quinta-feira, 22 de março de 2007

Festa mais novo

Festa no Meu Apê VIII



(Abrem-se as cortinas. O clima no Apê é de salloon. Os convidados estão sentados em mesas, na parte de baixo, onde bebem, fumam e jogam. Eles estão vestidos de cowboys; elas, de dançarinas de can-can, inclusive a Correspondente e a Perereca, que estão em pé, num canto, com badejas nas mãos. No alto da escada, surge a Beijoca, com um longo prateado. Ao lado dela, o lorde Sudão e o Barão de Inhangapi, vestidos de branco, fraque, cartola e bengala; além do lorde Tirésias (de óculos escuros), do lorde Balloon, do lorde Ki-Nem, do Príncipe Clean e do Conde de Bota-Bem. Eles cantam, dançam e sapateiam Hellô Dolly, tendo em primeiro plano a Beijoca, o Sudão e o Barão, cada um de um lado: Hello dolly,well, hello, dolly/It's so nice to have you back where you belong/You're lookin' swell, dolly...i can tell, dolly/ You're still glowin'...you're still crowin'...you're still goin' strong/I feel that room swayin'...while the band's playin'/One of your old favourite songs from way back when/So... take her wrap, fellas...find her an empty lap, fellas/Dolly'll never go away again/Hello dolly,...well, hello, dolly/It's so nice to have you back where you belong/You're lookin' swell, dolly...i can tell, dolly/You're still glowin'...you're still crowin'...you're still goin' strong/I feel the room swayin'...while that ole band keeps on playin'/One of your old favourite songs from way back when/So...golly, gee, fellas...find her an empty knee, fellas/Dolly'll never go away...i said she'll never go away/Dolly'll never go away again)

(Aplausos. E os dançarinos se dirigem para uma mesa central, para jogar cartas. A Beijoca é a carteadora).

