quarta-feira, 27 de setembro de 2006

Sobre o Debate


Raimundo para Presidente!



Depois de assistir ao debate de ontem à noite (forçada, diga-se) cheguei a uma conclusão determinante em minha vida: vou votar em Edmilson Rodrigues. Para que participe de todo e qualquer debate, seja ou não candidato, ao que quer que seja. Ed roubou a cena. Nunca esquecerei o olhar do Raimundo, chamado a mediar o debate. Era o olhar do sofrido retirante nordestino diante de um novo Conselheiro: não sabe se estrangula ou se estapeia...

Edmilson é um intelectual enlouquecido: leu tanto, conhece tanto, que não consegue concentrar-se no específico. Daí o olhar desesperado do Raimundo, ante às divagações do candidato. Ed é o orador que acredita no próprio discurso. Mas, com tal veemência, que colocaria Cícero para correr – de vergonha ou de medo, sabe-se lá... Pobre Raimundo, que prometeu firmeza! Os padins Cíceros deles, nunca foram páreo aos nossos Angelins....Nem aos Baratas que nós, paraenses, insistimos, tão ciosamente, em acalentar...

Almir está velho. Tem indisfarçáveis falhas e confusões de memória. Passa credibilidade, é verdade. Mas deixa a “sensação de insegurança” acerca de quem terminará o mandato. Ao vê-lo, tem-se a impressão de que acabará como o rei George, a vagar ensandecido pelos corredores do poder, amparado por eminentes membros da Corte. E o problema é que não vivemos, exatamente, numa Monarquia, apesar de tudo o que os tucanos já intentaram nesse sentido...

Almir é a prova viva de que o tempo é, de fato, o grande senhor do mundo. De nada adianta nos projetarmos mais, nos querermos mais: o físico tem limitações que a mente jamais conseguirá superar. É o ciclo da vida cobrando o seu quinhão. Principalmente, daqueles que viveram intensamente...

Por isso, é claro, que, aos tucanos que assistiram o debate, faltou a agilidade mental e ironia do Barão, capaz de transformar água em vinho, pedra em pão...Jamais se deveria ter permitido que Almir participasse de debates. Ficou claro que a sua vice assumirá, se ele for eleito, cada vez maior projeção, com vistas a 2010. Mesmo que o “velho” e os tucanos de puro-sangue não o desejem. Ela será a nossa Roseana! E eu, a cada dia que passa, me convenço de que tenho, de fato, uma boa estrela...

Priante precisa parar de assumir a postura de galinho de briga, a cada vez que olha para Almir. Precisa compreender que, se armar para a guerra diante de um Príamo, não revela, exatamente, coragem. O contraste requer certa doçura e condescendência. Especialmente, de quem se orgulha de ter criado passe livre, nos ônibus, para os idosos...

Priante precisa aprender a controlar a impaciência e a ira, que o levam a remexer-se na tribuna. Nem que tenha de tomar uma tonelada de Lexotan. Agressividade é muito bem-vinda, diante de ameaças concretas ao povo que se pretende defender. Mas, para além do concreto, existe o aparente. E um ancião – por mais astuto que seja – nunca passará, a quem assiste, tal capacidade ameaçadora. A cara nova precisa demonstrar, enfim, maior equilíbrio emocional...

Ana Júlia é fashion. É a nossa Ciccareli guaribada. Apanhada na praia, tem savoir-faire para gritar: “andaram me clonando!!!”. Ou, para jurar de pés juntos que foi a gêmea – apesar de ser filha única... Tem ensaiado o que significam 10 ou 30 segundos. E que sorrir, sempre, vale mais que dez granadas. Agradabilíssima e certeira, a nossa senadora. E, quem sabe, futura governadora...

E mais não digo, nem me foi perguntado. E eu vou é tomar em paz essa duas que me restam – se é que vão me deixar tomar, ao menos, essas duas em paz... FUUUUUIIIIIII!!!!!!!!!!!

domingo, 24 de setembro de 2006

Desabafo


Resposta à gentalha



Sinceramente, ando me sentindo algo que, indignada, com alguns comentários que tenho recebido.

Apesar do meu espírito democrático – e, quem me conhece, sabe da enormidade da minha tolerância – creio que há sorte de gentalha extrapolando.

Tais excrementos insinuam, de todas as maneiras, que devo algo a alguém. Mas, a quem, afinal?

Ao que me recordo, vi-me em uma cadeira de rodas, durante sete meses, levando bicudas de todos os lados. Porque essas coisinhas imaginavam que, em cadeiras de rodas, eu estaria indefesa. Avalie! Nem dormindo...

Lembro-me de bater à porta de colegas e de amigos e de não obter, sequer, resposta aos telefones que dei.

Lembro-me de pedir, implorar, contemporizar, como é, aliás, desse meu infeliz feitio.

Lembro da minha filha, então com 13 anos, angustiada.

Lembro de não saber como pagar o aluguel do apartamento onde moro.

Lembro das panelas e panelas de comida que tive de aceitar de minha mãe, para não passar fome.

Lembro do medo, da angústia que me consumiam, diante do fato de não ter como conseguir emprego, em tais condições.

Porque as ameaças eram permanentes: eu seria atirada, literalmente, na rua da amargura, em cadeira de rodas.

E não havia porta que se me abrisse. Nem sombra de misericórdia. Porque todos os caminhos haviam sido fechados por um encosto, uma espécie de exu das sete encruzilhadas...

É engraçado: eu, muitas vezes, ao disparar um míssil, senti pena. Confesso que, em várias ocasiões, minha mão quase tremeu...

Mas, não me parece que essas criaturas “angelicais” tenham sentido o mesmo.

Pelo contrário: se não fizeram mais, foi porque EU jamais permitiria que fizessem mais!

Contemporizo, peço, imploro, deixo até pisarem em mim, quando se trata de manter a paz.

Mas, em declarada a guerra, não esperem de mim a mínima piedade.

Agora, choram. Esperavam o quê?

Vivo do meu trabalho e sei que tenho um talento nato para fuçar, para investigar. Não preciso de muito: bato os olhos em uma informação e sei o quanto é importante. Tenho o faro que todo o repórter deveria ter em relação à notícia.

