a corrupção – e essa tem que ser uma luta cotidiana de cada um de nós, a envolver, principalmente, uma mudança de mentalidade, de ética, em nossas próprias vidas. 

Chega de “jeitinho” e de incensar o canalha, o bandido, como “inteligência superior”! Chega de cobrar honestidade apenas do outro! 

Mas se a luta contra a corrupção começa em nossas próprias vidas e passa, necessariamente, por uma profunda reforma política, ela não se esgota aí. 

Também o nosso Ministério Público e o nosso Judiciário têm de ser alvos de profundas reformas, para que nunca mais se curvem, como se curvaram, à “delinquência”. 

Houvessem denunciado os “bandidos” e colocado os “bandidos” na cadeia, não teríamos nem precisado de uma lei como a “Ficha Limpa”, e o Brasil não teria chegado ao impasse que vemos hoje. 

Então, nossos “xerifes” e “carcereiros” têm de deixar de lado a hipocrisia, parando de apontar o dedão acusador apenas aos outros. 

Nossos políticos, nossos representantes, não emergiram do inferno, ou vieram de alguma galáxia distante. 

Eles foram eleitos – infelizmente! - graças a uma mentalidade que ainda predomina na sociedade brasileira e a um sistema político arcaico. Mas não são simplesmente “bandidos”. Até porque, ao dizê-los “bandidos”, teríamos que dizer “bandido” a todo o eleitorado brasileiro. 

Nossos representantes merecem, sim, respeito. E se há criminosos entre eles, que sejam afastados da vida pública. E não apenas por nós, eleitores. Mas por quem, desde sempre, detém a chave da carceragem! 

O que não dá é para continuar a criminalizar os políticos e a Política. 

Em primeiro lugar, porque, sem Política, a gente não consegue viver em um quarteirão que seja, sem se estapear com os vizinhos. 

Política não é só apertar uma tecla, para eleger representantes – ou até fiscalizá-los. 

Política é negociar, é tolerar, é conviver. 

E todos nós, queiramos ou não, fazemos Política todos os dias – desde a hora em que acordamos, até a hora em que vamos dormir. 

Ela está na escola, no trabalho, no sindicato, na vizinhança, nas ruas, na igreja - na nossa família! 

É a ferramenta mais vigorosa já inventada pela espécie humana, para que possamos viver em sociedade - onde, aliás, se realiza a nossa própria essência. 

E se alguns fazem mau uso da Política, especialmente, na seara partidária,  isso não significa que ela seja “ruim” ou “do mal”. 

Só aos aristocratas, aos oligarcas, aos “iluminados” é que interessa essa visão da Política como coisa “suja”. Porque aí eles podem exercer o “direito divino” que imaginam ter de dirigir as nossas vidas. 

Portanto, não são apenas os nossos políticos e o sistema político brasileiro que têm que entrar nessa “grande dança” anticorrupção. 

Todos temos que assumir a nossa parcela de responsabilidade. E, principalmente, os que sempre detiveram as chaves da carceragem. 

A “limpeza” tem que alcançar, também, o Ministério Público e o Judiciário. Também eles têm que cortar na própria carne – e não é só com um boi de piranha, um procuradorzinho eleitoral. 

Têm que cair todos os magistrados que sentam em cima de processos ou que entram em tenebrosas transações com os “delinquentes”. 

Têm que cair todos os promotores que olham para outro lado, quando dão de cara com uma improbidade. 

Se a luta é realmente contra a corrupção, então o “xerife” e o “carcereiro” têm que afastar, em primeiro lugar, o espírito de corpo. 

Além de pararem com esse faz de conta sonso e messiânico de nunca souberam do que se passava no Brasil. 

FUUUIIIII!!!!

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