_Ô comadre! Só mermo você pra enfiá a gente nessa roupa ridícula!
_Fica quieta, animal! Pode ser a única chance da gente se vestir desse jeito!
_Ué, de dançarinas de can-can?
_Como diria o lorde Balloon, é um velho sonho que se torna realidade...
_Credo, comadre, que você atem cada tara!...
_Mas que tara, animal? Isso é uma performance artística!...
_Pois pra mim isso tem otro nome. É sem-vergonhice, mermo!...
_Que é isso, cumadizinha? Não era você que ficava dizendo pra eu manter a mente aberta?
_Mas era assó a mente, comadre, era assó a mente...
_Ô cumadizinha, o seu problema é que você tem uma moral complexa! Você devia era aprender com a corte do Brejo, que mais parece uma imensa terma romana!
_Vixe Maria, comadre! Eu acho que essa festa ta é lhe fazendo é mal. Mas, num se avexe, que eu vô chamá um especialista em terma romana...
_Na, na, ni, na, não! O Barão, de novo, não!
_Huuummm!...E quem foi disse que eu ia chamá o Barão? Eu ia era chamá o lorde Sudão!...
_Não brinque, cumadizinha, o homem também é especialista?
_Ô comadre!... Eu juro que vô manda rezá uma novena pra você, pra vê se a Nazica lhe assocorre! Você e esse seu blog velho nunca assabem de nada! Apreste atenção, comadre: o Barão e o Sudão – não necessariamente nessa ordem – são os maiores especialistas do Brejo. Os ômi são super-habilitados, comadre! Intendem de mulhé, de política, de limpeza, de alma e é claro – off course! – de terma romana!...
_Puxa, cumadizinha!...Tadinha da Beijoca!...
_Mas aoooonnnnnde!...
_Mas, cumadizinha, se os homens são super-habilitados e ela ta cercada pelos dois...
_Ô comadre, cum você a gente atem de começá pelo básico. Arrepita comigo: mim Tarzan, you Chita!
_Mim Tarzan...
_I’...
_I’ ...
_I’...
_I’...
_Ô comadre, é pra arrepeti invertendo...
_Ah!...You Tarzan, I’ Chita! (...)
_Tá ‘rendo, comadre, como a gente se esforçando até que você intendi? E atome essa banana que é pra modo de ficá calma!...
_(...)
_Agora, vamo pra segunda alição. Arrepita comigo, comadre: BA, BE, BI, BO, BU!
_BA, BE, BI, BO, BU!
_Alindo, comadre! Vai para o trono ou não vai?... E você acaba de ganhá a segunda banana da noite!...
_(...)
_E agora, comadre, vamo pra tercera e última alição. Se você assoubé essa, num precisa aprendê mais nada: Vai virá PHD em terma romana. Arrepita comigo, comadre: Vo-vô a-viu a u-va!
_Vovô a-viu a u-va!
_Tá ‘rendo, comadre? Cum esse intensivão você faria sucesso até na corte do Rei Sol!
_(...)
_Qui é que foi, comadre, ta isperandu a tercera banana, é?
_(...)
_Bom, agora, que você já assabe, pra modo, o básico, vamo assepará o joio do trigo...Pra começá, comadre, você assabe a Chapeuzinho Vermelho e a donzela das Orleans?
_É claro que sei, né, animal!
_Pois a Beijoca não é nenhuma delas. E muito menos a Cinderela, comadre! Ela afica assim, vamo dizê, em tercero lugá de terma romana...
_Ué, mas a Beijoca também entende de terma romana?
_E num é, comadre? Nesse ponto, ela é iscritinha você: num apode vê um efebo que se acoça toda...Aliás, no caso de vocês, é só trocá pra “vovó aviu o uvo”...
_O que é isso, animal? Como é que você fica falando essas coisas pra platéia?
_Mas num é, comadre? Vocês quatro adeviam era criá um franchising da Pom-Pom... É botox por osmose, comadre! E é botox aqui, botox acolá...E a Suzana V. se ofertando pra madrinha da bateria. E o Ponce de Leon se aconsumindo de inveja!...
_Sabe de uma coisa, cumadizinha, o que lhe mata é essa sua...essa sua... compulsão Agostiniana!...
_A minha pra modo de quê?
_Ó Senhor, onde estás que não respondes?
_Chamarrr, minha senhorrra?
_ (...)...Ô seu Inri, não me atrapalhe que este é um momento de alta dramaticidade...(as luzes diminuem. Em BG, “E o Vento Levou”)... Por quê? Por quê? Por que, meu Deus?...Por que eu tive de nascer com um carma desses? Por que me fizeste nascer com cara de choque elétrico, pra atrair tudo que é doido? Logo eu, Senhor, uma pessoa tão sã, tão normal, no meio de um hospício... Por que, meu Deus, por quê? Where is Tara? Ó Rhett, Rhett!.. (fica petrificada).
_Vixe Maria, que a comadre pirou!...Égua, que até pareci aquela minina de Santo Alexandre!...Seu Inri, será que o sinhô apodia fazê um exorcismo básico nela?
_Deixarrr comigo, querrrida! (dirigindo-se para a Perereca, colocando as mãos no coldre. Rufam tambores. Em BG, “O Dólar Furado”, mas só a parte dos tiros). O sangue de Indaiarrr terrr poderrrr! (o salloon repete: o sangue de Indaiarrr terrr poderrr!) Demônio! (o salão: Demônio!) Safado! (o salão: Safado!) Filho duma cadela peçonhenta! (o salão: filho duma cadela peçonhenta!). Filho dum cão pustulento! (o salão: Filho dum cão pustulento!) Coisa-ruim, bicho de pé, peido mal rrresolvido! (o salão: coisa-ruim, bicho de pé, peido mal rrresolvido!) Chato do culhão do chato! (o salão: chato do culhão do chato!) Merda de elefante, ameba, caganeira! (o salão: merda de elefante, ameba, caganeira!) Filho do George Bush com Saddam Hussein! (o salão: Filho do George Bush com Saddam Hussein!) Sai, Satanás, em nome de Indaiarrr! (o salão: Sai, Satanás, em nome de Indaiarrr!)

(A Perereca treme, treme, mas volta a petrificar. Só que começa a espumar pelos cantos da boca...).