Esperavam o quê?

Estão se queixando de quê?

Noticiei alguma coisa errada? Por favor, se for assim, me digam – e comprovem. Porque eu provo. Com carradas de documentos oficiais.

Queriam o que, as santas, as puras, as donzelinhas de beira de cais?

Queriam que passasse quatro anos me fingindo de morta, como fizeram tantos?

Mas, por quê?

Sou, por acaso, alguma imbecil ou incompetente, que precise apelar a tal coisa?

Desde quando a minha integridade, a minha honra, foi posta nas rifas da canalhada?

Traí a quem? Escalei o poço sozinha! E ainda hoje estou tentando reconstruir a minha vida; retomá-la do ponto em que se encontrava, quando sofri aquele acidente, em outubro de 2002.

Até hoje, vejam só a enormidade do estrago!

Não pedi emprego a ninguém do Governo: quando me preparava para deixar o governo – porque havia recebido proposta de trabalho do Diário do Pará e de mais duas assessorias – fui CONVIDADA a permanecer. E, burra que sou, com essa minha mania de conciliação, aceitei.

E vêm essas bestas-feras, esses protozoários que se imaginam gente, essas aberrações da natureza tentar me impingir defeitos de que jamais padeci: trairagem e covardia.

Logo eu – e essas peças sabem bem –, que abomino linchamentos. E que, se vivesse nos tempos da Inquisição, teria sido, certamente, queimada viva, por defender quem estava sendo mandado à fogueira.

Logo eu, que sempre dei a cara à tapa, quando a ratalhada se escondia.

Logo eu, que padeço de fidelidade canina, pelas causas que abracei ao longo de toda a vida e que não tenho um palmo de terra no cemitério.

Logo eu, que tive a coragem de sustentar ser tucana, mesmo me abrigando entre petistas e peemedebistas, ou me filiando ao PSB.

Quem, dentre esses cacetes, tem tal cacife?

Quem tem essa coragem, vamos lá!

Mas, não esperem pena; não me venham com apelo à piedade: esqueçam o chororô. Aliás, recentemente, troquei meu 38 por 50 bazucas. Levo, agora, 25 delas em cada mão...

Então, façamos assim.

No fundo, no fundo, vocês têm de entender o seguinte: o pior caminho é tentar me ameaçar. Essa coisa de me ofender, só desperta o meu lado escorpiônico – contra o qual eu luto, desesperadamente, todo santo dia.

Portanto, eu não chamei vocês de protozoários, de aberrações da natureza e de donzelinhas de beira de cais – ou vocês querem mais do meu amplo repertório? E vocês não ficaram tentando me transformar em traíra e covarde.

Convivamos, não é mesmo? Civilizadamente.

Porque, se não, vocês vão ouvir. Mesmo no anonimato. E, tenham certeza, eu consigo ser mil vezes mais virulenta do que todos vocês reunidos. Principalmente, se resolver abrir a minha caixinha de recordações. Até porque não vou mirar NC. Vou mirar quem deveria controlar a troupe, não é mesmo? FUUUIIIIIIIIII!!!!!!!!!!

Uma pausa na guerra.



A todos os guerreiros no campo de batalha. Qualquer que seja o sonho! A fé! O partido!...
A tudo o que ansiamos, cada um de nós, no mais profundo dos nossos corações!
Não importa o revólver fumegante. A dor que deixamos para trás. A misericórdia que desejamos ter...
Nem esse frio no estômago – pois, que se anuncia a batalha final!...
Que Deus nos permita ser tudo o que imaginamos!
E, se for para cair, que saibamos cair de pé!
Pelo que acreditamos!
E que Deus abençoe cada um de nós!...


Carmina Burana


Fortuna, Imperatriz do Mundo


Ó Fortuna,variável como a lua!
Cresces sempre ou diminuis,
Detestável vida!
Hoje maltratas,
Amanhã lisonjeias.
Brincas com os nossos sentidos;
A miséria e o poder
Fundem como gelo em ti.
Destino cruel e vão,
Roda que giras,
A tua natureza é perversa,
A tua felicidade, vã,
Sempre a dissipar-se.
Pela sombra e em segredo,
Aproximas-te de mim.
Apresento o meu dorso nu
Ao jogo da tua perversidade.
Felicidade e virtude são-me,
Agora, contrárias;
Afecções e derrotas estão
Sempre presentes.
Nesta hora,
Sem demora, pulsai as cordas,
Posto que o bravo,
Derrubado pelo destino.
Chorai comigo!


Choro as feridas da Fortuna


Choro as feridas
Causadas pela fortuna
Pois, rebelde,
Retoma os seus dons.
Na verdade, está escrito
Que a cabeça coberta de cabelos
A maior parte das vezes revela-se,
Quando a ocasião se apresenta, calva.
No trono da Fortuna sentei-me,
Com orgulho coroado,
Com as flores variadas da prosperidade.
Floresci, então, feliz e abençoado.
Eis-me, agora, caído do cume
E privado de glória.
Gira, roda da fortuna!
Eu desço e pereço.
Outro é levado para cima;
No cimo de tudo senta-se o rei, no vértice:
Ele que se guarde de cair!
Porque, sob o eixo da roda, lê-se:
Rainha Hécuba.

(Carl Orff)

E essa é pra desanuviar os arraiais. Com uma recomendação expressa: ouvir com Dominguinhos, Sivuca e Oswaldinho, em “Cada um Belisca um Pouco”, da Biscoito Fino. Égua do forró arretaaaaaado!!!!! Alevanta defunto!!!!!


Feira de Mangaio


Fumo de rolo arreio de cangalha
Eu tenho pra vender, quem quer comprar
Bolo de milho, broa e cocada
Eu tenho pra vender, quem quer comprar
Pé de moleque, alecrim, canela
Moleque sai daqui me deixa trabalhar
E Zé saiu correndo pra feira de pássaros
E foi pássaro voando em todo lugar

Tinha uma vendinha no canto da rua
Onde o mangaieiro ia se animar
Tomar uma bicada com lambu assado
E olhar pra Maria do Joá

Tinha uma vendinha no canto da rua
Onde o mangaiero ia se animar
Tomar uma bicada com lambu assado
E olhar pra Maria do Joá

Cabresto de cavalo e rabichola
Eu tenho pra vender, quem quer comprar
Farinha rapadura e graviola
Eu tenho pra vender, quem quer comprar
Pavio de candeeiro panela de barro
Menino vou me embora tenho que voltar
Xaxar o meu roçado que nem boi de carro
Alpargata de arrasto não quer me levar

Porque tem um sanfoneiro no canto da rua
Fazendo floreio pra gente dançar
Tem o Zefa de purcina fazendo renda
E o ronco do fole sem parar

Mas é que tem um sanfoneiro no canto da rua
Fazendo floreio pra gente dançar
Tem o Zefa de purcina fazendo renda
E o ronco do fole sem parar

(Sivuca/Glorinha Gadelha)

segunda-feira, 18 de setembro de 2006

Festa no meu Apê II


_Comadre, vamo agitá, vamo agitá que a festa do seu apê tá muito pai d’égua! Me passe lá esse seu CD do Waldik Soriano!
_Que CD do Waldik Soriano? Eu tenho lá cara de quem ouve Waldik Soriano?
_Ué, nem Reginaldo Rossi?
_Só pode ser carma!... Eu sou o judeu errante, com certeza...
_Ê, comadre, olhe lá! O Jujuba tá dançando agarradão com a Barbie Princesa!
_Xiiii!!! Se o Conde de Bota-Bem souber, vai ficar uma arara!
_Mas aoooonde!... Ele vai achar é bom!...
_Por que já?
_Ô comadre, tem vez que você parece até um poço de desinformação!... Que nem esse seu blog velho que você nunca atualiza!
_Ê, animal! Olha que eu te demito...
_Pois pode ademitir! Ademita! Pra seu governo, já recebi convite até do Washington Post!...
_Pra contar as peripécias do Bill Clinton?
_Você quer os detalhes sórdidos do Salão Oval?
_Boa noite, dona Perereca!
_Ô, seu Jujuba, que prazer em lhe receber no meu apartamento! E o senhor, como sempre, elegantíssimo! E cheirosíssimo!...
_Ah, a senhora gostou? O perfume, é claro, é francês. E o terno, comprei na minha última ida a Madri. Onde, aliás, degustei uma Paella...
_Onde é o toalete? Onde é o toalete?
_O que foi, dona Barbie, a senhora tá se sentindo mal?
_É que eu comi uma azeitona!!!...
_Eu acompanho a senhora ao banheiro. Por aqui, por favor!
_Hum, o negócio tá bom, né, Jujuba?
_Hem?
_Vamo lá! Adeixe disso, mais é! Assopre tuuudo nos meus zuvidus!
_É que o Bota-Bem tem aquela dificuldade que você sabe, né?
_E que dificuldade, Jujuba! E que dificuldade!...
_Pois é! E a coitadinha da Barbie já nem consegue comer!...
_E como é que pode? Eu, também, no lugar dela, avirava vigilante do peso, ué!...
_Daí que estou tentando, sabe, convencê-la a saciar essa fominha...
_E que fome, Jujuba! E que fome!...
_Mas ela tá até com anorexia, bulimia, sei lá!...E olhe que eu já tentei de tudo: caviar, escargot, uma lagostinha básica...
_Por aí você não vai lá, Jujuba!
_Por quê?
_Ô ômi, até parece que você não é cria do Barão!... Adeixe disso, mais é: de frescura, já basta o que ela tem em casa!... Aconvide ela prum FAROFÃO! Com aquele cervejão quente, num copo de ‘prástico’, na ‘bera dum garapé!’ A bicha vai até acafungar!...
_Você acha mesmo?
_Agora, sou eu quem diz: Ó, meu Jesus Cristo, crucificado!
_Errrr...Ao seu disporrr, minha senhorra!
_Ô seu Inri, achegue pra lá, achegue pra lá, que ainda não é hora do senhor entrar! Apreste atenção, Jujuba: mulhé é tudo igual! Apare com esse negócio de caviar pra lá, escargot pra cá, lagostinha pra acolá...Aprochegue o bicho, mais é!... Pere aí, que eu vou chamar um especialista. Ô seu Barão! Ô seu Barão! Se achegue aqui!

____

(No Banheiro)

_Ah, graças a Deus! Vomitei pela semana inteira!...
_Mas a senhora tá melhor?
_Estou me sentindo leve!... A senhora também deveria fazer isso, dona Perereca! Olhe o seu tamanho!
_Ué, o que é que tem o meu tamanho?
_A senhora está fat!
_E velhete e neurotiquete!...
_A senhora sabia que o zinco combate os radicais livres?
_E eu que pensei que radical livre fosse o PSTU!
_O que é isso, dona Perereca!...A senhora é uma mulher tão nova, tão bonita...
_...E carinhosa. Isso é música do Zé Ramalho! Um Brad Pitt, que, por sinal, passou anos com a Amelinha...
_ Por que a senhora não se ajeita? Olhe essas suas calças?
_Ué, o que é que têm as minhas calças?
_São horríveis: sujas, desbotadas e folgadas! A senhora parece uma bêbada!
_Engraçado... Eu ia, agora mesmo, lhe oferecer uma 51!...
_ E essa sua camiseta, cheia de buracos remendados. E esse seu tênis, que não vê água há trezentos anos! Francamente, dona Perereca, a senhora tem um grave problema de auto-estima!
_Me dê licença, que agora quem vai vomitar sou eu!