_Ô seu Inri, num é gabá não, mas a sua moral ta very baixa com Satanás!... Esse treco só piorô a situação da comadre! Ela tá até espumando!...Mas, também, depois de toda essa esculhambação!...Se eu fosse o sinhô, num apassava nem perto do inferno!...
_Mas é que a senhorrra não me deixarrr terminarrr o exorrrcismo. É prrreciso açoitar a Perrrerrreca com a varrra do perrrverrrso! (o salão, feito um coro grego: Ó vinde, vinde varrra do perrrverrrso!)
_Mas que vara do perverso!...Vocês piraram, é? Se fizer isso, aí é que a comadre não desencrua!...(dirigindo-se para a Perereca, agarrando-a e sacudindo) Ô comadre, acorde, comadre!...Eu juro que num abrigo mais com você!... Até coloco anúncio no tem-tem da Gazeta de Arribação, pra modo de lhe arranjá 300 escravos sexuais! Tudo com vinte aninhos, comadre! E juro que nunca mais que arrepito que vovó aviu o uvo...
_ (o Jujuba, vestido de maitre, acompanhado de um garçom) Me desculpe, querida, mas por que você não oferece pra ela essa deliciosa poule prêt au vin? (tirando uma coxa e comendo) Para acompanhar, farrofá du manioc frite au kerosene. Tudo regado (bebendo) a petite canne...E para terminar (acendendo), um estonteante charrutô parragaiô...
_(A Barbie) Que nada, Jujuba, o melhor é fazer a Perereca vomitar!
_Vocês endoidaram de vez, é? Se a comadre tá petrificada, como é que vai comê ou vomitá?
_Me desculpe, querida, mas se ela está assim a culpa é sua...
_Eu sei, seu sei, dona Barbie...Num adevia te pegado tão pesado com a comadre...E muito menos mandado o doido do Inri fazê um exorcismo nela...
_Não é isso, querida. É que exorcismo não resolve!...
_Ué, por que dona Barbie?
_Eu tentei com o Bota-Bem e ele nada de botar...
_Num me adiga, dona Barbie!
_E não foi só exorcismo, não...Cá entre nós, tentei o sabonete da salvação, a água do rio Jordão e até o chicote do maligno... e nada!...
_Vixe Maria, mas o caso dele é tão grave?
_Você nem imagina, querida, você nem imagina...
_Assério?... Vai vê que gosto da vara do perverso, ué!...
__Eu tenho uma sugestão: por que não limpamos a Perereca? Podemos passar um aspirador aqui e acolá, jogar uma K-boa, recolher os papéis...
_E se der sopa, até merendá em cima dela, né, seu Clean? O sinhô tá pensando que isso daqui é aquele filme “o Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante dela”?
_Com licença! O que a dona Perereca precisa, certo?, é de um incentivo, certo?
_É, de incentivo o sinhô intendi, né, seu Sudão?
_Como diria Napoleão, certo?, só grandes incentivos, certo?, para atravessar o deserto do espírito humano!...
_O que vocês precisam compreender é que isso tudo é o imponderável do imponderável! É uma coisa nova e extraordinária – e eu não tenho nenhuma dúvida disso, cabocos! Vejam: com a dona Perereca petrificada, nós, os personagens, podemos ir pescar, afinal...(ajeitando o violão) Eu já até compus uma música sobre isso. Vocês querem ouvir, cabocos?
_(Todos) Nãããooo!!!
_(...)
_Aperem lá, que o lorde Balloon qué assoprá nos meus zuvido!..
_(...)
_Hum, Hum...Mas o sinhô tem certeza disso?
_(...)
_(o lorde Ki-Nem, impaciente) Mas o que é, mana, que meu pai-pai tá recomendando?
_Ele ta dizendo que é pra gente aconsultá o Oráculo!...
_(Todos, para a correspondente) E quem é o Oráculo?
_É o lorde Tirésias, ué!...
_(Todos) Ó vinde, vinde, ó Poderoso Oráculo!

(As luzes se apagam. No meio do salão estão a Beijoca, o Sudão e o Barão. Em segundo foco, que vai aparecer de vez em quando, uma mesa de roleta, com alguns jogadores e o cara que canta o resultado da roleta. Os três personagens dançam um tango, cantado pelo Tirésias, à frente de todos. A Beijoca dança, ora com o Barão, ora com o Sudão. O Sudão e o Barão, ora com eles – e quem está sozinho primeiro ensaia uns passos e depois, através de mímica, protesta. A música é Vermelho 27: “Jogo no pano... jogo... feito! Vermelho 27!”/ Esse homem que hoje passa maltrapilho/ Fracassado no seu traje furta-cor/ Um dia já foi homem, teve amigos,/ Teve amores, mas nunca teve amor/ Soberano da roleta e da campista/ Foi sua majestade o jogador!/ Vermelho vinte e sete/ Seu dinheiro mil mulheres conquistou/ Vermelho vinte e sete/ Seu dinheiro tanta gente alimentou/ Um rio de champagne sorrindo derramou/ E a sua mocidade em fichas transformou/ “Jogo no pano...jogo...feito! ... Vermelho 27!”/ Vermelho vinte e sete/ Quando a sorte caprichosa o abandonou/ Vermelho vinte e sete/ Cada amigo num estranho se tornou./ Os ossos do banquete aos cães ele atirou,/ A vida honra tudo,/ Num lance ele arriscou.../“Jogo...jogo...feito! Preto 17!”/ Deu preto dezessete/ Nem um cão entre os amigos encontrou!).

(continua)