____

(De volta à sala)

_Hare Krishna, minha senhora! Hare Krishna!
_Ô seu Barão, explique aqui pro Jujuba como é que ele tem de fazer com a Barbie Princesa!
_Nem só de pão vive o homem...
_Tá vendo? Apare com esse negócio de ficar oferecendo comidinha pra ela.
_Ainda que eu fale a língua dos homens...
_Dê-lhe uns chupões, uns amassos! E uns arrochos a três por quatro!
_Olhai os lírios do campo!...
_ Arranque a roupa dela! Capriche nas preliminares!...
_E o Verbo se fez carne...
_Aí, aprochegue o bicho, mais é!
_Você está melhor, Barbie?
_Bem melhor, Jujuba, bem melhor! Vomitei três vezes!... E ainda dei uns bons conselhos pra dona Perereca... Fiquei tão feliz!... Ela vomitou duas vezes!!!...
_Credo, comadre, você tá passando mal?
_Nem me fale, cumadizinha, nem me fale!...
_Errr... Serrá que as senhorras poderriam me ajudarrr? Esse senhorrr ficarrr gesticulando parra mim, mas não dizerrr nada. E eu não entenderrr o que é isso...
_Ah, não se avexe, não, seu Inri! É que o lorde Balloon só fala através dos outros. Pere lá, que eu vou pedirrr pra ele assoprá nos meus zuvidus!
_(...)
_Ele tá dizendo que não gostou da sua entrada...
_(...)
_ Ele acha que o senhor devia de ter arranjado uns raios e trovões e um fundo musical do tipo...
_(...)
_ ...Ah! A Aleluia de Handel!...
_(...)
_Ele também não gostarrr dessa sua túnica velha e do seu cabelo desgrenhado...
_(....)
_Ele acha que o senhor precisa é de uma guaribada fashion!...
_(...)
_Que, se o senhor quiser, ele pode lhe deixar mais concorrido que a Prece Poderosa!...
_(...)
_E lançar vários produtos: o sabonete do Inri, a coroa de espinhos de Indaial, as sandálias do pescador...
_(...)
_Me adesculpe, seu Inri: as sandálias, não, porque elas já vão ser lançadas pelo Barão...
_(...)
_Ah! Se duvidar, o senhor se elege governador do Brejo News!...
(...)
_Mas o senhor tem de deixar ele assoprar nos seus zuvidus...
_Errr... E como eu fazerrr?
_Ué, como eu estava fazendo! É só encostar! E vá com Deus, seu Inri! Escute o lorde, viu, que o senhor vai looonge!
_Ei, cumadizinha! Não é o Príncipe Clean que tá entrando no meu apê?
_Em limpeza e fome, comadre, em limpeza e fome!
_Égua, cumadizinha, rápido! Me ajude a esconder a merenda e os papéis!

(Continua)

sexta-feira, 15 de setembro de 2006

Solidariedade a Lúcio Flávio

Recebi e publico, na íntegra, a seguinte carta aberta do jornalista Lúcio Flávio Pinto, à população paraense. Daqui a solidariedade da Perereca aquele que é, sem qualquer favor, o nosso mais brilhante e combativo jornalista.

Lamenta-se que a Justiça paraense, tão ciosa em condenar os "bandidos" que defendem os interesses do nosso povo, apresente "exemplar" frouxidão moral em relação aos "mocinhos" que protagonizam toda sorte de patifarias, inclusive o peculato a roldo.



À OPINIÃO PÚBLICA




Chamar o maior grileiro de terras do mundo de pirata fundiário constitui ato ilícito no Pará, obrigando quem utilizar a expressão a indenizar o suposto ofendido por dano moral. Com base nesse entendimento, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado manteve a condenação que me foi imposta no juízo singular. No ano passado, o juiz Amílcar Guimarães, exercendo interinamente a 4ª Vara Cível do fórum de Belém (é titular da 1ª Vara), acolheu a ação de indenização contra mim proposta pelo empresário Cecílio do Rego Almeida e me condenou a pagar-lhe oito mil reais, mais acréscimos, que resultarão num valor bem maior.


Meu “crime” foi uma matéria que escrevi no meu Jornal Pessoal, em 2000, comentando reportagem de capa da revista Veja de uma semana antes, que apontava o dono da Construtora C. R. Almeida como “o maior grileiro do mundo”. Com base em um título de terra que ninguém jamais viu e todos os órgãos públicos negam que exista, o empresário se declarava – e continua a se declarar – dono de uma área que poderia chegar a sete milhões de hectares no vale do rio Xingu, no Pará, região conhecida como “Terra do Meio”, na qual há a maior concentração de mogno da Amazônia (o mogno é o produto de maior valor da região). Se formasse um Estado, esse megalatifúndio constituiria o 21º maior Estado brasileiro.

C. R. Almeida propôs a ação em São Paulo. Mas como o foro era incompetente, a demanda foi transferida para a comarca de Belém, onde o Jornal Pessoal, uma newsletter quinzenal independente que edito desde 1987, tem sua sede. Durante mais de quatro anos a ação foi instruída na 4ª Vara Cível. A juíza responsável pelo processo, Luzia do Socorro dos Santos, se ausentou temporariamente para fazer um curso no Rio de Janeiro. O juiz Amílcar Guimarães a substituiria por apenas três dias, mas, de fato, só assumiu a Vara no último dia, 17 de junho do ano passado, uma sexta-feira.

Nesse dia ele pediu ao cartório que os autos, com quase 400 páginas, lhe fossem conclusos e os levou para sua casa. Só os devolveu na terça-feira, dia 21, quando a juíza substituta já estava no exercício da Vara. Junto com os autos veio a sua sentença condenatória, datada de quatro dias antes, como se a tivesse lavrado no último dia do seu exercício legal na função.

Representei contra o magistrado, mostrando que a sentença era ilegal, que o processo não estava pronto para ser sentenciado (estava pendente informação da instância superior sobre um recurso de agravo que formulei exatamente contra o julgamento antecipado da lide, que o julgador efetivo pretendia realizar), que os autos sequer estavam numerados e que a sentença revelava a tendenciosidade e o desequilíbrio do sentenciante. A Corregedora Geral de Justiça acolheu a representação, mas, por maioria, o Conselho da Magistratura decidiu não processar o juiz. Recorri em julho dessa decisão, mas o embargo de declaração ainda não foi apreciado.

No plano judicial, apelei da condenação. A relatora do recurso na 3ª Câmara Cível, desembargadora Maria Rita Xavier, manteve a condenação, apenas concedendo uma redução no valor da indenização. A revisora, desembargadora Sônia Parente, pediu vistas. Na sessão de hoje ela apresentou seu voto, discordando da posição da relatora.

Argumentou que a grilagem de terras da C. R. Almeida no Xingu é fato público e notório, comprovado por diversas matérias jornalísticas juntadas aos autos, além de pronunciamentos unânimes de órgãos públicos que se manifestaram oficialmente sobre a questão, incluindo a Polío, incluindo a Polm oficialmente sobre a questrras da C. R. Almeida no Xingu ealizarnso. O juiz Amcia Federal, o Ministério Público Federal e a Justiça Federal. Eu apenas aplicara ao autor da grilagem uma expressão de uso corrente nas áreas de confronto, conforme ela própria pôde constatar quando atuou como juíza numa dessas áreas, o município de Paragominas.

A desembargadora-revisora disse que a matéria do Jornal Pessoal estava resguardada pela liberdade de expressão e de imprensa, tuteladas pela Constituição Federal em vigor. O texto jornalístico expressava uma situação conhecida e lamentada pelos que se preocupam com o futuro da Amazônia, assolada por agressões como a devastação da natureza, a apropriação ilícita do seu patrimônio e até mesmo o trabalho escravo. Muito emocionada ao ler esse trecho do seu voto, a desembargadora disse que Castro Alves, se voltasse agora, encontraria um novo navio negreiro nos caminhões que trafegam pelas estradas amazônicas carregando trabalhadores como escravos. E manifestaria sua indignação da mesma maneira que eu, ao escrever no Jornal Pessoal.

Ela salientou que a expressão em si, de “pirata fundiário”, é apenas um detalhe e irrelevante, porque ela foi aplicada a um fato real e grave, noticiado em vários outros jornais. “Por que só este jornal de pequena circulação, que se edita aqui entre nós, é punido?”, indagou.

Suas judiciosas observações, porém, não tiveram eco. A desembargadora Luzia Nadja Nascimento, esposa de Manoel Santino Nascimento, que deixou a chefia do Ministério Público do Estado para ser secretário de segurança do governo, sem maiores considerações, apresentou logo seu voto, acompanhando a relatora. Nem permitiu que o presidente da sessão, desembargador Geraldo Corrêa Lima, apresentasse as observações que pretendia fazer. Sua decisão já estava tomada.

Como havia apenas as três desembargadoras no momento em que a votação foi iniciada, em maio, os dois outros desembargadores que se encontravam na sessão de hoje da 3ª Câmara Cível não puderam votar. Por 2 a 1, minha condenação foi mantida. Agora me resta apresentar o recurso que poderá provocar a reapreciação da questão junto ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília.

Esse entendimento, de que é ato ilícito aplicar a expressão “pirata” àquele que é proclamado “o maior grileiro do mundo”. é exclusivo da justiça do Pará. Cecílio do Rego Almeida também processou a revista Veja, seu repórter, um procurador público do Estado do Pará e um vereador de Altamira pelo mesmo motivo, mas todos foram absolvidos pela justiça de São Paulo. Ao invés de condená-los, como aqui se fez comigo, o juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível, elogiou-os por defender o interesse público. Justamente no Estado que sofre a apropriação indébita do seu patrimônio fundiário, com a mais escandalosa fraude de terras, a grilagem é protegida e quem denuncia o grileiro é punido.

domingo, 10 de setembro de 2006


Festa no meu Apê (I)


_Aleluia! Aleluia! Hare Krishna!
_Cumadizinha, sinto lhe informar, mas você errou de endereço: o hospício é mais pra lá!
_Ô comadre, você não tava dormindo?
_Na-na-ni-na-não! São três da manhã! Eu estava a sua espera!
_Puuuuxa!... Mas assim perdeu a graça!
_Pois não é, cumadizinha? Meu lema agora é: se você não pode derrotar seus doidos cativos, una-se a eles!
_Ainda bem que você mora bem do lado do hospício, né, comadre?
_É... Dá pra te internar mais fácil, animal!
_Credo, comadre! Égua do mau humor! Mas, como diria o lorde Tirésias, eu “truci” a solução pros seus problemas!
_UM ESCRAVO SEXUAL?!!!
_Não, melhor... Muito melhor...
_DEZ?!!!
_Não. Eu “truci” Ele em pessoa!
_Quem já?
_Sua Santidade Reverendíssima, o Inri de Indaial!
_Pronto...Só falta soarem as trombetas...
_Piuíííííííí. Piuííííííííííííí
_Que diabo é isso, animal?
_A minha cornetinha, ué! É que não tinha clarim. Aí comprei essa daqui, de ‘prástico’, lá no arraial.
_Ai, meu Jesus Cristo crucificado!...
_Errr... Ao seu disporrr, minha senhorra!
_Eu mereço, eu mereço!...
_ Comadre, o seu Inri precisa de um grande favor do seu blog: Ele quer deixar a história Dele para a posteridade!
_Errr... Me desculparrr, minha senhorra. Mas eu apreciarrr muito a sua Perrerreca. Porrr isso rrresolvi lhe pedirrr um grrande favorrr: escrreva a minha biogrrafia!
_Eu sentirrr...Quer dizer, eu sinto muito, seu Inri! Fico lisonjeada com a sua lembrança, mas, infelizmente, já me comprometi com outro doido... Quer dizer, eu já me comprometi com o Barão!
_Pois, então, comadre! Fica tudo em casa, ué!
_Pera lá, caramba! Isso daqui ta virando a Casa Transitória!
_A trransitorriedade da vida, minha senhorra, é obrra de meu Pai. Parra que os homens comprreendam que há coisas mais imporrtantes na vida. De que adiantarrr ao Homem ganharr o mundo inteirro e perrderrr a prróprria alma?
_Ele não engasga com isso, não?
_Não, comadre! O seu Inri é um autêntico nazi-brasileirro!
_Ei, você aí! Quer parar de tentar pescar o peixinho do meu aquário? Deixa ele em paz, caramba! Mas quem, diabos, é esse sujeito?
_Ô comadre! Não ta reconhecendo? É o Barão!
_De cabeça raspada e túnica branca?
_Pois não é? O ômi virou Hare Hare!
_Hare Krishna, minha senhora! Hare Krishna!
_Mas é a cara de um, focinho do outro!
_Batman e Robin, comadre! Batman e Robin...
_Mas, então, Robin.. Quer dizer, Barão. Há quanto tempo, não é?
_Muitas luas, minha senhora, muitas luas!...
_E esse seu, como direi, new look, é... interessantíssimo...
_Estou me preparando para o deserto, minha senhora! Estou me preparando para um novo e extraordinário deserto!
_É impressão minha ou ele ta mais bilé?
_É o incenso, comadre!... O ômi tá cheirando muito incenso...
_Mas, então, Barão. Até hoje estou à espera das fitas que o senhor ficou de me mandar, para eu escrever a sua biografia...
_Já desisti de tudo isso, minha senhora. Abdiquei de toda e qualquer vaidade! Tudo no mundo é ilusão! Há tempo de plantar e tempo de colher. E eu, agora, estou me preparando, espiritualmente, para colher tudo o que plantei!
_Você tem razão, cumadizinha, é incenso do bom!...
_Pois não é, comadre, eu já até encomendei...
_E quem é esse que ta entrando aí? Não é o lorde Balloon?
_Pois não é? Eu esqueci de lhe avisar, comadre: convidei ele também...
_Mas o que é isso? Virou festa no meu apê, agora?
_Ô comadre, você precisa relaxarrr. Precisa manter a mente aberta, ué!
_E eu que pensei que fosse só a Perereca!...
_.....
_Mas que diabos é isso? Por que o lorde só abre os braços e não fala nada?
_Ô comadre, ele só fala através dos outros, ué?
_Como assim?
_Ele assopra nos ‘zuvidus’, comadre!
_E depois a doida sou eu!...
_É mais gostoso botar! É mais gostoso botar! É mais gostoso botar!
_Ué, não é a Barbie Princesa?
_Em Spa e osso, comadre, em Spa e osso...
_Ô cumadizinha, você devia ter me avisado que eu tinha encomendado um caviar...
_Pelo amor de Deus, comadre, nem fale em comida perto dela, que ela começa a vomitar...
_Égua, olha lá o Jujuba! Lindo, tesão, bonito e gostosão!
_Assossegue o facho, comadre!
_Posso não, cumadizinha. O Jujuba é must!
_Também vai virar Hare!
_Não brinque!
_Depois desse estágio básico no PeFeLê, o que é que a gente podia esperar, né, comadre?
_Tadinho do Jujuba! Vou dar pra ele uns três milhões de comprimidos de amoxicilina!
_Credo, comadre, assim você ‘amata’ o homem!

(continua)

Agradecimento

A Perereca agradece, sinceramente, todos os comentários tucanos que tem recebido – mesmo que desaforados. Faz-lhe muito bem, ao ego, saber que não é tão facilmente esquecida...
Eternamente, Pará!

(Ah, como é bom pescar! A beira-mar. Em noites de luar!- Verequete)


Dona Maria

Dona Maria chegou, chegou, chegou
Com a mandioca
Para fazer a farinha, farinha, farinha de tapioca.
Dona Maria chegou, chegou, chegou,
Com a mandioca
Para fazer a farinha, farinha, farinha de tapioca.
Para remexer, para remexer, para remexer
Mexer, mexer, mexer, mexer.

(Domínio Público)



Sinhá Pureza

Vou ensinar Sinhá Pureza
A dançar o meu Sirimbó
Sirimbó que remexe, mexe
Sirimbó da minha vovó
Vai dançando Sinhá Pureza
Rebolando, pode requebrar
Carimbó, Sirimbó é gostoso
É gostoso em Belém do Pará
Olelê, Olalá, te jurei Carimbó, Siriá
Carimbó, Sirimbó é gostoso
É gostoso em Belém do Pará

(Pinduca)


Carimbó no Mato

Eu fui no mato, morena
Fui tirar cipó
Muito longe ouvi um batuque
Parecido um Carimbó (bis)

Eu vou de banda, de banda, de banda
Eu vou de lado, de lado de lá
Eu fiquei só
Dançando no mato Carimbó.

(Domínio Público)


Bala de Riple

Maria, quem foi que te disse
Que bala de ‘riple’ não mata ninguém?
Maria, quem foi que te disse
Que beijo de amor não consola alguém?
Ai, Maria, Maria, meu amor!
Ai, Maria, eu quero é teu calor!

(Pinduca, Menezes de Carvalho)

sexta-feira, 8 de setembro de 2006

Roda de samba

Malandro Sou Eu!


Segura seu moço, que o teu santo é de barro
Que sarro dei volta no mundo e voltei pra ficar
Eu vim lá do fundo do poço e não posso dar mole
Pra não refundar
Quem marca bobeira engole poeira
E rasteira até pode levar
Malandro que sou, eu não vou vacilar
Sou o que sou, ninguém vai me mudar
E quem tem tentou teve que rebolar sem conseguir
Escorregando daqui e dali
Malandreando eu vi e venci
E no sufoco da vida foi onde aprendi (malandro!)
Vou eu vou por aí
Sempre por aí, esse mundo é meu
E onde quer que eu vá
Em qualquer lugar
Malandro sou eu!

(Arlindo Cruz/Franco/Sombrinha)

O Mar

Nunca entendeu por que amava tanto o mar. As ondas, o cheiro, o murmúrio... O mistério primordial. A força de empurrar-se adiante e espalhar-se infinitamente. As profundezas que nem a luz conseguia penetrar.

Não, nunca tivera medo ao mar. E até sentira como se pudesse, apenas, deitar-se, a deixar-se levar. Como se fora parte daquelas ondas, em eterno desassossego. Daquele coração – um imenso e selvagem coração. Que se abrisse não para a morrer, mas para ninar...

Costumava enxergar o mar mesmo nos desertos. A palpitar em pedra e em pó. Represado nas folhas que se entregavam à terra. Eternamente reproduzido. A erguer-se à procura dos céus...

Por vezes, se perdera a olhá-lo, para compreender-se nesse mistério. Das águas que mergulhavam urgentes e partiam mais depressa ainda. Que lhe arrastavam a terra, a casa, as árvores. Mas que semeavam tudo isso em algum lugar.

E imaginava que já fora esse mar. Em outra Terra, em outra vida, até. A embalar em cada barco todos os sonhos do mundo.

Quem sabe, até, se perdera naquelas águas. E amara tanto as tempestades que se tornara nelas. A onda revolta diante do raio, que lhe revela a escuridão...

E, no entanto, olhava, olhava, mas já não via o mar. Como que sorvido pelas próprias entranhas.

E mesmo os olhos lhe ficaram desertos.

Feito um pedaço daquela paisagem, que à coisa alguma permitia frutificar.

Quisera ir-se ao encontro dele. Nem que tivesse de atravessar o sol, o frio, a fome, a dor.

Mas, a encontrá-lo, o que encontraria, afinal? Seria o mesmo mar? E o mar que pensara mar seria, de fato, o mar? E se nunca houvera, enfim?

Quem sabe não passara de um desejo? A flor dessa angústia que lhe velava o peito. Um grito... Que não soubesse de onde vem nem para quê.

Talvez fora o medo. O medo de se perceber, ali, entre as pedras, à espera de um oceano que jamais viria.

Quem sabe quisera, apenas, sentir-se mais que um fantasma a vagar entre fantasmas. A purgar os pecados havidos, sabe-se lá onde.

O mar lhe trouxera vida. Mas e se toda essa vida estivera dentro dela, enfim? Quieta, escondida, nos abissais da alma?

Que lhe trouxera, então, o mar, além da própria partida? E da dor dessa ausência do que foi sem ter sido?

Para além dos desertos que floresciam e da vida a pulsar no pó, que lhe ficara dessas ondas que a embalaram, feito a menina que se aperta ao peito?

Mas lembrou-se do tempo, o grande senhor do mundo!... E de todo o infinito que correra, sempre mais longe, sempre mais longe, sempre mais longe...

E das flores que se deitavam na terra, para vivê-la.

E de todos os mares que passaram por seu corpo, feito as águas dos afluentes.

E da criança que lhe batia à porta, a cada manhã.

E nem o mar, nem o que partiu, nem o que deixou, mereceu uma lágrima.

E pôs-se a dormir, a pensar que era Deus.


Belém, 07/09/2006

domingo, 3 de setembro de 2006

Um pombo no asfalto



Noção de História



Há milhões de anos, seus deuses eram animais como ele, que vagava pela Terra nu e sem teto.

Mas ele subjugou os semelhantes, parindo deuses à imagem de si mesmo.

Não gostou do que viu.

Fez-se, então, à semelhança de criaturas desprovidas de instintos e paixões. Ele, também, inatingível, forte, eterno.

Mas os prazeres continuaram a persegui-lo.

Cresceu dividido entre o bem e o mal, frutos do mesmo ventre: a deformação da racionalidade.

Não conseguiu livrar-se da fome, do orgasmo, da agressividade.

A Razão não era suficiente. Criou o Estado.


Capítulo I


Eles estão em toda parte e convocam à flor da pele a minha impotência. Há um bem ali, no teto, e parece me observar. Outro se escondeu num canto do quarto. Às centenas, batem as asas atrás da porta do banheiro.

Tento um movimento leve. Mas o do teto faz menção de me atacar. Silêncio...Respiro devagarinho...

Há dias, vigio os segundos. O próprio pensar tornou-se um suplício – de que me serve pensar se não me posso mover? Sinto-me qual Prometeu à espera do abutre...

Mas por que eles me perseguem? O que lhes fiz que provocasse tanta fúria?

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Flash-back

O primeiro verbo que aprendi a conjugar foi obedecer. Disseram-me: eu obedeço, tu obedeces. Não me lembro quando. Só sei que era desse tamanhinho...

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Eles pediram reforços. Agora, tomam as paredes. Vendaram-me os olhos. O tempo fugiu.

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Fragmentos biográficos

Número: 056789/87 – série A
Filiação: revolucionários e revoluções
Data de Nascimento: 1960

1968: Thor, o primeiro amor.
1969: antes e depois das aulas, o Hino Nacional, a mão direita sobre o coração.
1970: porrada, praticamente todos os dias.
1971: a primeira menstruação. Nunca ouvira falar no assunto.
1972: masturba-se às escondidas.
1973: fuma e toma Melhoral com coca-cola.
1974: o primeiro beijo.
1975: briga com o namorado e chora, ao som de “Pomp and Circunstance”.
1976: a primeira trepada. Casa, obrigada, no ano seguinte.
1977: lava, passa, borda e apanha do marido.
1978: o primeiro filho. Engorda uns vinte quilos e experimenta todas as dietas e torturas conhecidas.
1979: a infidelidade do marido é pública. O casamento desaba. Sobra-lhe a filha, ao colo.
1980: crê, piamente, que os comunistas ameaçam o país.

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O inseto, com grandes e brilhantes asas castanhas e que parecia ser o chefe, andava de um lado para outro. Vez por outra, esfregava duas patinhas, como que esperando que eu dissesse alguma coisa. Eu, porém, preferia observar aquela sala imaculada; só conhecia o lugar por disse-me-disse.

Ele colocou minha ficha sobre uma mesa branca. Tudo, ali, era terrivelmente branco.

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Sermão

E subindo Ele ao monte, falou:

Não pensareis
Não gritareis
Não perguntareis
Não vomitareis
Engolireis
Sussurrareis
Acatareis
E realizareis tudo o que vos mandarem porque é essa vontade do Pai.

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Capítulo II

_Hum, hum. Pelo que vejo aqui a senhora é contumaz...
_Hem?
_Ora, não se faça de ingênua...
_Mas eu...
_Nós sabemos tudo a seu respeito. TU-DO!
_Mas eu...
_Cale a boca! Pensa que pode nos enganar, é?
_...
_A senhora tem alguma coisa a dizer em sua defesa?
_...
_Escreva aí: a acusada nada disse.

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Tiraram-me as roupas; aqui, todos andam nus. Cercas de arame farpado delineiam nossos limites; há lama sob nossos pés.

Pela manhã, andamos em círculos; à tarde, também.

Vez por outra, ouvimos gritos, vindos da direção do Paraíso.

Lá, dizem, eles nos fazem tornar à normalidade. O Paraíso é branco.

Quantos somos? Não sei... Há homens, mulheres, velhos, crianças. Milhares, talvez, milhões.

Todos temos um número de ordem gravado na testa e é pelo número que eles nos tratam.

Não sei quando eles tomaram o poder. Só sei que, quando nasci, já estavam ali.

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(Competir, competir e competir. Sobressair-se sempre e a qualquer preço... Mas, um dia, ele não matará por comida, não brigará por sexo, não guerreará por territórios. Exorcizará, enfim, o animal – e todos os prazeres e todas as paixões... Será, enfim, senhor de si mesmo e de todo o universo! Será a paz!...)

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_Você aí!
_Quem, eu?
_0566789/87, série A?
_Sou eu. O que foi?
_Diga: sim, senhor!
_Sim, senhor!
_Venha comigo! Vamos, mexa-se!

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(Vi o mundo dos observatórios privilegiados: os balcões dos bares, os puteiros, as sarjetas, os monturos de todo o lixo humano. Fiz-me igual a eles: a decadência é a última trincheira...)

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Capítulo III


Acordei de um sono profundo, a cabeça pesada, músculos recusando obediência.

Lembro de quase nada.

Vi-me amarrada a uma cama, cercada pelas paredes inexpugnáveis do Paraíso.

Vi um gafanhoto com uma enorme seringa.

Gritei, tentei soltar-me, distribui palavrões.

Mas, tão logo aquela droga penetrou em minhas veias, minha resistência se esvaiu.

Depois, o tempo moveu-se célere. Dia após dia, uma voz me dizia para tornar ao caminho do bem.

Em um trono de ouro e pedras preciosas, a aranha me exortava ao arrependimento...

Fui enrolada em uma teia e quanto mais lutava, mais me convencia de que pecara.

Pensei: por que não me tornar um deles? Mas meu raciocínio, novamente, se fragmentava. Obedecer tinha de se tornar uma compulsão...

Eles dançavam em minha volta e tomavam o meu corpo. Sugavam o meu sangue e se deliciavam em minha carne.

Não recordo quanto tempo fiquei ali. Vi-me cambaleando de volta a minha cela e dormindo dias e dias e dias...

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(Eu amo os cemitérios, com suas cruzes e lápides brancas, as suaves hipocrisias...

Amo passear pelos seus caminhos, sentindo na pele o odor dos corpos que se decompõem num átimo de história...

Ali está o que restou de um cadáver.

Brancos ossinhos, aos quais os vermes devoraram as carnes.

Terá sido homem ou mulher? A quantos terá beijado a boca e trespassado a alma de dor e prazer?

Não, não importa...

Agora, é, apenas, vala-comum...

Dele, nem o vento sussurra o nome...)

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Era dia e minhas mãos tentavam capturar o raiozinho de sol que invadira a minha cela, quando uma barata veio avisar-me da liberdade.

Era, então, pele, ossos e feridas.

Apanhei o que me restara e, com um olhar, despedi-me de meus companheiros.

Quase não acreditei quando toquei a terra. Eu era livre como a aurora, leve, como as nuvens...

Nas ruas, as pessoas passavam por mim e nem me notavam.

Parei em um sinal; ao lado, um pombinho.

Fiquei a admirar-lhe as asas. Mas ele, inquieto, parecia não poder voar.

Titubeou, deu uns passinhos em círculos e, de súbito, atirou-se à frente.

O sinal fechou. Todos seguimos nossos caminhos.

Virei-me e avistei, ao longe, aquela massa de sangue e penas a manchar o asfalto...

Promessa de Casamento


Eu serei aquela que se enrosca em tuas pernas
E te acorda na madrugada
A mão suave no peito nu

Não serei teu corpo,
Mas a terra que o recebe.
Eu serei os beijos que te enxugam o dorso
Nos dias e noites de febre.

Eu serei os galhos em que brincas
Os frutos que lanças na terra
As sementes que te eternizam

Eu serei a esperança e o pesadelo
E o desejo irrespondível e imenso
Que pé ante pé adentra o peito.

(Belém, 1986)



Canção do Amor Partido

Pois é, eu parti de nós.
Fiz-me livre e forte a correr o horizonte,
Pensando teu mundo exausto,
A remoer sem cessar o ontem.
Mas quando tornei ao meu passado,
Tu não estavas lá.
Havias partido n’aurora
A cavalgar teu próprio mundo.
E fiquei, eu, assim, na noite,
A recortar a poesia,
Enquanto, lá fora,
A cidade reluz e canta.

Eu parti de nós.
Tramei cada passo, cada gesto, cada olhar.
Vi-me senhora de tuas entranhas,
Combustão repentina!
Tu, que num pulsar, explodes a Geometria,
Eu, que nunca rio, pra não acordar a noite.

Tu, que tens no nome a paixão e a saudade.
Eu, a possuir-te etéreo, canção da irrealidade.

Chove. E eu que rejeito esse arquivo amargo
Sofro com sofreguidão renovada.
Rediviva vontade de estilhaçar-me ao infinito
Fragmentando em mim teu fantasma.
Tu, seminova que semeias vida.
Eu, guerreira cansada.
Voltei pra desejar tornar a terras e braços distantes
Mas que iludem esse canto, inútil e desventurado.
Voltei só pra mostrar-te essa canção tão triste
No silêncio inerte dessa hora última
Tu, nome rebelde em meus lábios.

(Belém, 1986)



Poema inacabado

Deixemos como está.
Sejamos, um do outro,
O outro lado do mar!
Não ajuntemos o que partiu.
O que se foi por acaso
O barco no horizonte,
Que não nos leva ninguém.
O tempo esquecerá!
E mesmo o que julgamos... indizível
Será a poeira que se refaz em estrada.
A história que a sorrir se reparte
Porque não dói de fato e enfim
Assim como está, está bem.
Ao menos, já não te penso.
E posso pensar o mundo.
Retornar aos mares de onde vim
A perder-me no azul profundo
Sempre tão longe e inacessível.
Mas acima e ao redor de mim!...